Título: Juros devem cair só no 2º semestre de 2008
Autor: Duarte, Patrícia
Fonte: O Globo, 14/12/2007, Economia, p. 35

DERROTA NO CONGRESSO: Para especialistas, alta de 5,7% do PIB e fim da CPMF vão influenciar autoridade monetária

Analistas dizem que ata do Copom indica que BC está mais preocupado com inflação e cortes podem ser menores

BRASÍLIA. O Banco Central (BC) deve demorar ainda mais para voltar a cortar a taxa básica de juros, algo que deverá ocorrer apenas a partir do segundo semestre de 2008, diferentemente do que pensava boa parte do mercado. As reduções tendem a ser menos intensas ou, dependendo da conjuntura, podem nem mesmo acontecer no próximo ano. A indicação veio ontem com a divulgação da ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do ano, realizada na semana passada, quando o BC decidiu manter a Taxa Selic em 11,25% ao ano pela segunda vez seguida.

Pelo documento, a autoridade monetária reforça a preocupação central com o possível descompasso entre o crescimento da oferta de produtos e a demanda, o que pode trazer mais inflação. Para especialistas, discretamente o BC aumentou o tom cauteloso ao, por exemplo, afirmar que o risco de inflação "reduz sensivelmente a margem de segurança da política monetária". Na ata anterior, de outubro, a palavra "sensivelmente" não existia.

- O Copom continua com a visão conservadora, com o possível repasse de preços na economia - resumiu Joel Pogdanski, consultor de análises econômicas do banco Itaú.

BC ressalta uso recorde da capacidade instalada

Pogdanski acredita que o Copom poderá voltar a reduzir juros só no segundo semestre de 2008. Antes, o economista apostava em novos cortes já a partir de janeiro, quando o comitê se reunirá novamente.

A estimativa também piorou em relação à intensidade dos cortes: a previsão é que a Selic feche o ano a 10,50% anuais, acima dos 10% esperados até então. Além da ata, pesam ainda a divulgação da maior expansão do Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens de serviços produzidos no país) na última quarta-feira - de 5,7% no terceiro trimestre, conhecida depois da reunião do Copom - e a não prorrogação da CPMF, que pode piorar as contas públicas.

- O dado (do PIB) só deixa mais clara a agenda de preocupação do BC com a oferta e demanda - disse o economista sênior da Unibanco Asset Management, José Luciano Costa.

Ele acredita que só haverá reduções nos juros após julho do ano que vem, com a Selic fechando 2008 em 10,50%. Este percentual é o mesmo da média do mercado coletada pela pesquisa Focus do BC.

Pela ata, o Copom avalia que "o ritmo da demanda doméstica, que deve continuar sendo sustentado, entre outros, pelo impulso derivado do relaxamento da política monetária implementado este ano, continua podendo colocar riscos não desprezíveis para a dinâmica inflacionária. Nesse contexto, a redução consistente do descompasso entre o ritmo de ampliação da oferta de bens e serviços e o da demanda torna-se ainda mais relevante na avaliação das possibilidades que se apresentam para a política monetária".

Para especialistas, o BC fez questão de frisar que o uso da capacidade instalada no país está em níveis recordes, na faixa dos 83% em outubro. Na ata, escreveu que "a redução da capacidade ociosa manifesta-se em diversos setores e ocorre a despeito do aumento substancial do volume de investimentos", que avançaram 14,4% no terceiro trimestre e hoje estão próximos de 18% do PIB. Sem citar números, o BC puxou para cima suas previsões para o IPCA em 2007 e 2008, mas disse que continuam abaixo da meta do governo, de 4,5%. No mercado, elas estão acima dos 4%.

Economista: risco de Selic maior cresce se cenário piorar

Com olhar mais rigoroso e ainda minoria no mercado, o ABN Amro reforçou a sua estimativa de que o Copom nem vai cortar a Selic no próximo ano, diante das indicações da ata. A economista-chefe do banco, Zeina Latif, explicou que trabalha com a manutenção da taxa a médio prazo, mas ressalva que aumentaram os riscos de o BC, caso o cenário piore, passar a subir os juros.

O Copom também mostrou na ata, mais uma vez, que o cenário externo não é a grande fonte de preocupação, nem a disparada dos preços do petróleo, que beiraram os US$100 o barril. Por isso, manteve a projeção de estabilidade nos preços domésticos da gasolina este ano. Mas, como ressaltou o economista-chefe do banco Schahin, Sílvio Campos Neto, a autoridade monetária não fez previsões para 2008, apesar de a ata de ontem ter sido a última do ano.

No entanto, o BC fez mudanças para o cálculo das tarifas de energia - que passou de um reajuste negativo de 4,4% para redução de 6% neste ano - e de telefonia fixa, cujo aumento foi reduzido de 2,3% para 0,8%.