Título: Enxugando gastos no INSS
Autor: Doca, Geralda; Paul, Gustavo
Fonte: O Globo, 16/12/2007, Economia, p. 35

DERROTA NO CONGRESSO

Após extinção da CPMF, Previdência prepara medidas para cortar despesas. Filantrópicas são alvo

Diante da falta de disposição do governo de enfrentar o desgaste de uma reforma ampla na Previdência Social - uma vez que o Fórum criado para discutir o assunto fracassou - o ministro da pasta, Luiz Marinho, já começou a trabalhar em um pacote para melhorar a gestão e reduzir despesas, apostando no aumento da eficiência e da produtividade. Algumas medidas serão inclusive aceleradas, para integrar o esforço concentrado do Executivo de equilibrar o Orçamento após a extinção da CPMF. As entidades filantrópicas, que são isentas de pagamento ao INSS, são um dos alvos para conter os gastos dessa que é uma das áreas mais explosivas das contas públicas, com rombo estimado em R$47,4 bilhões em 2007.

Além de negar nove pedidos de revalidação de entidades, o ministro encaminhou à Casa Civil um projeto de lei para endurecer a fiscalização e concessão de novos certificados. Por ano, o segmento deixa de recolher cerca de R$5 bilhões em contribuições previdenciárias.

A proposta prevê reduzir o período de avaliação das entidades filantrópicas de três anos para um ano. Ao fim desse período, somente terá o certificado renovado quem tiver cumprido sua função social, nas áreas da saúde, educação e assistência social. Além disso, a entidade que tiver o registro cassado deverá recolher as contribuições previdenciárias.

- O modelo tem de mudar em benefícios dos bons - disse ao GLOBO o ministro Luiz Marinho.

Dataprev abre amanhã plano de demissão

Marinho contou que o formato atual não funciona, pois, dificilmente, uma entidade tem condições financeiras de recolher os impostos com três anos de atraso. Elas são autuadas, mas entram na Justiça para ter o registro de volta e continuar sem pagar. Há no ministério, segundo Marinho, entidades que não são fiscalizadas há nove anos.

Nas discussões sobre o assunto, ficou acertado que cada ministério envolvido fiscalizará as entidades sob sua responsabilidade. Hospitais, por exemplo, ficarão com a pasta da Saúde. A única fiscalização existente hoje é a feita pela Receita Federal e se restringe a aspectos burocráticos, como falta de documentação. Marinho ressalta, porém, que há entidades sérias prestando bons serviços à população.

Para dar eficiência e agilidade ao sistema de gestão de informações da Previdência - um gigantesco banco de dados que volta e meia fica fora do ar -, Marinho quer mudar o perfil da Dataprev e já lançou um plano de demissão voluntária para substituir a mão-de-obra por pessoal mais especializado. O Plano de Demissão Incentivada (PDI) começa amanhã e termina em 17 de janeiro.

A reforma administrativa do ministro prevê ainda incentivos aos funcionários, com a criação de uma gratificação por produtividade a quem cumprir metas para melhorar o atendimento nos postos do INSS, a partir de março. O servidor passará por uma avaliação individual e outra coletiva, da equipe que integra. O salário-base do servidor poderá até dobrar de acordo com as avaliações. Essa é uma inovação no poder público.

Também fazem parte do cardápio o cerco às fraudes e a punição com demissões de funcionários envolvidos em irregularidades. Só este ano foram demitidos 115 servidores, contra 46 no ano anterior. Esse conjunto de medidas, segundo Marinho, se sobrepõe às conclusões do Fórum da Previdência. Os participantes não apontaram no relatório qualquer ação importante para conter o aumento dos gastos previdenciários, nem mesmo para as futuras gerações.

- Essas medidas são mais importantes do que o relatório do Fórum - afirmou o ministro.

Marinho contou ainda que o seu antecessor, o atual secretário-executivo da Fazenda, Nelson Machado, investiu na modernização dos equipamentos da Dataprev. Mas, segundo ele, a empresa é formada, basicamente, por veteranos:

- Se uma empresa de tecnologia só emprega veteranos, alguma coisa está errada. Onde estão os jovens recém-formados e cobras no assunto?

A expectativa é de adesão de 20% do quadro de 3.112 funcionários da Dataprev ao PDI. A empresa tem unidades em todas as capitais, sendo que metade do quadro de pessoal está lotada no Rio. Depois do enxugamento, o ministro pretende abrir concurso para contratar técnicos em informática, além de buscar "talentos no mercado". De acordo com dados do ministério, a idade média dos empregados da Dataprev é de 45 anos, e alguns têm mais de 30 anos de serviço. Há muitos casos de empregados em auxílio-doença, alguns há seis anos.

Para Marcelo Caetano, pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), as medidas administrativas tocadas pelo governo são importantes, mas insuficientes para atacar a raiz do problema, o crescimento das despesas previdenciárias. Ele destacou que, entre janeiro e outubro deste ano, os gastos com aposentadoria atingiram R$149,4 bilhões, um crescimento real (descontada a inflação) de 6,6%, na comparação com o mesmo período do ano passado. O índice já supera a projeção para o crescimento da economia, de 5%.

- A despeito dessas medidas, as despesas continuam crescendo - disse Caetano, destacando que governo Lula se restringiu à reforma administrativa da Previdência.

O ex-ministro da Previdência José Cechin considera as medidas corretas, mas alerta para a forma de aplicação, que pode torná-las inócuas:

- As medidas vão na direção certa, mas o governo precisa saber adotá-las. Corre-se o risco, por exemplo, de saírem da Dataprev os melhores funcionários, e as avaliações dos funcionários serem sempre positivas, por razões corporativas.