Título: Pressão extra na folha do INSS
Autor: Geralda, Doca
Fonte: O Globo, 12/12/2007, Economia, p. 27

Acordo do governo com bancos aumenta déficit da Previdência em R$3 bi este ano.

Ogoverno recuou ontem e por pelo menos um ano não cobrará dos bancos pelo pagamento da bilionária folha de benefícios do INSS. Em troca, fechou um acordo com as instituições financeiras conveniadas e ficará até 31 de agosto de 2008 sem desembolsar R$250 milhões pelo serviço. O Ministério da Fazenda defendia que a administração da folha fosse a leilão. Além disso, o Ministério da Previdência atendeu a um pedido do setor e promoveu uma antecipação no calendário de pagamento de 8,5 milhões de pensões e aposentadorias de até um salário mínimo, para desafogar as agências no início de mês.

Como a medida começa a valer já em dezembro, o déficit da Previdência em 2007 subirá R$3 bilhões, para R$47,4 bilhões, com impacto na meta de superávit primário. O último mês do ano é tradicionalmente deficitário, reduzindo a economia para pagamento de juros. Em 2006, o rombo previdenciário ficou em R$2,055 bilhões.

O acordo foi anunciado pelo ministro da Previdência, Luiz Marinho, durante reunião com representantes do setor. Ficou acertada a criação de um grupo de trabalho que terá cinco meses para estudar custos e benefícios de cada instituição com o pagamento do INSS e propor uma nova modelagem de administração da folha, pela qual inverta-se a lógica, e o Executivo passe a ser remunerado pelo ativo. Caso não se chegue a um consenso, garantiu Marinho, o governo vai licitar a folha até agosto.

Bancos de olho no crédito consignado

Por trás da queda-de-braço entre o governo e os bancos conveniados ao INSS está o crédito consignado. Criada em 2004, a modalidade já movimentou R$28,9 bilhões entre 8,7 milhões de aposentados e pensionistas. De olho na expansão do financiamento com baixo risco, as instituições financeiras já têm cobiçado as folhas salariais estaduais e municipais, desembolsando milhões para acessar clientes cuja chance de demissão é praticamente zero.

Para ficar isento do pagamento de tarifas entre setembro deste ano (quando venceu o atual contrato, anual) até agosto de 2008, o governo decidiu antecipar, a partir de dezembro, o pagamento dos segurados do INSS que recebem até um salário mínimo e cujo número final do benefício (não o dígito) seja 1, 2, 3, 4 e 5. Em vez de receber o pagamento nos primeiros cinco dias úteis de janeiro, esses beneficiários poderão sacar o dinheiro nos últimos cinco dias úteis de dezembro.

A medida valerá para os meses subseqüentes e somente para esse grupo de beneficiários. Já os segurados que ganham mais de um salário mínimo continuam recebendo nos primeiros cinco dias úteis de cada mês. Atualmente, há 23 bancos conveniados ao INSS. Os que atendem o maior número de brasileiros são Banco do Brasil, Bradesco e Caixa Econômica Federal.

O presidente da Federação Brasileira das Associações de Bancos (Febraban), Fábio Barbosa, saiu do encontro elogiando a atuação do ministro Marinho. Disse que a antecipação vai trazer redução de custos para os bancos - que precisam abrir mais cedo, por exemplo, para efetuar o pagamento das aposentadorias. As instituições, porém, também ganharão de outra forma: aplicando no mercado financeiro em dezembro recursos adicionais.

- Teremos uma compensação parcial. Isso (alteração no cronograma de pagamento dos benefícios) vai desafogar as agências - disse Barbosa.

Ele se esquivou das perguntas sobre eventuais prejuízos durante os 12 meses de isenção de tarifas por parte do INSS. Marinho, de qualquer forma, rejeitou eventuais reclamações. O ministro comparou o Banpará com o Bradesco. Na avaliação dele, o governo poderia até pagar ao banco paraense pelo custo da operação, mas não para a maior instituição financeira privada do país, que lucra com a folha, devido ao acesso a clientes bons pagadores:

- Eles alegam prejuízos, coitadinhos. Mas, a partir daqui, nós enxergamos a possibilidade de passar a receber e jamais pagar.

Durante o anúncio do acordo, Marinho lembrou que, quando assumiu a pasta em março deste ano, a Fazenda tinha pronta uma proposta para leiloar a folha de pagamento do INSS em lotes e por regiões. Porém, temendo eventuais transtornos aos aposentados, acostumados a receber o benefício nos bancos indicados, ele iniciou uma negociação para evitar a venda do ativo, tentando que as instituições dessem o preço que estavam dispostas a pagar por sua fatia na folha.

- Buscamos um formato que substituísse o leilão, preservando a distribuição da rede de bancos, garantindo a prestação de um serviço de qualidade, sem transtornos aos nossos segurados - argumentou Marinho.

Sem conseguir avançar no novo modelo, durante nove meses de negociação e depois de ameaçar retomar a proposta da Fazenda, Marinho deu mais tempo aos bancos, embora tenha afirmado ter a convicção de que o setor financeiro tem que pagar pela folha.

- Temos convicção de que esse produto tem um valor. Queremos que o grupo de trabalho estude isso para evitar darmos razão à Fazenda - afirmou Marinho.

Presente ao encontro, o secretário-executivo da Fazenda, Nelson Machado, comemorou o acordo:

- Esse é um passo importante e vai dar condições de se buscar uma modelagem mais adequada. A Fazenda sempre defendeu a revisão do sistema de pagamentos pela prestação dos serviços.