Título: Para analistas, recessão na economia americana é iminente ou já começou
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Fonte: O Globo, 07/01/2008, Economia, p. 14

Com piora no mercado de trabalho, EUA devem reduzir juro em 0,5 ponto este mês.

NOVA YORK e NOVA ORLEANS. O ano de 2008 começou com o temor, cada vez maior, de uma recessão nos Estados Unidos. O decepcionante resultado do mercado de trabalho americano em dezembro - na sexta-feira, o governo anunciou que foram criadas apenas 18 mil vagas no mês passado, o pior resultado em quatro anos - aumentou o pessimismo dos analistas em relação ao desempenho da economia dos EUA, e do mundo, este ano. Muitos avaliam que a recessão já começou ou é iminente. E cresce a aposta de que o Federal Reserve (Fed, banco central dos EUA) vá reduzir em meio ponto percentual sua taxa básica de juros, hoje em 4,25% ao ano.

Desde agosto, quando teve início a crise nas hipotecas de alto risco dos EUA, que derrubou bolsas do mundo inteiro, o Fed já fez três cortes em suas taxas de juros. Mas, nas três ocasiões, as reduções foram mais modestas, de 0,25 ponto percentual. A próxima reunião do Fed que decidirá sobre taxa de juros será nos dias 29 e 30 deste mês.

Probabilidade "superior a 50%" de uma recessão

O economista Martin Feldstein, presidente do National Bureau of Economic Research (NBER), centro de pesquisa que é a referência nos EUA em análises sobre ciclos econômicos, afirmou ontem que as chances de uma recessão são maiores do que 50%.

- Antes, a probabilidade de uma recessão era meio a meio. Agora (depois do anúncio sobre o mercado de trabalho), é superior a 50% - afirmou Martin Feldstein, em entrevista à agência de notícias Bloomberg, após participar de uma palestra em Nova Orleans.

Na avaliação de economistas, a abertura de poucos postos trabalho em dezembro é o mais forte indicador de que os EUA estão prestes a entrar numa recessão. A taxa de desemprego no país está em 5%.

- A economia está à beira de uma recessão, se já não estiver se afundando nesse processo - avaliou Mark Zandi, economista-chefe da Moody"s Economy.com.

Com alta do petróleo, inflação também preocupa

O medo de uma recessão nos EUA e a forte alta nas cotações do petróleo nos últimos dias devem levar volatilidade às bolsas de valores do mundo inteiro esta semana. A desaceleração da economia americana também deverá nortear os debates políticos nos EUA, na medida em que se acirra a corrida eleitoral para a presidência - as eleições para a Casa Branca serão em novembro.

Os analistas explicam que o Fed está diante de uma difícil decisão. Se por um lado a economia americana está perdendo fôlego (o que exigiria novos cortes de juros), por outro a inflação está em alta, pressionada pela disparada na cotação do petróleo, que chegou a superar US$100 por barril durante o pregão na semana passada. Num cenário de preços em alta, fica mais difícil cortar os juros, pois há risco de descontrole da inflação.

Além disso, juros mais baixos poderão levar a uma desvalorização adicional do dólar. A moeda americana vem perdendo valor sistematicamente frente ao euro e a outras divisas. E isso também pressiona a inflação nos Estados Unidos.

- O Fed terá que manejar uma faca de dois gumes (a taxa de juros) - disse Ryan Larson, da gestora de recursos Voyager. - Precisará segurar a inflação e, ao mesmo tempo, evitar uma desaceleração da economia.

Uma recessão americana teria efeito em todo o mundo já que os Estados Unidos são, de longe, a maior economia do planeta. Os analistas estimam que, no quarto trimestre de 2007, os EUA tenham crescido apenas 1%, depois de uma expansão de 4,9% nos três meses anteriores. O mercado de trabalho era o único indicador da economia americana que ainda mostrava aquecimento.

- Se não há criação de empregos, há recessão - afirmou James W. Paulsen, chefe de investimentos da Wells Capital Management.

Crise imobiliária já havia reduzido consumo nos EUA

Os economistas explicam que já havia uma tendência de redução dos gastos dos consumidores por causa da crise imobiliária. Muitos americanos costumam refinanciar as hipotecas de suas casas para obter crédito e ir às compras. Desde agosto, quando esse setor entrou em crise, o fôlego por consumo diminuiu. Agora, com a piora do mercado de trabalho, os consumidores americanos poderão reduzir ainda mais seus gastos por medo de perder o emprego.

- Com quase nenhum crescimento no emprego, os consumidores ficarão mais preocupados com o futuro. Ficarão mais relutantes em gastar, e isso vai pôr um freio no crescimento em 2008 - avaliou o presidente do NBER Martin Feldstein, que também é professor da Universidade de Harvard.