Título: Governo quer restringir mais divulgação
Autor: Camarotti, Gerson; Vasconcelos, Adriana
Fonte: O Globo, 07/02/2008, O País, p. 3

Após escândalo, Dilma anuncia que ministros não terão mais cartões corporativos.

BRASÍLIA. O governo vai ampliar a restrição à divulgação de gastos com a segurança do presidente, do vice e de suas famílias. Hoje, 21% dos gastos com cartão são sigilosos. A decisão de rever os gastos hoje divulgados pelo Portal da Transparência, da Controladoria Geral da União (CGU), foi anunciada ontem, em entrevista no Palácio do Planalto, da qual participaram os ministros da Casa Civil, Dilma Rousseff, do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Jorge Félix, e da Comunicação Social, Franklin Martins. Os três defenderam o uso do cartão corporativo e todos os gastos realizados pelos seguranças da filha do presidente Lula, Lurian, em Florianópolis, e dos outros filhos, em São Bernardo do Campo. Reafirmaram o discurso de que há gastos, inclusive com alimentação, que não podem vir a público.

Apesar de o governo ter passado a defender uma CPI no Senado, os ministros avisaram que o governo não repassará ao Congresso dados sigilosos. Dilma e Franklin disseram ter certeza de que parlamentares não vão requisitar esse tipo de informação por ser questão de segurança nacional.

Dilma: "Dupla pressão entre transparência e segurança"

Para o general Félix, a divulgação de determinadas informações pode comprometer a segurança do presidente e de seus familiares. Ele negou, no entanto, que a restrição signifique falta de transparência do governo.

- Do ponto de vista do GSI, quanto menor a transparência, maior o grau de segurança. Em relação às informações de gastos, tem de ter limite - disse o general, para quem o governo já exerce transparência ao ser investigado pela própria CGU, pelo Tribunal de Contas da União (TCU) e pela Secretaria de Administração da Presidência: - Estamos reavaliando as informações, e aquelas que trouxerem algum tipo de prejuízo (à segurança) não mais estarão no Portal da Transparência - disse Félix.

- Vivemos uma dupla pressão. Entre transparência e segurança, vamos ter de achar o ponto correto. Houve erros, e vamos corrigi-los - acrescentou Dilma.

A decisão ocorre depois da divulgação de uma série de gastos com o cartão corporativo, entre eles consertos de carros, aquisição de artigos esportivos, lavanderia e contas em churrascarias. Ontem, o governo divulgou planilha na qual procurou demonstrar que, no governo do PSDB, os gastos eram maiores do que na fase atual no que se refere a suprimento de fundos, que inclui pagamentos diretos por meio de conta corrente (chamadas de contas tipo B) e uso dos cartões corporativos, criados em 2001.

Em 2007, foram gastos com cartões R$78 milhões, sendo 75% por meio de saques, ou R$58,7 milhões. Dilma anunciou que os ministros não terão mais cartões. Segundo ela, quem gasta não pode ser a mesma pessoa que ordena a despesa.

Dilma citou como erro a divulgação, pelo portal, dos gastos do ecônomo José Henrique de Souza, responsável pela compra de alimentos no Palácio da Alvorada. Para Dilma, esses dados não poderiam ter sido tornados públicos, por questão de segurança. A falha, segundo a ministra, foi do Banco do Brasil, que prepara um sistema para armazenar os gastos com cartões.

A ministra ainda argumentou que gastos com despesas de comitivas internacionais não devem e não serão divulgados. Dilma e Franklin adotaram o discurso de que o governo não teme investigação do Congresso sobre os cartões, mesmo com o percentual de saque de dinheiro ter crescido de 61% em 2003 para 75% em 2007.

- Não acredito que pedirão os gastos que afetam a segurança do presidente. Acredito que o Congresso não fará isso. Temos tanta certeza de que o cartão corporativo é algo absolutamente correto que não temos a menor preocupação com isso. Se o Congresso quiser se informar através de uma CPI, que seja bem-vindo - disse Dilma.

E negou que o governo esteja negociando nomeações para evitar a CPI:

- Não somos uma republiqueta de bananas.

Franklin disse que o governo manterá os cartões:

- Estamos absolutamente tranqüilos quanto ao seu uso. O governo não vai voltar atrás.

O general Félix disse que todos os gastos foram analisados e avalizados.

- Tenho absoluta convicção de que não houve desvio - disse Félix.

O GSI divulgou uma tabela com explicações para os gastos dos seguranças da família de Lula em São Bernardo do Campo (SP) e Florianópolis (SC). No caso do gasto de R$3.450 com esteiras ergométricas em São Bernardo, o GSI diz que houve conserto de esteiras e bicicletas ergométricas da sala de musculação do escritório e outros serviços e mão-de-obra. Os equipamentos, diz, são utilizados para "adestramento físico dos agentes de segurança e precisavam de reparos". E Franklin disse que o gasto na Churrascaria Vavá, em São Bernardo, era sigiloso por revelar o número de seguranças em fase de treinamento.