Título: Cresce suspeita de que refém não está com as Farc
Autor:
Fonte: O Globo, 03/01/2008, O Mundo, p. 27

Homem que entregou criança apontada como Emmanuel em orfanato de Bogotá diz que "menino é da guerrilha"

BOGOTÁ.O homem que em 2005 entregou ao órgão oficial de proteção de menores o menino que o governo colombiano acredita ser Emmanuel, filho da refém das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) Clara Rojas, disse ontem que a criança "é das Farc". A afirmação fortalece a suspeita levantada pelo presidente colombiano, Alvaro Uribe, de que o Emmanuel, um dos três reféns prometidos pela guerrilha, não está mais na selva. Diante do fracasso da operação de resgate que mobilizou o governo venezuelano e delegados internacionais, o governo colombiano disse ontem que "as Farc enganaram Chávez e o mundo".

Resultado dos exames será divulgado até amanhã

José Crisanto Gómez, que se apresentou inicialmente como tio-avô do menino Juan David Gómez Tapiero e o entregou ao Instituto Colombiano de Bem-Estar Familiar, admitiu, segundo a rádio Caracol, que não é parente do menor. Segundo a rádio, que cita fontes da promotoria pública, Gómez é um operário de obras e só falou em troca de proteção de Estado para ele e sua família, que estão desaparecidos há oito dias.

Segundo o jornal colombiano "El Tiempo", uma funcionária do orfanato disse que o menino chegou ao orfanato com aproximadamente 9 meses de idade "triste e perdido e sofria de evidente falta de amor". Ele também teria chegado com diarréia e sinais de leishmaniose.

Amostras de DNA foram recolhidas de parentes de Clara Rojas ontem para determinar se o menino é seu filho e os resultados devem ser divulgados até sexta-feira. Um site ligado à guerrilha divulgou um comunicado afirmando que o governo colombiano, com a ajuda dos Estados Unidos, articula-se para fraudar o exame genético.

- Eles (Farc) estão desesperados, pois sabem que não podem entregar quem já não está com eles. Por isso, tentam criar histórias absurdas - disse o alto comissário colombiano para a Paz, Luis Carlos Restrepo, dizendo ainda que "as Farc enganaram o presidente venezuelano, Hugo Chávez, e o mundo" ao descumprirem sua promessa de entregar três reféns. - Neste caso, acreditamos que as Farc mentiram para o presidente Chávez, e ele de boa fé montou toda esta operação, e claro que todos acreditávamos que seria bem-sucedida.

Segundo analistas, é pouco provável que isso possa alterar a situação dos reféns nas mãos das Farc.

Se ficar provado que a guerrilha mentiu, analistas acreditam que é pouco provável que o grupo faça qualquer concessão e deve continuar com suas exigências de que centenas de rebeldes presos sejam libertados em troca de seus reféns. Já se as Farc ainda tiverem Emmanuel em seu poder, ganha força a acusação de Chávez de que o Exército colombiano impediu a operação.

Emmanuel, que teria hoje cerca de 3 anos, teria nascido de uma relação de Clara Rojas com um guerrilheiro.

Além de duvidar que Emmanuel esteja com as Farc, o governo colombiano questionou ontem o canal de comunicação entre a guerrilha e o ex-ministro venezuelano do Interior Ramón Rodríguez Chacín, coordenador-geral da operação para receber os reféns.

- Houve ali um erro de boa fé, talvez porque as Farc deram total confiança ao senhor Rodríguez Chacín de que iriam entregar esta informação, mas isso não foi cumprido. Por isso seria bom saber com quem se comunica o senhor Rodríguez Chacín, porque se o faz com um comando médio das Farc, com alguém que mente, as chances de erro são enormes - disse Restrepo.

Família de Ingrid quer pressionar por sua libertação

Chávez foi afastado por Uribe em novembro de seu papel de mediador no diálogo do governo colombiano com a guerrilha. Em resposta, as Farc prometeram entregar os três reféns ao presidente venezuelano como ato de desagravo. O fracasso da missão foi anunciado por Chávez em uma carta das Farc lida por ele acusando Bogotá de promover ações militares para frustrar a operação. O presidente disse ainda que não confiava no governo colombiano.

Em meio ao fracasso do resgate dos três reféns, a família da ex-senadora e refém das Farc Ingrid Betancourt, seqüestrada em 2002, anunciou ontem que publicará em livro a carta da mãe entregue como prova de que está viva e a resposta dos filhos a ela. A publicação, segundo familiares, servirá para pressionar pela libertação de Ingrid. O prefácio foi escrito pelo Prêmio Nobel da Paz Elie Wiesel.