Título: Câmara abre trabalhos já com pauta trancada
Autor: Braga, Isabel
Fonte: O Globo, 06/02/2008, O País, p. 5

Primeiras batalhas entre governo e oposição serão sobre TV pública e cortes no Orçamento depois do fim da CPMF

BRASÍLIA. A volta dos trabalhos do Congresso depois do carnaval promete dias difíceis para o governo e suas pretensões de votar, ainda este ano, a reforma tributária. Além de a Câmara já começar o ano legislativo com a pauta trancada por sete medidas provisórias, a oposição avisa que vai endurecer o jogo já no início dos trabalhos. Durante o recesso, líderes dos dois partidos começaram a definir a estratégia. A primeira batalha será na Câmara, para tentar derrubar a medida provisória que criou a TV pública, classificada por deputados e senadores do DEM e do PSDB como algo supérfluo.

Outros embates importantes se darão na votação do Orçamento de 2008, com a necessidade de corte de R$20 bilhões depois da queda da CPMF, e na medida provisória que aumenta a alíquota da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). Os líderes da oposição já crêem ter o antídoto para a tese dos governistas de que os contrários à medida defendem os interesses dos banqueiros.

- Essa história de dizer que estão taxando os bancos é para inglês ver. No governo Lula, como "nunca antes", os bancos ganharam muito. Ninguém é ingênuo de acreditar nisso (que estamos defendendo os bancos). Os bancos repassarão aos clientes, aos financiamentos, e quem pagará a conta, por tabela, é a sociedade - diz o líder do PSDB na Câmara, Antônio Carlos Pannunzio.

"Nada impede que vire uma TV Lula, como tem Chávez"

No caso da TV pública, já em funcionamento desde o ano passado, a briga começará na admissibilidade (constitucionalidade) da medida provisória. A oposição destaca que o governo poderia ter optado por criá-la por projeto de lei, em debate com o Congresso e com a sociedade. E, no mérito, os partidos de oposição têm discurso parecido para combater a nova TV: no momento em que o governo fala em cortes no Orçamento, não há como defender a criação de uma nova TV pública.

- Respeito a Tereza (Cruvinel, diretora da TV pública), mas nada impede que depois o Lula coloque lá barbudos e ela vire uma TV Lula, como tem o Hugo Chávez. Não é prioridade. Sei que, na Câmara, a luta será brutal, e o governo pode até levar, mas aqui no Senado vamos barrar - avisou o líder do PSDB, senador Arthur Virgílio (AM).

O DEM entrou, em novembro do ano passado, com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) no Supremo Tribunal Federal contra a medida provisória da TV pública, e promete não dar trégua nos debates em plenário.

- O governo fala em cortes, em nova fonte para a saúde... É só não fazer a TV pública que já se arruma R$1 bilhão - diz o líder do DEM na Câmara, Onyx Lorenzoni (RS).

Gastos com cartão corporativo viram munição

Contentes com os aplausos que recebem até hoje nas ruas pelo fim da CPMF, os líderes da oposição centrarão os discursos na redução da carga tributária. A tônica principal dos ataques será a ineficiência de gestão do governo Lula. Munidos de números da execução orçamentária, os oposicionistas pretendem bater na tecla de que o governo Lula gasta mal os recursos públicos.

As denúncias de mau uso do cartão corporativo, que derrubaram a ministra Matilde Ribeiro, reforçarão essa linha de ataque.

- O governo não sabe como gastar. Em vez de corrigir a qualidade de seus gastos, insiste em querer aumentar imposto. Vamos continuar defendendo a redução da carga tributária. O partido ganhou identificação com a sociedade - disse o líder do DEM no Senado, José Agripino Maia (RN).

Os líderes da oposição afirmam que não foram procurados pelos governistas. Indagados se estão dispostos a dialogar com o governo, os oposicionistas repetem: esse é um governo que quebra a palavra.

- O ano começa como terminou depois da CPMF e da decisão do Lula de não cumprir o que prometeu (não aumentar impostos). Se quiserem zerar o jogo, têm que retirar a MP da CSLL e a medida do IOF, cumprindo a palavra. Aí, sim, podemos sentar e conversar. Fora disso, a disputa será em plenário, dentro do jogo democrático. O governo provocou o confronto - avisou Agripino Maia.

- O diálogo se dá nos embates em plenário. É do jogo parlamentar democrático. Não nos prometam nada, não acreditaremos. O PSDB não conversará sobre a volta da CPMF, é contra a TV pública e lutará contra o aumento da CSLL - acrescenta o tucano Arthur Virgílio.