Título: Mercado: governo pode viver sem CPMF
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Fonte: O Globo, 19/01/2008, Economia, p. 24

Receita recorde, porém, não dispensa redução de gasto, dizem especialistas.

BRASÍLIA. O resultado recorde da arrecadação em 2007 - R$602,15 bilhões, R$61,375 bilhões acima do ano anterior - reforçou a convicção de analistas do mercado financeiro, da academia, do setor produtivo e de segmentos do Congresso Nacional de que o governo pode sobreviver sem a CPMF. Mas, dizem, é fundamental melhorar a política fiscal, por meio de redução dos gastos públicos e aumento da qualidade dos desembolsos.

- Foi a melhor coisa que o Congresso fez. O governo não precisa de CPMF - diz Reinaldo Gonçalves, professor da UFRJ.

Mesmo concordando que é possível administrar o caixa sem os R$40 bilhões da CPMF, os agentes têm visões distintas sobre a necessidade de a União ter elevado o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) e a Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL). Gonçalves acha que a medida foi desnecessária e, ao encarecer o crédito e ter efeito contracionista, reduzirá receitas. No Brasil, os impostos incidem principalmente sobre a renda. Se ela continuasse crescendo, a arrecadação estaria garantida sem novos tributos.

Já o mercado financeiro acredita que o governo não tinha como fugir de um aumento de tributos, porque o país tem uma política fiscal de péssima qualidade, com despesas e receitas engessadas, e a CPMF é uma receita "firme", pouco dada a variações sazonais.

Segundo Denis Blum, economista da Tendências, a arrecadação previdenciária, que entra na conta dos R$602 bilhões, tem destinação específica, por exemplo. O Imposto de Renda e o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) são partilhados com estados e municípios.

- Para se manter comprometido com as metas fiscais, o governo tinha que ter substituído a CPMF com o IOF e a CSLL. Ninguém tem segurança de que o corte de R$20 bilhões que o governo promete fazer no orçamento vai se concretizar - pondera o economista-chefe do West LB, Roberto Padovani.

Recriação da contribuição não tem respaldo

Mas, com controle mais eficiente das despesas, ninguém defende a recriação da CPMF:

- Aumentar as alíquotas do IOF e da CSLL até se explica, porque acho difícil o crescimento da economia puxar a arrecadação com a mesma força que em 2007. Mas recriar a CPMF já é exagero. Basta implementar um programa de corte de gastos para equacionar as contas - afirma Caio Megale, sócio da Mauá Investimentos.

A Federação das Indústrias do Estados de São Paulo (Fiesp) também antecipava que a arrecadação seria suficiente para que o governo honrasse seus compromissos.

Os números da arrecadação de 2007 fizeram até mesmo o presidente da Frente Parlamentar da Saúde, Darcísio Perondi (PMDB-RS), mudar de tom. Ele disse ontem que o balanço da Receita torna desnecessária a recriação da CPMF, para a qual também não há clima político. Ele defendeu, porém, a regulamentação da Emenda 29, para aumentar os R$47,8 bilhões disponíveis para a Saúde em 2008 e a evitar uma crise no setor. Ele pondera que isso é possível porque, diante do quadro, a estimativa de receitas federais este ano subirá novamente.