Título: Sobrevivendo a crises sem perder o bom humor
Autor: Franco, Bernardo Mello
Fonte: O Globo, 03/02/2008, O País, p. 4

Marina enfrenta momento mais difícil.

BRASÍLIA. O anúncio de uma nova alta no desmatamento da Amazônia trouxe de volta aos holofotes um dos últimos rostos que sorriem na foto oficial da primeira equipe empossada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em janeiro de 2003. Em cinco anos, a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, sobreviveu a diversas crises sem perder o bom humor. Enquanto assistia ao rodízio no comando de pastas vizinhas, ela comemorou três quedas consecutivas na devastação da floresta e conseguiu atrair o apoio de ONGs que nunca haviam aplaudido uma única ação do governo no setor. Ao anunciar o novo aumento das queimadas, Marina exibia um semblante fechado, que parecia antecipar o clima das duas semanas seguintes.

O desgaste chegou ao ápice na quarta-feira passada, quando Lula a desautorizou em público e, apesar de não citar seu nome, reclamou de suposto alarmismo sobre a situação da Amazônia e chamou de parceiro o governador de Mato Grosso, Blairo Maggi (PR), um dos maiores plantadores de soja do país. A repreensão presidencial serviu como recado para a ministra baixar o tom, depois de bater boca com o colega da Agricultura, Reinhold Stephanes, sobre as causas das derrubadas.

Nos dias anteriores, Marina já havia sido exposta a uma polêmica quando se divulgou sua participação num seminário sobre o criacionismo, doutrina religiosa que ignora a evolução das espécies. Num vídeo que correu a internet, a ministra, fiel da Assembléia de Deus, prega o uso do ensino ambiental como "estratégia de aproximação das pessoas e dos jovens do trabalho da igreja".

- Nos mínimos detalhes, a Bíblia se preocupa com a preservação do meio ambiente e dos bens naturais que Deus nos deu - diz ela, em entrevista a um blog de jovens adventistas.

Resistir à pressão de grandes proprietários e setores insatisfeitos no governo e aplicar as medidas contra o desmatamento com rigor é a nova missão da ministra, que já enfrentou desafios maiores. Ex-seringueira, Marina passou fome no interior do Acre, viu três irmãos morrerem na infância e foi analfabeta até os 16 anos. Sobreviveu com saúde frágil e chegou ao Senado pelo PT em 1994. Agora depende dos próximos índices de desmatamento do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) para permanecer no cargo até o fim do governo. (Bernardo Mello Franco)