Título: Abatimento e apreensão no Planalto
Autor: Jungblut, Cristiane
Fonte: O Globo, 11/12/2007, O País, p. 3

Ainda sem certeza da vitória, presidente telefona da Argentina para senadores.

BRASÍLIA e BUENOS AIRES. Depois de uma contabilidade alarmista feita no fim de semana, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e os articuladores governistas intensificaram ontem a ofensiva final para não sofrer sua maior derrota, com a possível rejeição da prorrogação da CPMF. No Palácio do Planalto, cálculos reservados indicavam ontem que o governo perderia a votação. Dos 49 votos necessários para aprovar uma emenda constitucional, o governo só havia confirmado o apoio de 46 senadores. Há uma outra contabilidade que considera possível ter de 46 a 50 votos. Mas ninguém diz isso com certeza. Por isso, mesmo com a ofensiva, se a votação for hoje, amanhã ou quinta-feira, o governo vai para o tudo ou nada, sem a certeza dos votos necessários à vitória.

O assunto esteve presente em todos os momentos do dia. De manhã, Lula usou o programa "Café com o presidente" para fazer novos apelos ao bom senso dos senadores rebeldes. Em viagem à Argentina, onde foi participar da posse da nova presidente, Cristina Kirchner, Lula aproveitou espaços na agenda para articular a votação da CPMF e telefonou para senadores. Ele recebeu uma lista do ministro das Relações Institucionais, José Múcio Monteiro, antes de embarcar para Buenos Aires.

- É uma questão de responsabilidade e eu estou tranqüilo, estou convencido de que, em todos os partidos políticos, a maioria dos senadores quer votar favoravelmente à CPMF. Obviamente que tem pressão de um ou de outro partido, mas acho que o bom senso vai prevalecer - disse Lula no rádio.

Lula também discutiu as dificuldades da votação com o ministro da Fazenda, Guido Mantega, que foi para a Argentina por causa da assinatura da ata de fundação do Banco do Sul e do encontro de Lula com o presidente do Fundo Monetário Internacional (FMI), Dominique Strauss-Kahn. A avaliação feita na Fazenda é que, se a CPMF não for aprovada, o freio no crescimento brasileiro será grande, a exemplo do que aconteceu em 2003, quando houve um corte de R$14 bilhões no Orçamento, na área de investimentos e emendas parlamentares.

Múcio: "Não há mais argumentos. Agora tudo depende da consciência de cada senador"

No Planalto, o clima era de abatimento e apreensão. Múcio passou o dia ao telefone e recebeu senadores. No início da tarde, recebeu o governador de Rondônia, Ivo Cassol, para tentar convencer o senador Expedito Júnior (PR-RO) a mudar de posição e aprovar a CPMF. Expedito deu declarações reafirmando que votaria contra a CPMF. Mesmo assim, Múcio marcou para hoje um encontro de Cassol com Mantega para tratar do pedido de revisão da dívida do Banco Estadual de Rondônia (Beron). Cauteloso, Múcio não disfarçava a preocupação com a votação:

- O governo não pede recursos novos. Mas sim, a manutenção dos programas sociais que já existem. Por isso, não há mais argumentos. Agora, tudo depende da consciência de cada senador. A maioria dos senadores quer votar pela prorrogação da CPMF. Mas muitos estão amarrados, com medo da sanção dos partidos.

Também estiveram com Múcio os senadores Gim Argello (PTB-DF) e Augusto Botelho (PT-RR). Na mira do Planalto estavam ainda Romeu Tuma (PTB-SP) e César Borges (PR-BA). Até o presidente do PTB, o ex-deputado Roberto Jefferson, recebeu um apelo para liberar o voto de Mozarildo Cavalcanti (PTB-RR).

- Acho que será possível mudar os votos no PTB. Afinal, você acha que o Tuma vai ficar contra o governo? E o Mozarildo é médico. Ele sabe que Roraima vai perder muito sem a CPMF, pois ganha muito mais do que arrecada com esse imposto - argumentou Gim Argello.

Enquanto tentava conquistar votos, o Planalto percebia sinais de sangramento na base. Em discurso, Osmar Dias (PDT-PR) disse que não estava convencido dos argumentos para votar pela CPMF. Outro voto que preocupava era o de Geraldo Mesquita (PMDB-AC).

- Sou contra a CPMF porque essa é a oportunidade para reduzir a carga tributária. Além disso, é hora de transferir para a população essa decisão, via referendo. O discurso do governo é de ameaça. Falta argumento. Além disso, passei a receber ameaças até mesmo da existência de um dossiê contra mim. Essa é uma prática fascista - denunciou Mesquita, sem informar o que seria o suposto dossiê.

(*) Enviada especial