Título: O Brasil voltou a crescer
Autor: Batista Jr., Paulo Nogueira
Fonte: O Globo, 15/12/2007, Opinião, p. 7

Toda uma geração de brasileiros não sabe realmente o que é crescimento econômico. Desde o início da década de 1980, a economia nacional vegeta numa quase-estagnação, interrompida por surtos ocasionais de dinamismo. Estávamos quase habituados a não crescer. A minha geração de economistas, que começou a trabalhar por volta do fim dos anos de 1970, passou grande parte da sua vida profissional discutindo as condições para a retomada do desenvolvimento. Foi um dos nossos temas preferidos.

Tudo indica que o quadro está finalmente mudando. Os dados do PIB do terceiro trimestre de 2007, divulgados há poucos dias pelo IBGE, superaram as expectativas e surpreenderam os economistas que se dedicam à ingrata tarefa de fazer previsões quantitativas. Por exemplo, as previsões do FMI para o Brasil indicam crescimento de 4,4% em 2007 e 4% em 2008. Publicadas há apenas dois meses, essas previsões já estão superadas.

No acumulado do ano até setembro, o PIB cresceu 5,3% em relação a igual período de 2006. Quando se compara o terceiro trimestre deste ano com o terceiro do ano passado, a taxa de crescimento alcança 5,7%. O dinamismo da economia se apóia inteiramente no mercado interno. O ponto de destaque é a expansão de 12,4% do investimento fixo no acumulado do ano. A economia está crescendo e criando capacidade produtiva nova. O ponto fraco é a contribuição negativa do setor externo. Com a valorização do real, as exportações de bens e serviços vêm aumentando muito menos do que as importações.

O que explica a retomada do crescimento? Fundamentalmente, acredito, a flexibilização da política macroeconômica desde 2006. Até fins de 2005/início de 2006, o Brasil foi submetido a políticas monetárias e fiscais excessivamente restritivas. Essas políticas eram necessárias para enfrentar a crise de 2002-2003, mas foram mantidas por tempo exagerado. Com algum atraso, o governo acabou percebendo que havia espaço para mudar sem perder o controle sobre a inflação. As taxas de juro foram reduzidas, o crédito cresceu e aumentou a massa salarial. A economia respondeu bem, como fica claro agora.

A inflação continua bem comportada. As contas públicas estão bastante ajustadas, graças em parte à aceleração do crescimento econômico e à diminuição das taxas de juro. O desafio nesse momento é adotar medidas fiscais para compensar, pelo menos em parte, a perda da CPMF.

Corremos o risco, como sempre, de que a retomada do desenvolvimento econômico venha a ser sufocada por temores exagerados de volta da inflação. As taxas de juro brasileiras continuam altas para padrões internacionais - a turma da bufunfa não pode se queixar muito. A relação crédito/PIB ainda é baixa. E não há, ao que parece, grande risco de aumento da inflação.

Não se deve perder de vista, além disso, que o ritmo atual de crescimento do Brasil nada tem de excepcional. Podemos comemorar, mas sem exageros. As principais economias emergentes continuam crescendo bem mais. A China registra expansão de 11,5% (terceiro trimestre de 2007 contra terceiro de 2006); a Índia 8,9%; a Rússia, 7,6%; a Argentina, 8,7%.

A retomada do desenvolvimento brasileiro apenas começou. Não vamos permitir que ela seja abortada por escrúpulos doutrinários ou pela preocupação em atender às expectativas do mercado financeiro, sempre disposto a sacrificar o crescimento e a geração de empregos no altar dos juros altos.

Chega de marcar passo. Temos que correr atrás do prejuízo de 25 anos de quase-estagnação econômica.

PAULO NOGUEIRA BATISTA JR. é economista e diretor-executivo pelo Brasil e mais oito países no Fundo Monetário Internacional. E-mail: pnbjr@attglobal.net