Título: Sinuca financiada com cartão
Autor: Paul, Gustavo; Lima, Maria
Fonte: O Globo, 06/02/2008, O País, p. 3

E mais material de construção, sapatos, revelação de filmes, enxoval, lavanderia...

É o caso de um pagamento de R$1.400 em favor da DF Sinucas, loja especializada em material de lazer, como mesas de sinuca, tênis de mesa e totó feito pelo Ministério das Comunicações, em 4 de maio de 2007. Esse gasto foi feito pelo servidor Francisco R.M. Silva, lotado na Coordenação Geral de Recursos Logísticos. O Banco Central também teve uma despesa de R$499 em 7 de novembro passado paga à Petistelli Comércio de Calçados, razão social das lojas de calçados e bolsas Datelli. O responsável pelo gasto chama-se Simião B. Pinheiro, que ordenou R$67.745 em despesas com cartões.

Segundo a assessoria do BC, o uso de cartões corporativos é restrito a despesas de pequena monta realizadas pelo Departamento de Recursos Materiais e Patrimônio (Demap) e voltadas exclusivamente para a manutenção predial das instalações do BC.

"O BC apurará se a despesa apontada pelo jornal foi efetuada de acordo com as regras e limitações definidas pela instituição", afirmou a assessoria por meio de nota.

O escândalo dos cartões já derrubou a ministra da Igualdade Racial, Matilde Ribeiro, e agora aponta para o Planalto. Está em articulação uma CPI para investigar, entre outras possibilidades de abuso, o gasto de R$55 mil por um segurança da filha do presidente Lula, Lurian Cordeiro da Silva.

ANP resolve "emergência" numa loja de louças

A Agência Nacional do Petróleo (ANP) gastou em 5 de julho do ano passado R$330,48 na loja Principado das Astúrias Louças, especializada em produtos de copa e cozinha. O decreto 5.355 de 2005 deixa claro que os pagamentos devem se limitar a situações "emergenciais", compra de "materiais e contratações de serviços de pronto pagamento e de entrega imediata", pagamento a agências de viagens previamente licitadas e de diárias de viagem de servidor.

Foi em razão dessas excepcionalidades que a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) pagou em 24 de setembro R$11.354,03 para custear uma passagem aérea para a diretora Joisa Campanher Dutra Saraiva viajar aos Estados Unidos. Segundo a Aneel, como o preço da agência de viagens era superior ao orçado pela TAM, a agência comprou o bilhete da companhia aérea e ganhou crédito em passagens, pois o preço de balcão estava superior ao pago no cartão.

Outros órgãos chamam atenção pelo expressivo volume de gastos no cartão. O Instituto Nacional do Câncer (Inca), com sede no Rio de Janeiro, foi a unidade vinculada ao Ministério da Saúde que mais gastou com cartões em 2007: R$447.613,61. O valor é 574% maior que o segundo colocado: o Núcleo Estadual do Ministério da Saúde no Rio, que emitiu R$66.383 em notas. Apenas um funcionário do Inca, Emanuel Assunção, emitiu R$71.461 em faturas em 2007, sendo que pelo menos três foram para a Principado das Astúrias Louças, que somaram R$1.099,87.

O escritório da Funai em Governador Valadares (MG) gastou com o cartão corporativo R$70.020 em 2007, quase tudo em saque de dinheiro vivo por motoristas, auxiliares de ensino e assistentes administrativos. A servidora Oswaldina Salomão Ferraz Rocha foi uma das portadoras de um dos cartões e fez vários saques em dinheiro, num total de R$6.400 em 2007. Fora isso, há um gasto de R$284 em passagens de ônibus. Nervosas, uma sobrinha e uma cunhada de Oswaldina disseram que ela estava viajando e que a posição dela na Funai não lhe permitia mexer com esse tipo de cartão do governo. Outra colega dela na Funai, a auxiliar de ensino Eliete Oliveira Xavier, gastou R$17.020,80, sendo R$15.746 mil em saque direto no caixa.

- Usei o dinheiro para prestar auxílio financeiro aos indígenas em um curso. Eles assinaram um recibo para comprovar - disse Eliete.

No mesmo posto da Funai, os motoristas Maurilton Pereira Vaz e Sebastião Rodrigues receberam cartões corporativos. Cada um gastou, em 2007, R$10,7 mil. Sebastião gastou em saques, papelarias e postos de gasolina. Já Maurilton usou seu cartão para sacar em dinheiro vivo na maior parte de seus gastos. Entre os dias 16 a 23 de maio, por exemplo, fez quatro saques de R$1 mil, sem justificativas.

COLABOROU Demétrio Weber