Título: Especialistas cobram critérios mais rigorosos para o uso dos cartões
Autor: Marques, Sérgio; Paul, Gustavo
Fonte: O Globo, 08/02/2008, O País, p. 4

Transparência também é considerada condição para eficiência do modelo.

As denúncias de mau uso do cartão corporativo no governo federal deixaram o instrumento na berlinda. Especialistas, porém, defendem o mecanismo, desde que haja ainda mais transparência e critérios mais rígidos para o uso. Na quarta-feira, a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, e o ministro da Segurança Institucional, general Jorge Félix, indicaram que deverá haver mais sigilo na divulgação dos gastos da Presidência da República. O consultor da ONG Contas Abertas Gil Castelo Branco e o diretor-executivo da Transparência Brasil, Cláudio Weber Abramo, discordam.

- Seria um retrocesso não divulgar nada. O governo já tem verba de caráter secreto e reservado, de R$25 milhões. Essas despesas servem, por exemplo, para uma operação da PF. Claro que você não pode divulgar o nome do agente, a passagem, a diária do hotel. Agora, no caso das despesas dos ministros e da própria Presidência, é importante que não se perca a transparência - diz Castelo Branco, lembrando que só com os cartões corporativos foram gastos R$75 milhões ano passado.

Abramo diz que não há motivo para esconder os gastos:

- Quando o cartão foi introduzido, um dos argumentos principais era que reduziria os custos de transação, o custo burocrático, o que era um bom argumento. A gente não pode condenar o cartão antes de saber se de fato trouxe melhor eficiência. A divulgação dos gastos é superimportante. São Paulo, Minas e Rio também têm cartões, e ninguém sabe no que e o quanto é gasto. Não é divulgado.

O diretor da Transparência Brasil acredita que não é porque houve denúncias de irregularidades que o cartão é um instrumento ruim. Para ele, é preciso fazer triagem dos gastos para identificar as irregularidades.

- Qual a incidência de despesas de natureza duvidosa no conjunto geral dos cartões? Isso não temos. Como se distribui no agregado as despesas? Só isso pode nos informar que o uso do cartão é ou não eficiente. Não é porque uma ministra gastou num free shop que se vai condenar o cartão - argumenta.

Para Castelo Branco, se o governo está preocupado com a segurança nacional, como disse Jorge Félix, existem outros meios para cuidar disso sem afetar a transparência:

- As pessoas têm o direito de saber quanto custa a Presidência e sua entourage. As viagens, a segurança, a alimentação. Mesmo que você não detalhe onde foi comprado, é preciso saber quanto foi gasto. O mesmo vale para os ministros.

Lúcio Rennó, professor da Universidade de Brasília, diz que o cartão é importante por criar um registro dos gastos.

- Não concordo com a idéia de que ele tenha que acabar. Ele tem é que ser aprimorado com regras mais claras e bem controlado com um número mais restrito de funcionários que tenha o direito de usá-lo - diz Rennó, que criticou a declaração de Jorge Félix.

- É uma retórica autoritária. Transparência sempre gera mais segurança, mais clareza da direção que o governo está seguindo. Aumenta a capacidade de controle popular e, portanto, a segurança da população. Você tem que saber onde foi gasto o dinheiro. Ele é público e, se foi mal gasto, deve ser divulgado.

O cientista político Paulo Kramer defende o cartão, mas pede regras mais rígidas:

- O cartão como instrumento é importante, mas a primeira providência que o governo deveria tomar é dar mais transparência e, sem dúvida, acabar com a história de o funcionário ser o laranja oficializado porque isso atrapalha a fiscalização.