Título: Um dia de luto para a saúde
Autor: Éboli, Evandro
Fonte: O Globo, 14/12/2007, O País, p. 8

Menos de 24 horas depois da derrota no Congresso, o ministro da Saúde, José Gomes Temporão, sentenciou: ontem foi um dia de luto para a saúde pública no país. O ministro teve taquicardia durante a votação e dormiu mal após o resultado.

Como o senhor avalia o resultado?

JOSÉ GOMES TEMPORÃO: Hoje é um dia de luto para a saúde pública. A perda é incomensurável. Foi um grande baque. A história do SUS sempre foi um processo difícil. Nos anos 90, chegou a ser preciso pegar empréstimo do FAT para pagar hospitais. Aí, veio a luta do Adib Jatene pela CPMF. Depois, Emenda 29.

Que sensação o senhor teve logo após ver o placar eletrônico com o resultado?

TEMPORÃO: Deixou um travo amargo para todos que militam na saúde pública. É frustrante. Eu, que milito há 30 anos na saúde pública, tinha a expectativa de um grande acordo. O governo acenou com essa proposta. O senador Pedro Simon (PMDB-RS) foi claro ao dizer que como pode alguém recusar uma proposta assinada pelo presidente da República e garantindo que todo o dinheiro vai para a saúde? Foi um choque. Estou chocado. O resultado prático foi o pior possível. Pergunto: quem ganhou com essa decisão?

O senhor acreditou que o apelo de Simon pudesse sensibilizar a oposição?

TEMPORÃO: Fiquei impressionado com o não-acatamento. A decisão foi política e não levou em consideração a necessidade do homem comum, que depende do SUS. Todos os senadores que votaram têm plano de saúde particular e são atendidos nos melhores hospitais brasileiros. A disputa foi por poder. Votaram de olho em 2010. O interesse público ficou de lado. Isso ficou evidente para mim.

Quais serão as conseqüências para o atendimento?

TEMPORÃO: Quem depende do SUS perdeu. O impacto será muito grande. As medidas previstas no PAC da Saúde, como universalização da atenção básica, a ampliação do Samu, o aumento de medicamentos subsidiados na farmácia popular, a construção de hospitais e prontos-socorros estão correndo sério risco. Na prática, significa que as filas irão se manter, o mau atendimento e o tempo de espera elevado também. Vou tentar seguir o que me determinou o presidente, de que a saúde seja prioridade.

Faltou sensibilidade à oposição?

TEMPORÃO: A oposição... Olha o que ocorreu nos últimos 15 dias: o Pnud mudou o Brasil de país em desenvolvimento para desenvolvido; o IBGE anunciou queda da mortalidade infantil; a expectativa de vida continua crescendo; a economia cresce mais de 5%; o governo Lula aparece na pesquisa CNI/Ibope com aprovação altíssima. Isso é insuportável para a oposição. Ninguém tolera. É demais. Paradoxalmente, esses indicadores foram avanços na saúde.

Deu vontade de deixar o ministério?

TEMPORÃO: Não! Nunca! O que é isso? A guerra nem começou.