Título: Submarino nuclear já consumiu US$1 bilhão
Autor: Freire, Flávio
Fonte: O Globo, 01/01/2008, O País, p. 4

Projeto, considerado prioridade por Jobim, foi iniciado há 20 anos; Marinha ainda está construindo o protótipo.

SÃO PAULO. De cima de um morro, a vista é de um terreno de cimento batido, pouca estrutura metálica, cercado de árvores. Não fosse uma maquete instalada perto dali, seria impossível imaginar que é naquele local, na cidade de Iperó, interior de São Paulo, que a Marinha está construindo o protótipo do submarino nuclear brasileiro. Em discurso para especialistas no setor, em novembro, o ministro da Defesa, Nelson Jobim, disse que é vital para o Brasil contar com um submarino nuclear para proteger as riquezas nacionais - como a reserva gigante de petróleo, recém-descoberta na Bacia de Santos - de ataques terroristas.

Marinha ainda vai procurar estaleiro adequado

No entanto, mais de duas décadas depois de iniciado o programa do submarino nuclear - que já consumiu US$1,1 bilhão basicamente com a aquisição de equipamentos e pesquisas -, o Centro Tecnológico da Marinha (Aramar) trabalha ultimamente na criação de um protótipo apenas para testes, mas com a tecnologia que deverá ser utilizada num modelo real, com previsão para ter início dentro de sete anos.

- Aqui (Aramar) vamos construir um protótipo de terra. Depois de todos os testes, poderemos procurar um estaleiro adequado para criar um submarino com todas as condições de proteger o país. A nossa previsão é que começaremos a construí-lo entre quatro e sete anos - disse o diretor da área de enriquecimento de urânio da Marinha, o comandante André Luiz Ferreira Marques, durante visita do GLOBO às instalações onde é desenvolvido o projeto.

Desde que o programa começou, foram injetados, entre outros recursos, cerca de US$230 milhões no programa de desenvolvimento de enriquecimento de urânio, além de US$130 milhões com equipamentos e mais de US$450 milhões no pagamento de salários das mais de duas mil pessoas envolvidas no projeto. Ainda assim, o programa foi interrompido nos últimos anos por falta de recursos para a construção do prédio onde será criado o protótipo de terra.

O prédio, na verdade, é onde será criada a "ilha nuclear". Lá, a Marinha prepara a montagem do reator: um conjunto de equipamentos que inclui tubos geradores, condensadores, pressurizadores e vasos para acondicionar o urânio enriquecido. Tudo está acondicionado no laboratório de testes, um enorme galpão onde estão todos os equipamentos desenvolvidos em conjunto com empresas privadas.

- É um projeto militar e civil que vai colocar o Brasil entre os países com mais condições de defesa do mundo - disse o comandante.

Uma luz amarela acendeu no governo após a descoberta do megacampo de petróleo. Mas, ainda navegando lentamente, as expectativas em torno do submarino nuclear só aumentaram, ainda que timidamente, depois de o governo federal liberar, em julho deste ano, R$1 bilhão para o projeto, investimento que será destinado em parcelas de R$130 milhões ao ano. Com esses recursos, a Marinha projeta para o próximo ano o início da construção do cilindro (casco) do submarino, que poderá levar até 90 tripulantes.

O cilindro será construído pela empresa Jaraguá, instalada em Sorocaba, cidade vizinha a Iperó. Ao mesmo tempo em que o casco será desenvolvido, a Marinha começará a levantar naquele terreno, hoje desocupado, um prédio onde será montado o reator nuclear, capaz de gerar energia e transformá-la em eletricidade.

Brasil tem hoje cinco submarinos convencionais

Atualmente, o Brasil conta com cinco submarinos convencionais - quatro fabricados no país e um comprado do governo alemão, num investimento de US$700 milhões.

O submarino nuclear tem velocidade média de 20 nós, contra os 5 nós dos convencionais. Além disso, o projeto que vem sendo desenvolvido na Marinha também prevê uma autonomia de navegação bastante superior aos submarinos convencionais: se preciso, um submarino nuclear navega até um ano inteiro submerso. Já os convencionais precisam emergir para se abastecer de oxigênio. As proporções também são distintas: o submarino nuclear tem cem metros de comprimento: os convencionais, 70. Nos dois casos, no entanto, o armamento não muda: torpedos, mísseis e minas.

O submarino nuclear está sendo feito sob licenciamento ambiental (Ibama) e nuclear (Comissão Nacional de Energia Nuclear).