Título: Governo insiste em controlar CPI
Autor: Vasconcelos, Adriana; Lima, Maria
Fonte: O Globo, 13/02/2008, O País, p. 3

O ESCÂNDALO DOS CARTÕES

PT e PMDB batem pé para nomear relator e presidente; oposição reage e ameaça obstruir.

Um dia depois de governo e oposição fecharem acordo pela criação de uma CPI mista para investigar o uso dos cartões corporativos e das contas tipo B, de 1998 a este ano, os governistas, com aval do Planalto, tentaram assumir o controle total da comissão. Respaldado pelo regimento, o líder do PMDB no Senado, Valdir Raupp (RO), chegou a convidar o colega de bancada Neuto do Conto (SC), suplente, para presidir a CPI. O PT, como maior bancada da Câmara, pretende indicar hoje o relator e já tem dois candidatos: Luiz Sérgio (RJ) e José Eduardo Cardozo (SP). PSDB e DEM reagiram, e ameaçam obstruir as votações do Congresso, caso o governo insista em nomear tanto o presidente como o relator.

Favorável ao entendimento entre governo e oposição para o comando da CPI, o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), disse na tribuna que ameaças não são o caminho:

- Não é com imposição ou faca no pescoço que se conseguem as coisas. Meu espírito é o de conciliador, mas não vamos avançar sem conversar - disse Jucá.

Alertado pelos líderes do PSDB, Arthur Virgílio (AM), e do DEM, José Agripino (RN), sobre o risco de a oposição paralisar os trabalhos do Senado pleiteando o rodízio nas presidências e relatorias de CPIs, o presidente do Senado, senador Garibaldi Alves (PMDB-RN), defendeu o entendimento:

- Acho que um cargo pode ficar com o governo e o outro com a oposição. Já fiz meu apelo e minha ponderação, mas não sou eu quem decide - disse Garibaldi.

- Não aceitamos ficar de fora. A praxe dos rodízios tem de ser respeitada. Caso contrário, vamos obstruir a pauta e só não começamos agora em função do apelo do senador Garibaldi - insistiu Virgílio, alegando que o rodízio não vem sendo aplicado desde 2003.

Para o senador José Agripino, a maioria dos líderes partidários se mostrou favorável ontem à divisão dos cargos da CPI e antecipou que o partido, que tem a segunda maior bancada do Senado, abriria mão da vaga em favor de um tucano. A senadora Marisa Serrano (PSDB-MT) é um dos nomes cotados para o cargo, em caso de acordo com os governistas.

Petistas dizem que não abrem mão de relatoria

Na Câmara, os petistas estão mais resistentes à cessão de um dos cargos de comando da CPI para a oposição. O novo líder do PT, Maurício Rands (PE), e o líder do governo na Casa, Henrique Fontana (PT-RS), afirmaram que não abrem mão de o partido indicar o relator:

- Não podemos abrir mão de nossas prerrogativas. Isso seria ingenuidade política, porque tememos que a oposição dê à CPI um clima de conflitividade (sic). Considero a obstrução um equívoco. A oposição não estará fazendo bem para o país - disse Fontana.

- Se a oposição tivesse maioria, indicaria o presidente e o relator, e nós teríamos que nos conformar - completou Rands.

Num tom abaixo do usado pela oposição no Senado, o deputado Antonio Carlos Pannunzio (SP), que deve deixar hoje a liderança do PSDB, e o futuro líder do DEM na Câmara, Antonio Carlos Magalhães Neto (BA), também admitiram que vão usar todos os artifícios para garantir que haja uma divisão do comando da CPI.

- Temos que usar todos os instrumentos para impedir que seja uma CPI chapa branca. A primeira medida será sinalizar com a possibilidade de bater chapa com um candidato da oposição na eleição para a presidência. Além disso, não descartamos a possibilidade de usar o regimento da Câmara e Senado para reagir se o governo não dividir esses cargos - disse Neto, deixando claro que pode haver obstrução também na Câmara.

Rands e Fontana, porém, garantem que os representantes da base na CPI vão mostrar que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e seus familiares não sabiam que os ordenadores de despesa (ecônomos) estavam cometendo abusos ou usando mal os cartões.

Perguntado se partiu da suposta ecônoma da primeira-dama Marisa Letícia, Maria Emilia, a decisão de sacar R$650 mil em dois anos para pagar suas despesas, Rands disse que, se for o caso, as co-responsabilidades também serão apuradas, desde que isso não afete a segurança da família presidencial.

Os petistas contaram que outra estratégia é provar que os gastos com as contas B no período Lula caíram em relação ao governo Fernando Henrique Cardoso.

- Vamos mostrar que as despesas com as contas B no governo Lula diminuíram bastante - disse Fontana, sem explicar que elas foram transferidas para o cartão corporativo.