Título: Em busca do equilíbrio
Autor: Oliveira, Eliane
Fonte: O Globo, 26/12/2007, Economia, p. 17

Para crescer mais de 5% sem fantasma da inflação, país precisa ampliar investimentos

Depois de ter adotado uma política mais ortodoxa no primeiro mandato para segurar a inflação, o governo Lula agora parte para uma receita de mais crescimento econômico. Mas, diante dos gargalos de infra-estrutura e logística e de uma expansão do crédito, o segredo agora é evitar que esse crescimento se traduza em inflação, preocupação deste fim de 2007. A alta de preços deve ficar abaixo do aumento de 5% previsto para o Produto Interno Bruto (PIB, o conjunto de bens e serviços produzidos no país) este ano. Em busca da calibragem ideal entre o ritmo de atividade econômica e o aumento do custo de vida, o Banco Central (BC) estará no centro das atenções no primeiro semestre de 2008.

Taxa de crescimento de 5% ou mais, alertam analistas, só será viável se for acompanhada de investimentos vultosos, que dêem fôlego para que a economia apresente saltos maiores do PIB sem pressionar os preços. Para o economista do ABN Amro Cristiano Souza, o ideal em 2008 será crescer em torno de 4%.

- Essa taxa impediria a aceleração dos índices de preços, embora estejamos crescendo acima disso: 5,2% em 2007 - afirma Souza.

Ele destaca que a economia continuará aquecida em 2008. E lembrou que, ainda no primeiro semestre, os efeitos da trajetória de queda de juros - interrompida em outubro deste ano, quando o BC manteve a Selic em 11,25% ao ano - continuarão se refletindo nos mercados.

- No primeiro trimestre do ano que, vem as discussões sobre a possibilidade de o BC aumentar os juros vão esquentar - prevê o economista.

Newton Marques, professor de economia da Universidade de Brasília, afirma que qualquer crescimento acima de 5% é perigoso. Para isso, são necessários investimentos de pelo menos 22% do PIB, enquanto hoje a média é de 18%.

- Um crescimento desse porte requer mais energia elétrica, condições de transporte, mão-de-obra qualificada, insumos e ampliação da capacidade produtiva - diz o acadêmico, que também é do Conselho Regional de Economia de Brasília.

O economista sênior do Unibanco Asset Management, Luciano Costa, prevê uma taxa entre 4,3% e 4,5%, que ele considera confortável.

- A situação preocupa, pois a folga está no limite - alerta Costa.

Governo não vê motivo para preocupação

O consultor do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi) Júlio Gomes de Almeida acredita que a"causa das causas" do aumento da inflação no país é a acentuada elevação dos preços dos alimentos e do petróleo no mundo. Sobre a hipótese de o Banco Central aumentar os juros, Almeida adverte:

- Eu não mexeria em nada a curto prazo, embora a situação inspire cuidados. Uma alta nas taxas de juros faria com que os empresários revissem suas projeções de crescimento.

A despeito dessas pressões inflacionárias, especialmente dos alimentos, o Ministério da Fazenda não vê motivo de preocupação quanto ao risco de a inflação prejudicar o crescimento em 2008. Já o ministro Guido Mantega garante que o crescimento da economia brasileira ocorre com a inflação sob controle, ao contrário de outros países sul-americanos;

- Quando converso com ministros dos países da América do Sul, eles comemoram que estão dentro da banda da meta da inflação, mas acima da meta, dentro do intervalo. Nós estamos bem abaixo da meta e crescendo - destaca.

Segundo o secretário de Acompanhamento Econômico, Nelson Barbosa, no mercado interno, os últimos reajustes na cotação de itens como o leite são pontuais e não se manterão por muito tempo. Ele reconhece que esse fenômeno interferiu na forma como o Banco Central está conduzindo a política de juros, mas afirma:

- O Brasil não precisa de juros para estimular o crescimento.

Para Barbosa, o conservadorismo do BC em relação aos juros deve durar até meados de 2008, quando os preços de alimentos darão uma trégua à inflação. Na avaliação da Fazenda, o BC não precisava ter interrompido a trajetória de juros por causa dos alimentos, mas, já que isso ocorreu, o quadro não é tão preocupante, pois a própria produção industrial e o crescimento da economia têm mostrado que o cenário é positivo.

A Confederação Nacional da Indústria (CNI) aposta num crescimento de 5,3% no PIB este ano e uma taxa de 5% em 2008. Os economistas da entidade enfatizam que o crescimento tem sido acompanhado de melhor distribuição de renda; aumento da formalização de mão-de-obra e ampliação do volume de crédito.

No entanto, os especialistas da CNI apontam, entre os principais fatores que ameaçam a continuidade do crescimento, a valorização excessiva do real frente ao dólar e outras moedas; o aumento dos gastos públicos; a alta carga tributária; e a falta de investimento em infra-estrutura, que afeta a competitividade dos produtos brasileiros.

"O crescimento acelerado do PIB em 2007 não significa a consolidação de um novo patamar de crescimento econômico. O desafio é aprimorar o ambiente de negócios, de modo a incentivar o investimento privado", diz a CNI em seu boletim "Perspectivas 2008".

COLABORARAM Henrique Gomes Batista e Martha Beck