Título: Desarmamento: 464 mil armas recolhidas
Autor: Weber, Demétrio; Dutra, Marcelo
Fonte: O Globo, 31/01/2008, O País, p. 8

Campanha, que reduziu homicídios, será relançada por medida provisória, com orçamento de R$40 milhões.

BRASÍLIA e RIO. A campanha do desarmamento, que recolheu 464 mil armas entre 2004 e 2005 e é citada por especialistas como fator decisivo na redução de homicídios no país, será relançada nos próximos dias por medida provisória. O texto já foi aprovado na Casa Civil e só aguarda a assinatura do presidente Lula. O Ministério da Justiça pretende relançar a campanha no primeiro semestre.

A proposta orçamentária para 2008 prevê R$40 milhões para financiar a campanha. O Ministério da Justiça espera escapar dos cortes provocados pelo fim da CPMF. O dinheiro servirá para indenizar os donos das armas. Na primeira campanha, o governo pagou entre R$100 e R$300 por unidade.

O vice-presidente da Comissão de Segurança Pública da Câmara, deputado Raul Jungmann (PPS-PE), elogiou o relançamento. Segundo ele, o Estatuto do Desarmamento e a entrega voluntária de armas foram fundamentais para que o número de homicídios caísse 8% no país, entre 2003 e 2006, como mostrou ontem o Mapa da Violência dos Municípios Brasileiros divulgado pela Rede de Informação Tecnológica Latino-Americana (Ritla). O número de homicídios vinha crescendo desde 1996 e atingiu pico de 51.043 óbitos em 2003. Em 2004, ano de lançamento da campanha, houve 48.374 homicídios e, no ano seguinte, 47.578. Em 2006, foram 46.660.

- A arma de fogo é um vetor da violência e um instrumento do crime organizado - disse Jungmann.

O prazo para recolhimento das armas e os valores da indenização deverão ser definidos por decreto e portaria da Polícia Federal. A exemplo do que fez o Estatuto do Desarmamento por prazo determinado, a nova medida provisória servirá para resolver um problema legal: deixar claro que quem devolver armas ilegais não será incriminado pela posse do armamento.

O deputado Pompeo de Mattos (PDT-RS) diz ser favorável à nova campanha, mas discorda que a entrega de 464 mil armas tenha ajudado a reduzir a taxa de assassinatos:

- O que diminuiu foram os homicídios praticados por bandidos, graças à ação da polícia.

A MP vai estabelecer também o prazo para registro de armas. Inicialmente, a data era 2 de julho, mas a medida que tratava do assunto acabou atropelada pelo esforço do governo em prorrogar a CPMF. Em dezembro, ela foi cassada pelo Supremo Tribunal Federal. O governo retirou da pauta a MP do registro de armas para dar prioridade à prorrogação do tributo. Em seguida, editou outra medida sobre o assunto. Em dezembro, o Supremo considerou que isso era ilegal e cassou a medida provisória, alegando que o governo não pode editar duas MPs iguais na mesma legislatura.

O registro de armas foi previsto no Estatuto do Desarmamento. O objetivo é permitir que a PF saiba quantas armas existem no país, pelo menos legalmente. Antes, o Exército, as polícias civis nos estados e a própria PF tinham bancos de dados distintos, sem comunicação efetiva. De acordo com o chefe da Divisão de Assuntos Sociais e Políticos da PF, delegado Fernando Segóvia, atualmente 4,5 milhões de armas estão registradas no Sistema Nacional de Armas (Sinarm).

Lojas caíram de 2.400 para 280 em todo o país

De acordo com dados da Associação Nacional dos Proprietários e Comerciantes de Armas - entidade com representantes em quase todos os estados do país -, desde a publicação do Estatuto do Desarmamento em 2003, mais de 90% das lojas que comercializavam armas e munições fecharam as portas.

- Tínhamos cerca de 2.400 lojas. Hoje, não existem mais que 280 lojas em todo o Brasil. Foi a falência de um setor do comércio legal decretada pelo governo federal - diz Antonio Alves, presidente da entidade.

O comerciante é dono da loja Lazarina Fiel, que vende armas há 30 anos em Vilar dos Telles, na Baixada Fluminense. Segundo ele, não apenas o número de lojas em atividade despencou como também o número de armas vendidas por este segmento. Segundo Alves, atualmente as lojas vendem cerca de 10% do que vendiam na virada do século.

Para adquirir uma arma, explica Alves, o comprador gasta cerca de R$700 na aquisição de certidões negativas, certidão eleitoral e certidão da Justiça Federal para comprovar que não responde a nenhum processo criminal em algum outro estado da Federação. Além disso, é preciso tirar certidões estaduais nos cartórios criminais. Depois disso, o lojista, de posse das certidões, dá entrada num processo na Polícia Federal. O comprador tem que procurar um psicólogo cadastrado pela Polícia Federal para se submeter a um exame psicológico. O resultado é encaminhado à PF. Se aprovado, o cidadão faz testes num estande de tiro.

www.oglobo.com.br/pais