Título: Marcha a ré no saldo comercial
Autor: Doca, Geralda
Fonte: O Globo, 03/01/2008, Economia, p. 19

Superávit do país cai pela 1ª vez em dez anos, com recorde de importação e exportação.

Omaior crescimento das compras no exterior em 12 anos, propiciado pelo bom desempenho da economia doméstica e pela queda do dólar frente ao real, levou o Brasil a registrar a primeira queda em seu saldo da balança comercial em uma década. Em 2007, o comércio exterior brasileiro apresentou superávit de US$40,039 bilhões, uma redução de 13,8% ante os US$46,456 bilhões obtidos em 2006. Paradoxalmente, a piora no saldo veio acompanhada de recordes históricos, tanto pelo lado das exportações quanto das importações.

Dados da balança comercial divulgados ontem mostram que, em 2007, os embarques atingiram US$160,6 bilhões, superando os US$137,8 bilhões do ano anterior e a meta do governo para 2007 em US$3 bilhões. As compras somaram US$120,6 bilhões, 32% acima da cifra de 2006 (US$91,3 bilhões). Já os embarques internacionais cresceram apenas 16,6%.

Uma das razões da alta das importações, além do vigor do mercado interno e da melhora da renda das famílias, é a desvalorização do dólar, que atingiu 17,15% frente ao real em 2007. Apesar disso, o secretário de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Welber Barral, não vê problemas no comércio exterior do país. Ele destacou que os resultados superaram as projeções do mercado e que há margem para expansão das exportações, cuja meta fixada pelo governo para 2008 é US$172 bilhões.

- Foi um ano excepcional para as exportações brasileiras. A corrente de comércio (soma de exportações e importações) atingiu o maior nível em 200 anos - comemorou o secretário, referindo-se ao bicentenário da abertura dos portos no Brasil.

Fornecedor nacional é substituído

No embalo das altas cotações internacionais, os produtos básicos puxaram as exportações brasileiras em 2007, com alta de 27,6% na comparação com 2006. Os destaques foram milho em grão (317,2%), devido aos embarques destinados a substituir no mundo o milho que os EUA estão usando para produzir etanol. Em seguida, estão carne de frango, fumo em folhas, petróleo em bruto e soja em grãos. Os produtos manufaturados aparecem em segundo lugar, com alta de 11,4%, sobretudo aviões, cujas vendas cresceram 45% em relação ao ano anterior.

Barral citou ainda que as importações refletem números positivos, como o crescimento de 32,4% nas compras de bens de capital (máquinas e equipamentos), um indicativo de que as empresas estão ampliando seus parques produtivos. As compras externas de bens de consumo atingiram alta de 33,2%. Para o vice-presidente da Associação de Comercio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro, isso reflete a substituição de produtos nacionais por estrangeiros.

- A substituição dos produtos nacionais tem aspectos negativos porque estamos deixando de gerar emprego no Brasil. Mas há o lado positivo, com as importações de bens de capital crescendo, o que significa que as empresas estão aproveitando o dólar fraco para investir.

O levantamento do ministério mostrou que, entre janeiro e novembro de 2007, 4.241 empresas trocaram fornecedores domésticos por estrangeiros, o maior processo de substituição já registrado nas operações de comércio exterior. A China aparece como segundo maior fornecedor brasileiro - atrás da União Européia - com alta de 57,3% na sua participação. Não à toa a relação com o país é deficitária (US$1,86 bilhão no ano).

Nas vendas ao exterior, Barral acredita que os gargalos da logística têm mais potencial para prejudicar a competitividade das exportações brasileiras do que o real forte. O vice-presidente da AEB adiciona outro componente: o anúncio, ontem, da elevação do IOF em algumas operações de fechamento de câmbio.

- O aumento do IOF representa um desestímulo às exportações de produtos manufaturados. Havia uma expectativa de redução de custo que foi eliminada - disse Castro.

Em 2008, outra queda prevista

Ele afirmou, no entanto, que a queda no saldo da balança não é preocupante, pois o país tem um nível satisfatório de reservas internacionais. Além disso, o cenário externo continua favorável, sobretudo às exportações de commodities - base da pauta exportadora brasileira - que estão com cotações elevadas.

Segundo análise do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), o cenário econômico mundial talvez não permita que os preços internacionais voltem a crescer em 2008 nos níveis dos últimos anos, o que, aliado à expectativa de nova valorização do real, tende a favorecer o aumento das importações este ano.

"Para se ter uma idéia do que representaria para o comércio exterior brasileiro em 2008 a reprodução neste ano das taxas de crescimento de importação e exportação do último trimestre do ano passado, as vendas externas alcançariam US$189 bilhões e as compras do exterior, US$168,5 bilhões, com o saldo despencando para US$20,5 bilhões", diz o documento.

Para Patrick Carvalho, gerente da Assessoria de Pesquisas Econômicas da Firjan, o saldo comercial menor em 2007 não é preocupante, mas só um reflexo positivo do câmbio e do aumento da demanda interna:

- Cerca de 70% das importações são de bens de capital, matérias-primas e bens intermediários. Ou seja: são itens que representam investimentos e retornam para a própria indústria. Para exportar, é preciso importar - disse Carvalho, para quem a soma de importações e exportações em 2007 mostra a maior abertura econômica do país.

Segundo ele, até 2010, o saldo da balança comercial se manterá positivo, mas em queda contínua:

- No ano que vem, o Brasil receberá a nota de grau de investimento, o que trará ao país mais investimentos, mais dólares. E isso fará com que o real se valorize.

COLABOROU Fabiana Ribeiro