Título: Chacina de Unaí: impunidade 4 anos depois
Autor: Éboli, Evandro
Fonte: O Globo, 28/01/2008, O País, p. 4

Valendo-se de recursos judiciais, nenhum dos nove acusados pelo assassinato de quatro fiscais do trabalho foi a julgamento

BRASÍLIA. O caso que ficou conhecido como "chacina de Unaí (MG)" completa hoje quatro anos e, até o momento, nenhum dos nove acusados foi julgado pelo assassinato de três auditores fiscais do Ministério do Trabalho e do motorista que os conduzia. Os quatro foram vítimas de uma emboscada e morreram assassinados com vários tiros quando estavam dentro do carro. Eles fiscalizavam fazendas da região.

Na chacina, morreram os fiscais Eratóstenes de Almeida Gonçalves, João Batista Soares Lage e Nelson José da Silva, e o motorista Ailton Pereira de Oliveira.

Uma série de recursos na Justiça faz com que o caso se arraste. Em julho de 2004, cinco meses depois da chacina, a Polícia Federal e o Ministério Público apresentaram os resultados da investigação e apontaram os nove envolvidos, entre mandantes, intermediários e executores. Em dezembro daquele ano, o juiz Francisco de Assis Betti, da 9ª Vara da Justiça Federal de Belo Horizonte, autorizou o julgamento dos réus, o que não ocorreu até hoje.

Os réus recorreram seguidamente ao Tribunal Regional Federal (TRF) de Brasília, em 2005, que ainda analisa os pedidos. A partir daí, a defesa tem trabalhado para adiar o julgamento.

Entidades ligadas aos auditores fiscais, da Comissão Pastoral da Terra (CPT), servidores do Ministério do Trabalho e parentes das vítimas realizam hoje um ato, em Brasília, em frente ao Tribunal Regional Federal, onde o caso está parado. Os manifestantes vão usar roupa preta e levar um bolo da mesma cor, em protesto.

"As famílias das vítimas precisam de respostas"

A secretária de Inspeção do Trabalho, Ruth Vilela, do Ministério do Trabalho, afirmou que as famílias das vítimas precisam de respostas, e disse que, com o assassinato dos fiscais, o ministério sofreu um ataque frontal.

- As famílias das vítimas precisam, sem dúvida, de respostas. Que não aplacarão a dor e o impacto das ausências. Estão esperando há quatro anos. Mas, acima de tudo, o Estado brasileiro precisa de respostas, pois a instituição Ministério do Trabalho foi a que sofreu um ataque frontal. Espero que a morte dos colegas não seja a morte anunciada do estado democrático de direito - disse Ruth Vilela ao GLOBO.

- Vamos cobrar das autoridades que julguem logo os acusados, que continuam impunes. Os advogados entram com recursos para protelar o julgamento - afirmou Rosa Maria, presidente do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho.

O sindicato vai protocolar uma reclamação no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) contra a demora do TRF.

Dos nove acusados, seis estão presos: Hugo Alves Pimenta, empresário e acusado de ser o mandante das acusações; Francisco Elder Pinheiro, apontado como o encarregado de montar toda a estrutura para a chacina; Erinaldo de Vasconcelos Silva, suspeito de ter executado, com sua pistola 380, três das quatro vítimas; Rogério Alan Rocha Rios, acusado de ter participado diretamente das execuções; William Gomes de Miranda, que teria sido contratado para atuar como motorista dos pistoleiros; Humberto Ribeiro dos Santos, apontado como o homem que teria se encarregado de apagar uma das provas do crime.

Prefeito de Unaí, um dos acusados, tem foro especial

Entre os acusados, está Antério Mânica, atual prefeito de Unaí. Ele é filiado ao PSDB. Considerado o maior produtor de feijão do país, era alvo freqüente de fiscalizações, a maioria delas realizadas pelo auditor Nelson José da Silva, uma das vítimas. Ele está em liberdade e tem direito a julgamento em foro especial, por ter sido eleito prefeito em 2004. Norberto Mânica (irmão de Antero) e José Alberto Costa completam a lista.

Ruth Vilela ressaltou que os fiscais atuam na defesa dos cidadãos mais vulneráveis e citou os trabalhadores rurais. Sua secretaria é responsável, entre outras ações, pela fiscalização do uso de mão-de-obra de trabalho escravo no país. Ela cobrou celeridade da Justiça.

- Eventos graves devem gerar medidas imediatas e positivas, que minimizem os impactos negativos na atuação do Estado. Ausente a reação compatível com o evento, permite-se a interpretação de que é mais fácil eliminar a intervenção estatal, quando esta é eficiente, do que cumprir a lei.