Título: 94 países da ONU aceitam aborto de anencéfalos
Autor: Mariz, Renata
Fonte: Correio Braziliense, 28/04/2009, Brasil, p. 11

Segundo autora do levantamento, resistência é maior em nações onde interrupção da gravidez é proibida em qualquer circunstância

A interrupção da gravidez no caso de fetos anencéfalos (sem cérebro) ¿ que será discutida no Supremo Tribunal Federal (STF) ainda no primeiro semestre deste ano, de acordo com a previsão do relator do processo, ministro Marco Aurélio de Mello ¿ é legalizada em 49% dos países-membros da Organização das Nações Unidas (ONU). Das 192 nações com assento na ONU, 94 permitem o aborto no caso de ausência total ou parcial do cérebro, segundo levantamento feito pela professora da Universidade de Brasília (UnB) Debora Diniz.

De acordo com ela, o resultado da pesquisa mostra um conservadorismo maior em relação ao aborto de anencéfalos nos países em que a prática, de uma forma geral e em praticamente qualquer circunstância, é proibida. ¿É a legislação do tudo ou nada¿, define. A prova, segundo a pesquisadora, está em nações que, mesmo com grande influência católica, autorizam o aborto de forma irrestrita, abrangendo também o de anencéfalos. É o caso de Itália, Espanha e Portugal. Na contramão disso, há países como Filipinas, Irlanda e praticamente toda a América Latina, que proíbem a interrupção da gestação em qualquer situação.

¿O Chile criminaliza até em casos de estupro. Estamos numa região do mundo muito proibitiva¿, afirma Debora. No Brasil, o aborto de fetos anencéfalos só é permitido com autorização judicial. Caso contrário, mulher e médico podem ser presos. A polêmica da legalidade do aborto no caso de anencefalia foi levada ao Supremo por meio de uma ação ajuizada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde (CNTS) em 2004 e, desde então, levanta muita polêmica.

Para o advogado Paulo Leão, que atua em questões relacionadas à bioética, a legislação brasileira deve continuar impedindo o aborto no caso de anencefalia se quiser respeitar os princípios constitucionais do direito à vida, da igualdade entre as pessoas e da solidariedade.

¿Hoje, permite-se matar o filho dentro do útero, amanhã serão os velhos. Devemos abrir uma exceção para que, no futuro, o Estado possa dispor da vida das pessoas?¿, argumenta Leão. Para Debora, a Constituição brasileira não criminaliza o aborto. ¿É uma questão de interpretação, a criminalização está expressa no Código Penal, legislação fortemente imbricada na influência religiosa¿, afirma.