Título: Mesmo milionário, falta ao mercado de cursinhos fiscalização do MEC
Autor: Franco, Bernardo Mello; Menezes, Maiá
Fonte: O Globo, 13/01/2008, O País, p. 4

À ESPERA DO CONCURSO PÚBLICO: Cursos do ramo carecem de regulamentação.

Empresários dizem que estabelecimentos surgem e somem em poucos meses.

BRASÍLIA e RIO. O mercado milionário de preparação para concursos públicos prospera sem qualquer mecanismo oficial de controle de qualidade. Apesar do crescimento vertiginoso do setor, o Ministério da Educação informou que não existe um sistema de avaliação dos cursinhos ou do material didático fornecido aos candidatos. As aulas são enquadradas na categoria de cursos livres, que também inclui as turmas de pré-vestibular e ensino de idiomas. Por isso, os estabelecimentos não precisam se submeter a fiscalização do MEC, nem seguir as regras da Lei de Diretrizes e Bases ou da legislação sobre os reajustes da anuidade escolar.

Empresários discordam sobre regulamentação

Empresários divergem sobre a necessidade de regulamentação específica para o setor. Dono da maior editora brasileira especializada em concursos públicos, a Vestcon, o professor Ernani Pimentel diz que as leis de mercado são suficientes para garantir a qualidade dos livros.

- A avaliação mais séria é feita pelo candidato. Se ele perceber que alguma questão da prova não estava na apostila, vai abrir processo na mesma hora contra a editora - afirma.

O presidente da Anpac, Carlos Eduardo Guerra, afirma que o mercado se auto-regula, porque os alunos escolhem os cursos confiáveis. Mas argumenta que a entidade defende uma exigência mínima para o setor: que todos os cursinhos tenham, no mínimo, CNPJ e alvará.

- Alguns cursos abrem na esquina e fecham. Em muitos casos, alunos não assinam contrato algum - afirma Guerra.

- Ainda é um mercado livre - afirma Fábio Gonçalves, sócio da Academia do Concurso e vice-presidente da Anpac.

O proprietário do Obcursos, em Brasília, diz que a regulamentação seria bem-vinda. Segundo José Wilson Granjeiro, o mercado soma exemplos de estabelecimentos que surgem e desaparecem em poucos meses, deixando os candidatos na mão:

- O mercado está cheio de aproveitadores. Muitos cursinhos surgem da noite para o dia, sem preocupações com carga horária e qualidade de ensino.

Segundo o Ministério Público, a informalidade predomina na contratação de professores para as escolas especializadas. Em Brasília, a Procuradoria Regional do Trabalho promove há seis meses uma devassa para enquadrar os maiores cursinhos. Segundo o promotor Adélio Justino Lucas, quase todos violam a lei ao contratar professores sem carteira assinada. Só no Distrito Federal, mais de duas mil pessoas trabalhariam sem garantia trabalhista.

- Os cursos são montados de um dia para o outro. Os empresários matriculam os alunos, recrutam um número enorme de professores e não pagam direitos trabalhistas - resume.

As investigações já levaram à assinatura de três termos de ajustamento de conduta, e os estabelecimentos que descumprirem as regras estão sujeitos a multas de até R$1 mil por professor. O dono do Obcursos afirma que as vagas do setor são abertas conforme a divulgação de editais, o que tornaria inviável a contratação de mais profissionais no regime da CLT:

- Muitos dos nossos professores são juízes, promotores, auditores ou fiscais, que não podem ter outro vínculo trabalhista. Eles é que definem em que horário podem dar aulas.

A contratação à margem da lei garante uma remuneração generosa aos professores dos cursinhos. Em Brasília, a indústria dos concursos paga em média R$70 por hora de aula, quase o triplo dos R$24 oferecidos pelas faculdades privadas. No Rio, chega a R$12 mil por mês.