Título: Pequeno grande crédito
Autor: Duarte, Patrícia
Fonte: O Globo, 30/12/2007, Economia, p. 25

Empréstimos abaixo de R$5 mil avançam com cenário econômico, consignado e popularização do cartão.

Diferentemente do que vinha acontecendo no último ano, o volume de crédito de pequeno valor para pessoas físicas - abaixo de R$5 mil - voltou a ganhar força e, há poucos meses, tem avançado mais que outras modalidades. Os motivos são variados, mas todos têm relação com o bom momento da economia, o emprego e o crescimento da renda. Bancos e financeiras destacam o crédito consignado com desconto em folha de pagamento e o maior uso de cartão de crédito pela população de baixa renda para explicar o cenário. E adiantam que se trata de uma tendência.

Segundo dados do Banco Central (BC), no trimestre fechado em setembro os empréstimos nessa faixa menor cresceram 6,8%, muito diferente da queda de quase 1% vista entre julho e setembro de 2006. O crédito entre R$5 mil e R$50 mil, por exemplo, cresceu 6,5% no mesmo período. Nos últimos tempos, ele era o que mais avançava por causa do estouro nos empréstimos para compra da casa própria.

- O que estamos vendo é a destinação de recursos para pessoas de menor renda, com a maior bancarização - costuma afirmar o chefe do Departamento Econômico do BC, Altamir Lopes.

De acordo com o BC, o volume total de crédito no Brasil vai continuar crescendo acima dos 20% anuais em 2008 e, em breve, deve atingir a marca de R$1 trilhão.

Para especialista, risco não é maior

No Unibanco, que também controla a Fininvest, a estratégia é oferecer cartão de crédito para os clientes que têm renda mensal entre R$500 e R$1 mil, o que já resultou em crescimento de 35% no uso dessa linha este ano, segundo o diretor-executivo de crédito e risco para varejo da instituição, Roberto Lamy:

- O momento para o risco é muito favorável, com renda crescendo e desemprego diminuindo. Isso tudo faz com que essas pessoas tenham mais crédito.

De olho em um novo aparelho de som, o porteiro Enoc de Melo diz que já começa a considerar a possibilidade de usar seu cartão de crédito para parcelar as compras. Mas só se não tiver juros, porque sabe que as taxas são bastante elevadas, na casa dos 10% ao mês. Melo, que tem limite de R$900 no cartão, conta que está acostumado a fazer carnês nas lojas e que acabou de quitar a compra de uma TV. Agora, já pensa na nova aquisição.

- Se eu encontrar uma loja em que eu possa parcelar (a compra do som) pelo cartão, e se me agradar, vou fazer - afirmou ele, que tem renda mensal de R$442.

O empréstimo com desconto em folha de pagamento também tem ajudado a impulsionar o crédito menor. No Banco do Brasil (BB), segundo o gerente-executivo de empréstimo e financiamentos da instituição, Gueigiro Matsuo Genso, até junho essas linhas tinham crescido 11,4% no acumulado do ano, cujo tíquete médio é de R$4,5 mil. Nesse caso, diz ele, o risco é praticamente inexistente e, por isso, a tendência é continuar no mesmo ritmo. O maior potencial recai no consumidor do setor privado, onde o BB tem focado suas ações para fechar convênios. Em junho, 88,1% dos clientes que tinham consignado no banco eram funcionários públicos.

Apesar das facilidades para conseguir mais crédito, o consumidor tem de ficar atento. O vice-presidente da Anefac (associação que reúne os executivos de finanças), Miguel Oliveira, aconselha que se faça uma ampla pesquisa para ver as melhores condições de financiamento, com os juros mais em conta. Mesmo com o recuo nos últimos anos, as taxas cobradas ainda são uma das mais elevadas do mundo, chegando, em média, a 140% ao ano no cheque especial. No crédito pessoal, elas beiram 50% anuais.

- O consumidor não pode se iludir, porque corre o risco de se endividar além da sua capacidade.

Para Oliveira, a tendência de crescimento dos empréstimos menores também deve continuar, uma vez que os consumidores das classes C, D e E, em geral, são bons pagadores.

- Os bancos vão se voltar cada vez mais para esse segmento, porque o risco (de inadimplência) não é mais elevado. As pessoas de baixa renda, normalmente, sabem que é preciso preservar o nome, pois é o único jeito para consumirem.

Controlar o uso do crédito é algo que a bancária Ana Cláudia Silveira faz há anos. Ela conta que não quer aumentar o limite de seus cartões de crédito, para não cair em tentação. Não ultrapassam os R$5 mil. Isso porque usa muito essas ferramentas como forma de parcelar as compras:

- Acho mais prático e seguro.