Título: Pé no acelerador
Autor: Rodrigues, Luciana; Almeida, Cássia
Fonte: O Globo, 13/12/2007, Economia, p. 29

PIBÃO

Impulsionada por consumo interno, economia cresce 5,7% no 3º trimestre e surpreende.

Um crescimento forte, generalizado e acima das expectativas. O Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de todos os bens e serviços produzidos pelo país) no terceiro trimestre, divulgado ontem pelo IBGE, surpreendeu ao registrar expansão de 5,7% frente ao mesmo período do ano passado. O PIB cresceu graças, principalmente, aos investimentos e ao consumo das famílias. Pelo lado da oferta, houve expansão forte na agropecuária (9,2%), e o desempenho foi positivo em todos os demais 11 segmentos de indústria e serviços medidos pelo IBGE.

Frente ao segundo trimestre, a economia cresceu 1,7%, já descontados os efeitos sazonais. Assim, entre junho e setembro, foram produzidos R$645,2 bilhões em bens e serviços no Brasil. O IBGE também revisou para cima o resultado do PIB em 2006 (de 3,7% para 3,8%) e no primeiro semestre deste ano. Essa revisão, aliada à expansão maior do que se previa no terceiro trimestre, já faz com que os analistas dêem como certo um crescimento superior a 5% este ano.

Desde 2004, a economia brasileira não crescia a um ritmo tão forte. Mas, naquela época, as exportações ainda estavam em franca expansão. Dessa vez, a taxa de 5,7% registrada no último trimestre foi puxada apenas pelo mercado doméstico. O economista José Ronaldo Souza Júnior, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), estima que a demanda interna cresceu nada menos do que 7,9% no terceiro trimestre. O grande destaque ficou com os investimentos, que registraram alta de 14,4%, a maior da série histórica do IBGE, iniciada em 1996.

Gastos das famílias: maior alta desde 97

Mas o consumo também está a pleno vapor. As famílias brasileiras vêm expandindo seus gastos há 16 trimestres consecutivos. A taxa de 6% registrada agora é a maior em dez anos. Resultado dos ganhos de renda e do avanço do crediário nos últimos meses. A massa salarial (a soma dos salários pagos aos trabalhadores) cresceu 4,3% no último trimestre. E o volume de financiamento a pessoas físicas teve alta de 30,4%, em termos nominais.

Amparado no crédito, o office-boy Robson Jorge Menezes Costa, de 19 anos, já comprou celular, tênis e bicicleta:

- Compro tudo parcelado. No ano que vem, estou me programando para comprar uma moto em 36 meses. Tenho que aproveitar agora que não tenho família para comprar essas coisas mais caras - explica Robson, que ganha um salário mínimo por mês.

Com o ensino médio incompleto, ele ainda mora com os pais, o que facilita seu consumo, já que não é responsável pelas despesas da casa, dando apenas uma pequena contribuição. Consumidores como Robson já fazem os analistas preverem que este será o melhor Natal em pelo menos cinco anos.

No PIB, o comércio registrou expansão de 7,4% no terceiro trimestre. Mas os dados incluem, além do varejo, o setor atacadista, que cresceu graças também ao avanço da agropecuária e da indústria.

- Uma surpresa positiva surgiu do comércio e da indústria, com os bens de consumo duráveis (eletrodomésticos, automóveis e outros). Com os investimentos em alta, o crescimento nesse nível tende a continuar num período mais longo sem gerar pressão inflacionária - diz José Ronaldo Souza Júnior, do Ipea.

Outro fator que ajuda a segurar os preços é o dólar baixo, que levou a um aumento de 20,4% nas importações no terceiro trimestre. Como as exportações cresceram só 1,8% no PIB, Souza Júnior, do Ipea, estima que a expansão da economia teria sido 2,2 pontos percentuais maior se não fosse o setor externo.

- A demanda interna ficou ainda mais forte do que o previsto. Como a economia internacional está desacelerando, o saldo comercial deve diminuir daqui para frente - destaca a economista Giovanna Rocca, do Unibanco, que vê, porém, riscos maiores à inflação. - Com esse resultado do PIB, o Banco Central ficará ainda mais atento.

Entre os segmentos da economia brasileira medidos pelo IBGE, os serviços financeiros foram os que tiveram a maior expansão no terceiro trimestre: 13,3%. O crédito, os diferentes tipos de seguros e os serviços bancários em geral explicam esse crescimento.

- Quando os bancos batem lucro recorde, estão refletindo esse crescimento do PIB dos serviços de intermediação financeira - lembra Rebeca Palis, da coordenação de Contas Nacionais do IBGE.

Os serviços de informação também tiveram forte expansão, de 8,6%. Nesse conjunto, entra a telefonia móvel, cujo crescimento superou 10%, incluindo não só as ligações, mas também serviços como torpedo e acesso à internet.

- A telefonia móvel está crescendo com força há bastante tempo e, com isso, tem aumentado seu peso nos serviços de informação. Dessa vez, não houve queda na telefonia fixa, porém o crescimento foi bem inferior ao da móvel - explica Rebeca.

Por outro lado, nos serviços, o segmento com pior desempenho foi a administração pública (saúde, educação e outros), com alta de apenas 1,5%. A economista do IBGE lembra que os serviços públicos têm crescido sistematicamente abaixo da média do PIB.

Na indústria, a expansão foi liderada pela manufatura de transformação, com alta de 5,7%. Giovanna Rocca, do Unibanco, lembra que o setor deve continuar com bom desempenho no quarto trimestre, já que, em outubro, a produção industrial cresceu 10,3%. No segmento de utilidade pública (energia, gás e água), o crescimento foi de 3,8%, com a indústria de gás registrando ligeira queda e a de energia, expansão superior a 4%. A indústria extrativa mineral avançou só 2%, prejudicada por paradas técnicas e atrasos na entrada em operação de algumas plataformas de petróleo.

Chama atenção a expansão de 8,7% nos impostos sobre produtos, ou seja, acima da média de 5,7% no PIB. Mas, segundo Rebeca Palis, do IBGE, essa alta é explicada, principalmente, pela incidência de impostos sobre produtos importados. Além disso, o setor automobilístico, que vem registrando forte crescimento, também sofre maior incidência de impostos.

IBGE revê para cima taxas anteriores

O IBGE revisou para cima o resultado de todos os grandes setores em 2006 e no primeiro semestre de 2007. Assim, a economia brasileira cresceu na verdade 4,5% entre janeiro e março e 5,6% entre abril e junho, na comparação com o mesmo período do ano passado. Antes, o IBGE informara uma expansão de 4,4% e 5,4%, respectivamente.

Também foi revista a série com ajuste sazonal, ou seja, frente ao trimestre imediatamente anterior. Nessa comparação, o avanço do PIB saiu de 0,9% para 1,1%, no primeiro trimestre, e de 0,8% para 1,3% no segundo trimestre.

A magnitude do crescimento brasileiro este ano foi a grande surpresa da divulgação do PIB.

- Todos esperávamos a liderança do investimento, o crescimento forte do consumo e a queda da poupança. O que surpreendeu foi o tamanho do crescimento. Considerando a expansão na margem (frente ao segundo trimestre, já com ajuste sazonal) de 1,7%, chegaríamos a uma economia crescendo a 7% em termos anuais. É muito forte - resume Armando Castelar, do Ipea.