Título: Aumenta o risco de uma estagflação nos EUA
Autor: Rodrigues, Lino; Frisch, Felipe
Fonte: O Globo, 23/01/2008, Economia, p. 22

AMEAÇA GLOBAL: Corte de juros também incentivaria saída de capitais. Mercado reagiu bem porque foi pego de surpresa.

Estagnação com alta de preços pode travar economia americana. Inflação em 2007 foi a maior em 17 anos.

Ao surpreender o mercado e cortar os juros em 0,75 ponto percentual, o Federal Reserve (Fed, banco central americano) pode ter afastado o risco de uma recessão mais profunda nos EUA. Mas trouxe novas nuvens para o horizonte da economia americana. Os problemas à frente, dizem os analistas, são a ameaça de uma alta maior na inflação - aumentou o risco de uma estagflação, ou seja, estagnação econômica com alta de preços - e o perigo de saídas adicionais de capitais dos Estados Unidos, provocando uma depreciação ainda maior do dólar.

O economista Marcel Pereira, da RC Consultores, teme até um ataque especulativo contra a moeda americana. Com juros mais baixos, os investidores terão rentabilidade ainda menor e, frente às incertezas sobre qual é o tamanho real da crise, poderá haver uma fuga de capitais.

- É algo raríssimo na história americana e, na última vez que ocorreu, após o segundo choque de petróleo em 1979, forçou o Fed a uma forte alta dos juros, o que desencadeou a crise da dívida na América Latina - diz Pereira. - As perdas nos bancos foram muito grandes e o mercado está cético. O risco de ataque especulativo não pode ser descartado.

Fator surpresa ajudou na boa recepção do mercado

Para Pereira, já há sinais de que os EUA estão em estagflação. Os preços ao consumidor subiram 4,1% em 2007, a maior alta em 17 anos. E a inflação ao atacado foi de 6,8%, a maior desde 1981. O economista Caio Prates, da UFRJ, não é tão pessimista. Ele lembra que o núcleo da inflação ao consumidor - que exclui alimentos e energia - ficou em 2,4% em 2007, taxa que não destoa do padrão.

De qualquer maneira, o Fed terá dias difíceis pela frente, prevê Pereira, da RC Consultores. Ontem, acredita o economista, o mercado só reagiu bem porque foi pego de surpresa. Alexandre Horstmann, diretor de gestão da Meta Asset Management, faz avaliação semelhante. Para Horstmann, na semana passada, o mercado reagiu mal ao anúncio do pacote fiscal do presidente George W. Bush porque ele já era esperado desde o início do mês.

- No corte de juros de hoje (ontem), houve o fator surpresa. As pessoas falavam que poderia haver o corte, mas achavam que o Fed ia esperar para fazer isso na reunião (do comitê de política monetária, que será nos dias 30 e 31).

Além de o Fed ter se antecipado à expectativa dos analistas, surpreendeu o tamanho do corte, de 0,75 ponto percentual, o que ajudou na boa recepção do mercado.