Título: Munição contra a burocracia
Autor: Paul, Gustavo
Fonte: O Globo, 10/02/2008, Economia, p. 29

Nova rede nacional vai reduzir tempo para abrir empresas e melhorar ambiente de negócios.

Aofensiva contra a burocracia no Brasil ganhou uma nova arma em 2008. Em dezembro passado, sem alarde, enquanto a máquina do governo estava empenhada até o último clipe na aprovação da prorrogação da CPMF, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou a lei federal que cria a Redesim - a Rede Nacional para a Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios. O projeto tem potencial para reduzir o tempo de abertura de empresas no país para no máximo 15 dias, com até oito procedimentos, e o governo promete implantá-lo ao longo deste ano. Mas ainda terá que ultrapassar alguns obstáculos.

Se superá-los, o Brasil poderá livrar-se da constrangedora posição que ocupa há anos no ranking internacional dos ambientes de negócios. Segundo levantamento do Banco Mundial, leva-se em média até 152 dias para abrir uma empresa, enquanto na Austrália demora-se três dias. Para o governo, a média nacional ainda é alta, mas bem inferior: 21 dias.

Desnível tecnológico entre os estados

A promessa do Redesim é diminuir ainda mais esse tempo, ao estabelecer normas para simplificar e integrar o processo de registro e legalização de empresários e pessoas jurídicas no âmbito da União, dos estados e dos municípios.

O Redesim se materializará para o empreendedor como uma espécie de portal de abertura de negócios, via internet. De casa, ele poderá ter acesso a todos as informações para abrir uma empresa, preencher documentos, agendar visitas. Terá de ir apenas uma vez a um órgão público, que concentrará todos os demais, para apresentar a papelada.

- O conceito do Redesim é colocar serviços em rede na internet. Além disso, elimina procedimentos e acaba com exigências excessivas. Mas a entrada dos estados no Redesim é voluntária, e ainda existe muito desnível em termos de tecnologia - resume o secretário de Comércio e Serviços do Ministério do Desenvolvimento, Edson Lupatini.

O secretário admite que sua aplicação ainda não será imediata e deverá ocorrer na segunda metade do ano. Para esse projeto virar realidade precisarão ser vencidas algumas barreiras. A principal delas é conseguir interligar os cadastros da Receita Federal e das secretarias estaduais e municipais de Fazenda.

Desde 2005 vêm sendo firmados convênios, mas apenas sete estados e sete capitais já compõem esse cadastro. De acordo com o secretário-adjunto da Receita Federal Valdir Simão, esse processo prosseguirá este ano, e a meta é tentar concluir as 27 unidades da Federação até dezembro:

- Falta os estados e municípios adequarem os bancos de dados e as normas ao nosso sistema - explica.

O cadastro permite o uso do CNPJ como identificador do ICMS e de obrigações municipais. Isso significa que o empresário não precisa pedir a diferentes órgãos para abrir ou fechar sua empresa. Basta dar entrada uma única vez com a documentação necessária. Com o cadastro sincronizado, esse prazo de registro pode ser reduzido significativamente, passando para três ou quatro dias úteis. Hoje, leva de dez a 20 dias.

Essa facilidade já é percebida, por exemplo, pelos empresários da Bahia, onde o tempo para inscrição no CNPJ e nos Fiscos locais caiu de sete para três dias; de Minas (foi de 20 para cinco dias, na capital); e de Vitória (de sete dias, agora se faz registro em três dias). Em janeiro de 2007, o Rio assinou convênio com a Receita Federal, e hoje já há sincronização com a Junta Comercial e a Receita, para emissão do CNPJ.

Enquanto o Redesim não se transforma em realidade, o Brasil continua maltratando os empresários. Esse inferno tem sido vivenciado pelos empresários Walkir de Oliveira Souza e Paula Gabriela Souza, de Brasília. Em 2006, quando foram registrar a agência de viagens WOS, tiveram de visitar a Junta Comercial cerca de 15 vezes, num processo que durou 40 dias.

Donos da Planar, uma pequena empresa de formação profissional, eles decidiram transferir a propriedade da WOS para um ex-empregado e, desde o dia 18 de janeiro, estão em meio a uma maratona, que só deve se encerrar em meados de fevereiro.

Um exemplo, segundo Souza, é a obtenção da alteração contratual, para a qual foi preciso reconhecer 13 assinaturas em três documentos diferentes: 39 assinaturas no total. Sem cadastro sincronizado entre a Receita Federal e a secretaria de Fazenda do Distrito Federal, ele teve de se desdobrar para cumprir as exigências dos dois órgãos. Como o preenchimento de alguns documentos apresentou erros, Souza teve de entrar quatro vezes em filas para regularizá-los, o que demorou uma tarde inteira.

"Demora explica firmas clandestinas"

Tudo isso tomando conta da filha Millene, de cinco anos - a esposa e sócia estava correndo cartórios para reconhecer firmas:

- Precisamos ter a empresa regularizada para assinar contratos com grandes empresas, mas toda essa demora e burocracia explica por que há tantas empresas na clandestinidade - reclama Souza.

O governo acena também para melhorias nesses procedimentos. Segundo Lupatini, no ano passado o Ministério do Desenvolvimento investiu R$5 milhões em equipamentos de informática para juntas comerciais. Um grande banco de dados com as informações cadastrais de todas as empresas brasileiras está sendo elaborado, e a intenção do ministério é colocá-lo em funcionamento este ano.

PRAZO PARA ABRIR EMPRESA CAI DE 124 PARA ATÉ 6 DIAS, na página 30