Título: Na Câmara, gasto alto durante recesso
Autor: Galhardo, Ricardo
Fonte: O Globo, 08/02/2008, O País, p. 10

Senado vai investigar governo, mas só divulgará uso de verba indenizatória em março.

BRASÍLIA. O Senado, que fará uma CPI para investigar o uso irregular de cartões corporativos no governo federal, só dará transparência aos gastos dos senadores com a verba indenizatória de R$15 mil ao mês daqui a três semanas. E, mesmo assim, uma transparência que será limitada: não serão disponibilizadas as notas fiscais, apenas o total das despesas, divididas em grupos (combustível, aluguel, consultorias, divulgação do mandato, etc). Na Câmara, onde a prestação também acontece de forma parcial (sem apresentação de notas fiscais) os deputados tiveram ressarcimento, em pleno recesso de janeiro, de R$3,1 milhões.

Pudim alega que visitou cidades da região de Campos

No caso da bancada do Rio, foram apresentadas notas de gastos no valor de R$269,6 mil. Dos 46 deputados fluminenses, apenas 14 não apresentaram notas fiscais com gastos efetuados em janeiro. Os que não fizeram esses gastos agora poderão usar os R$15 mil a que tem direito posteriormente. Os que usaram a verba indenizatória alegam que não deixam de ser deputados durante o recesso. Pelo contrário, dizem, aproveitam a ocasião para visitar suas bases.

- No período em que descansa, o político carrega pedra. Fui a municípios, especialmente na região de Campos, que sofreu com as cheias - justificou o deputado Geraldo Pudim (PMDB-RJ), que foi ressarcido em R$14.948,02.

Houve até quem gastasse bem mais que os R$15 mil. É o caso do deputado Marcelo Serafim (PSB-AM). Ele apresentou gastos de R$27.448,46 - recebeu em janeiro R$15 mil e o restante receberá em fevereiro. Só uma nota é de R$26.880,00, que o deputado explica ter gasto para alugar um avião e fazer uma viagem de quatro dias e visitar 11 municípios no Amazonas. Ele afirma que, durante os trabalhos, não pode fazer isso, senão teria que faltar às sessões. Serafim tem 94,9% de assiduidade nas sessões.

- Tenho foto, fiz reuniões, dei entrevistas. Fui prestar contas de meu mandato. Teve colega meu que foi para a Europa e eu, que fiquei no estado e visitei o interior, acabo tomando pancada - queixou-se Serafim.

O presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), fez questão de enfatizar que a Casa é pioneira na divulgação de gastos. E afirmou que se houver uma norma que estenda a todos os poderes a obrigação de pôr na internet as notas fiscais dos gastos, a Câmara também o fará.

- Todos os gastos da Câmara podem ser acompanhados, nos computadores, por qualquer cidadão. Mas sempre é possível aprimorar. Tem muito deputado que reclama que a nota foi devolvida - disse Chinaglia, referindo-se a casos que não atendem às regras da Casa.

Casa admite que não tem como checar se há notas falsas

Embora a Câmara faça uma triagem nas notas, o diretor-geral, Sérgio Sampaio, admite que não há como saber, por exemplo, se a nota é falsa. A cada mês, diz Sampaio, a Casa recebe cerca de 10 mil notas. Uma comissão de funcionários checa a procedência do documento, evitando, por exemplo, notas sequenciadas. Mas os deputados assinam um termo de responsabilidade, atestando a veracidade das informações.

A verba indenizatória foi criada em 2001. No ano passado, depois da crise Renan Calheiros e das cobranças de maior transparência no Senado, a Casa seguiu o exemplo da Câmara. Mas só os gastos a partir de fevereiro serão públicos, e a triagem das notas será feita pela Primeira Secretaria, hoje comandada pelo senador Efraim Moraes (DEM-PB).

- Isso vem com certo atraso. Temos que dar o exemplo de transparência até para termos autoridade política para cobrar de outros poderes. O ideal é acabar com a verba - disse o senador Álvaro Dias (PSDB-PR).

Há os que, contrários à verba, abrem mão do dinheiro. Entre eles, o líder do PDT na Câmara, Miro Teixeira (RJ).

- Nunca usei porque sempre fui contra sua criação. O meu eleitor é do Rio e eu não saberia separar o uso da gasolina para meu deslocamento pessoal e do meu trabalho - justificou o pedetista.