Título: Um mercado de R$1 bilhão
Autor: Franco, Bernardo Mello; Menezes, Maiá
Fonte: O Globo, 13/01/2008, O País, p. 3

À ESPERA DO CONCURSO PÚBLICO

Decisão do governo de suspender provas leva apreensão a professores e "concurseiros".

Uma indústria que movimenta R$1 bilhão por ano e atrai 1,6 milhão de inscrições acompanha, apreensiva, a decisão do governo federal de suspender concursos públicos. O mercado inclui editoras, cerca de mil cursos pelo país e uma TV especializada. E manteve, até aqui, o padrão de crescimento iniciado em 2005: 40% ao ano, segundo a Associação Nacional de Proteção e Apoio aos Concursos (Anpac). O anúncio do governo ainda não se refletiu no volume de matrículas deste ano, de acordo com empresários do setor. Mas, entre alunos e professores, há incerteza.

- Os alunos ficaram abatidos. Mas sabemos que, no governo, são idas e vindas. O presidente tomou essa decisão porque sofreu uma derrota. Foi uma retaliação. Essa não é a última palavra - afirma Arenildo dos Santos, diretor do curso Plá Concursos.

- Em um primeiro momento, isso gera um desânimo no concursando. Mas alguns setores são tão vitais e o governo não vai conseguir deixar de fazer concurso - afirma o presidente da Anpac, Carlos Eduardo Guerra.

O interesse nos concursos é crescente, avaliam os empresários do ramo, que o comparam a uma progressão geométrica: quem passa influencia amigos a tentar trilhar o mesmo caminho. Os benefícios são claros. O concurso não exige experiência anterior, permite que pessoas de 18 a 65 anos façam as provas em condição de igualdade e oferece salários bem acima da média do setor privado.

- Há uma busca crescente pela estabilidade e o governo Lula iniciou um processo de resgate da remuneração do servidor. Além disso, o serviço público não tem o mesmo grau de exigência que o setor privado no dia-a-dia do trabalho - avalia o professor Fábio Gonçalves, sócio da Academia do Concurso, no Rio, com 40 mil alunos, a maioria assistindo por uma emissora de TV, em 61 municípios, as lições dadas pelos professores.

Inscrições podem chegar a R$150

Em Brasília, que concentra o maior volume dos cargos da União, os empresários do setor são unânimes: o mercado nunca foi tão promissor.

- É um mercado em franca ascensão. Já chegamos a rejeitar alguns clientes por falta de tempo para elaborar as provas - conta o diretor do Centro de Seleção e de Promoção de Eventos (Cespe), Mauro Rabelo.

Ligado à Universidade de Brasília (UnB), o Cespe recruta servidores para as três esferas de governo. As taxas de inscrição têm valor médio de R$60, mas podem chegar a R$150 em concursos para a magistratura.

O pacote anunciado pelo ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, congelou 28.853 vagas no Executivo federal com abertura prevista no Orçamento da União para 2008. Até agora, o governo só autorizou o lançamento de edital para 11.179 das 40.032 vagas planejadas. O resto só será definido após a rediscussão do Orçamento, em fevereiro, e o ministério se recusa a liberar outras informações.

O Obcursos, curso líder do mercado no Distrito Federal, espera matricular 20 mil alunos até março, o que significaria um aumento de 40% em relação ao início do ano passado. O estabelecimento tem 680 professores e ocupa uma suntuosa sede projetada pelo arquiteto Oscar Niemeyer, com 24 mil metros quadrados.

Na sexta-feira, o dono do Obcursos distribuiu um artigo para estimular os alunos a continuarem os estudos, mesmo sem a garantia de criação dos novos cargos. A iniciativa é criticada pelo presidente do Sindicato dos Professores em Estabelecimento Particulares de Ensino do Distrito Federal, Rodrigo Pereira de Paula.

- Os cursinhos oferecem aulas para órgãos que não têm sequer previsão de abertura de vagas. Os alunos pagam mensalidades e estudam sem saber se o edital será publicado - critica.