Título: Foco nos impostos
Autor: Galhardo, Ricardo
Fonte: O Globo, 17/12/2007, Economia, p. 22

Estatuto de Santa Cruz prevê que estado controle gás com o governo federal.

Oestatuto que decreta a autonomia do estado de Santa Cruz de La Sierra, o mais rico da Bolívia, prevê a criação de uma empresa estadual de hidrocarbonetos com as mesmas funções da YPFB, a estatal federal que controla a exploração e a produção de petróleo, gás e derivados na Bolívia. Além disso, o estatuto - apresentado anteontem diante de mais de cem mil pessoas e que deve ainda ser submetido a referendo popular - prevê mudanças na forma de repasse dos tributos referentes a petróleo e gás ao governo federal. O desequilíbrio nos valores repassados pelo governo federal aos estados é um dos principais pontos de atrito entre os quatro departamentos que pedem autonomia e o governo central, em La Paz.

O estatuto diz, no artigo 117, que "para garantir o abastecimento de hidrocarbonetos líquidos e gasosos em condições ótimas de quantidade e qualidade no território estadual, o governo do estado poderá determinar, com autorização da Assembléia Legislativa, a criação de uma empresa estadual de hidrocarbonetos pública ou de economia mista para participar do setor".

Segundo o governador de Santa Cruz, Rúben Costas, principal líder da oposição ao presidente Evo Morales, o objetivo é compartilhar a exploração e a produção com o governo federal.

- O que pedimos é que tenhamos uma responsabilidade compartilhada com o governo central. Se temos os recursos econômicos, por que não criar uma empresa e participar da exploração? - disse Costas.

De acordo com integrantes do Comitê Cívico de Santa Cruz, um dos objetivos da empresa seria fiscalizar o volume de petróleo e derivados produzido no estado para que haja maior controle sobre os repasses recebidos de La Paz.

Pesquisa mostra vitória do "sim" em referendo

O estatuto também prevê mudanças na forma de arrecadação dos impostos sobre os hidrocarbonetos. Segundo o artigo 135, será criada uma Agência Tributária Estadual com o objetivo de recolher os impostos e repassar a parte destinada ao governo federal. Santa Cruz é responsável por 35% do PIB boliviano. O estatuto considera como "renda do estado" todo o recurso proveniente do Imposto Direto sobre os Hidrocarbonetos (IDH). Há três semanas, o governo Morales aprovou a Lei de Renda e Dignidade - sem a participação da oposição - pela qual os estados destinariam 30% do IDH para o pagamento de uma renda mínima a maiores de 60 anos. Com isso, os repasses cairiam de 57% para 25%. A lei começa a valer em janeiro e os cinco governadores de oposição se recusam a cumpri-la.

Ontem, os líderes da oposição a Morales em Santa Cruz começaram a coletar assinaturas para aprovar, junto à Corte Eleitoral, um referendo popular sobre o estatuto.

Pesquisa do instituto Equipos Mori, divulgada ontem no jornal "La Razón", mostra que o "sim" à autonomia ganharia hoje em seis dos nove estados bolivianos (Santa Cruz, Pando, Beni, Tarija, Cochabamba e Chuquisaca). Na consulta popular de julho de 2006, apenas quatro estados disseram sim à autonomia (Santa Cruz, Pando, Beni e Tarija, a chamada Meia Lua, região mais rica do país) e anteontem apresentaram seus estatutos autônomos. Segundo analistas, a forte repressão da polícia às manifestações em Sucre, capital de Chuquisaca, onde três pessoas morreram, e a forma como Morales aprovou o texto da nova Constituição Política do Estado, dentro de um quartel e sem a participação da oposição, são os maiores motivos para a expansão autonomista.