Título: Para cientistas políticos, apesar de acordo, será difícil controlar CPI
Autor: Vasconcelos, Adriana; Lima,Maria
Fonte: O Globo, 13/02/2008, O País, p. 4

Especialistas dizem que investigação precisa atacar ineficiência dos gastos.

SÃO PAULO. Embora considerem que a futura CPI do Cartão Corporativo já esteja comprometida pelo suposto "acordão" entre o Planalto e o PSDB - que visa a proteger gastos das famílias do presidente Lula e do ex-presidente Fernando Henrique -, cientistas políticos analisam que, depois de iniciada, ela poderá se revelar uma verdadeira "caixa de Pandora".

É que as cúpulas dificilmente controlam todos os congressistas, principalmente em ano eleitoral. Para os especialistas, mais do que fazer barulho, a futura CPI precisa atacar a ineficiência dos gastos públicos e corrigir deslizes. Eles frisam que enquanto se discutem as tapiocas compradas com os cartões, as reformas continuam paradas.

- Esse acordo foi uma ducha fria e deve ficar como lição para a sociedade. Agora, em vez de um descobrir a tapioca do outro, com esse empate técnico vexatório, o que se espera é que o Congresso discuta o mecanismo do cartão, proponha mudanças e o fiscalize de maneira séria - disse o cientista político Fernando Abrúcio, professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

Para Abrúcio, a oposição criou um "monstro":

- A oposição achou que seria um novo mensalão, negociou e claramente circunscreveu, de modo a deixar os dois presidentes de fora. Agora, uma CPI é sempre uma "caixa de Pandora". Não se sabe o que sairá dali.

Para Giannotti, acordo atrapalha o jogo politico

O filósofo José Arthur Giannotti, professor emérito da USP, avaliou que, embora para ele a corrupção no país seja endêmica, o fortalecimento da sociedade civil cria mecanismos que a tornam mais detectável:

- Desaparece assim o argumento: "Se sempre foi assim também posso fazer, pois agora farei em uma situação mais transparente". Isso na verdade é politicamente mais pernicioso.

Segundo o filósofo, as tentativas de acordo atrapalham o jogo político:

- Há sim, uma tentativa de acordo, com cada um não querendo entregar os culpados amigos. Mas este acordo só atrapalha o jogo político. Que se faça uma CPI sem limites, mas com prazos, pois não poderemos passar o tempo lambendo as nossas feridas.

Para o cientista político Plínio Dentzien, pesquisador do Centro de Estudos de Opinião Pública da Unicamp, o acordo em torno da CPI não deve impedir a exploração de novos escândalos.

- Os acordos nunca envolvem todos os políticos. Será praticamente impossível impedir a apuração, o que, aliás, é muito importante para a democracia. Afinal, não se trata de dinheirinho, mas sim de um dinheirão público que foi gasto e precisa ser melhor explicado. E os mecanismos têm que ser corrigidos - disse Dentzien.