Título: Alerta ao mundo contra febre amarela
Autor: Éboli, Evandro; Brígido, Carolina
Fonte: O Globo, 09/01/2008, O País, p. 3

RISCO À SAÚDE

Governo decide recomendar a estrangeiros que se vacinem antes de viajar para o Brasil

Após a confirmação ontem da segunda morte por febre amarela em menos de uma semana, desta vez de um morador do Distrito Federal que estivera em Pirenópolis (GO), no réveillon, o governo decidiu fazer um alerta internacional, para que os turistas estrangeiros tomem a vacina contra a doença antes de vir ao Brasil. Os ministérios do Turismo e das Relações Exteriores farão o alerta. O Itamaraty vai avisar embaixadas e representações de organismos internacionais sobre o quadro da doença e pedir que os diplomatas e funcionários se vacinem.

O Ministério do Turismo vai enviar comunicados às agências que operam no país e aos escritórios brasileiros de turismo para orientar brasileiros e estrangeiros a se vacinar dez dias antes de viagens a locais de risco. Além disso, serão distribuídos folhetos de esclarecimento aos turistas estrangeiros e brasileiros, em aeroportos, estações rodoviárias e outros locais de acesso de turistas.

Ontem, morreu em Brasília o técnico em informática Graco Carvalho Abubakir, de 38 anos. É o primeiro óbito por febre amarela no Distrito Federal. Antes, morrera em Goiás o trabalhador rural João Batista Gonçalves, também vítima da doença. Abubakir estava internado há quatro dias. Ele esteve em Pirenópolis, cidade turística goiana entre 29 de dezembro e 1º de janeiro.

O ministro da Saúde, José Gomes Temporão, enviou ontem ofício aos dois ministérios com informações sobre o atual quadro epidemiológico da febre amarela no país e pedindo "providências cabíveis" para auxiliar nessas ações de prevenção. Preocupado com o impacto no turismo da notícia sobre o risco da doença, o Ministério do Turismo divulgou nota no início da noite ontem dizendo que tomaria as medidas necessárias, mas destacou que "a maior parte do litoral brasileiro (destino preferencial dos turistas durante o verão) está praticamente livre da febre amarela".

No Rio, último registro foi em 2001

No Rio, a corrida aos postos de saúde levou a Secretaria Municipal de Saúde a divulgar ontem comunicado para tranqüilizar a população. Com o título "Rio não tem surto de febre amarela", a nota informa que o último caso registrado na cidade foi em 2001, tendo sido contraído fora do Rio. A vacinação, feita em 24 postos municipais de saúde, é indicada para quem for viajar para áreas consideradas de risco, como as regiões Norte e Centro-Oeste. O movimento ontem nos postos vacina foi anormal. Num deles, no Centro, mais de 200 pessoas quiseram ser vacinadas, alegando que viajariam para áreas de risco. A dose não foi negada, mas os técnicos desconfiaram que a justificativa era apenas desculpa para garantir o atendimento. A relação de postos pode ser encontrada na internet, no endereço: www.saude.rio.rj.gov.br/vacinação.

Temporão pediu à ministra do Turismo, Marta Suplicy, que a Associação Brasileira de Agentes de Viagem (Abav) participe da mobilização, ajude na divulgação da situação da febre amarela e recomende a quem for viajar aos locais de endemia que tome antes a vacina. O secretário de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde, Gerson Penna, explicou que a recomendação é que os estrangeiros que seguirem para áreas de risco sejam vacinados. Ele afirmou que nem toda pessoa que estiver viajando para o Brasil precisa ser imunizada.

O governo de Goiás, onde já morreu uma pessoa e várias outras estão internadas com suspeita da doença, recomendou que todo turista que seguir para a cidade turística de Caldas Novas, balneário conhecido por suas piscinas com águas quentes, vacine-se antes. O número de municípios em estado de alerta em Goiás passou de 44 para 50.

Segundo a Secretaria de Saúde do Distrito Federal, Abubakir não era vacinado contra a febre amarela. Ele esteve nas cachoeiras da região de Pirenópolis, local onde pode ter sido contaminado, começou a sentir-se mal no dia 2 e procurou o Hospital Santa Luzia, em Brasília, no dia 4. Quando chegou, estava consciente e conversando, mas na noite do mesmo dia foi entubado, sedado e levado à UTI.

Desde então, a piora foi crescente. Um boletim médico divulgado de manhã, horas antes da morte, atestava que Abubakir respirava com a ajuda de aparelhos e era submetido a hemodiálise. Ele sofria de insuficiência hepática, respiratória e renal agudas. Além disso, o sangue do paciente tornou-se incapaz de coagular. Às 13h45m, ele morreu por falência de múltiplos órgãos. O infectologista Henrique Marconi disse que a causa da morte será confirmada com o resultado de exames de sangue e da necropsia, que está sendo conduzida pelo Hospital Universitário de Brasília.

Abubakir trabalhava em uma empresa de informática que prestava serviços ao Ministério do Turismo. Um amigo dele, o advogado Arthur Mário Gayoso, que também estava no local, contou que Abubakir estava noivo.

- Foi um susto muito grande receber a notícia da morte. Pelo que foi me dito pelos médicos, fiquei na esperança de que, se ele passasse de hoje, poderia se recuperar, porque hoje seria o dia mais crítico da doença. Acho que todo mundo deveria se vacinar. A gente pensa que nunca vai acontecer com a gente e dá nisso.

O alerta internacional de Temporão provocou reações internas no governo. O Ministério da Saúde alterou o texto de divulgação sobre o pedido aos dois ministérios. A primeira versão afirmava que o ministro Temporão "mobilizou" os ministros Celso Amorim e Marta Suplicy com o pedido para que "cada um empenhe esforços contra a doença em suas respectivas áreas". A segunda versão, alterada, diz que Temporão "solicitou" aos dois ministros que turistas, trabalhadores em viagem e os representantes diplomáticos sejam alertados sobre a situação da doença no país e como obter a vacina contra a doença. A expressão "cada um empenhe esforços contra a doença em suas respectivas áreas" desapareceu.