Título: Ao pedir mudança na lei, teles miram conteúdo
Autor: Rosa, Bruno; Tavares, Mônica
Fonte: O Globo, 13/02/2008, Economia, p. 25

Objetivo, segundo analistas, é frear o avanço das operadoras de TV a cabo e diversificar serviços prestados.

RIO e BRASÍLIA. Ao pedirem uma mudança mais abrangente no Plano Geral de Outorgas (PGO), as operadoras de telefonia fixa têm como grande foco a produção de conteúdo, hoje proibida por lei. A idéia é aproveitar toda a rede de fibra ótica (ADSL) instalada no país para prover o serviço de TV por assinatura, o IPTV.

A questão, que aparece de forma tímida no documento entregue sexta-feira à Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) pela Abrafix, que reúne Telefônica, Oi, Brasil Telecom, Sercomtel e CTBC, foi explicitada ontem pelo presidente da associação, José Fernandes Pauletti. Ele falou à imprensa sobre os planos das empresas de se transformarem em grupos completos de telecomunicações.

- A gente quer oferecer o serviço de TV por assinatura por qualquer tecnologia, cabo, TV por satélite, o que for mais conveniente, econômico. (Queremos) ter uma rede espalhada no Brasil inteiro.

Segundo Eduardo Roche, da Modal, as empresas buscarão parceria com grupos de comunicação e emissoras de TV, além de criar canais exclusivos, para oferecer o serviço, que vai concorrer diretamente com Net, TVA e Sky/DirecTV.

Hoje, operadoras de telefonia não podem oferecer TV a cabo em sua área de atuação. Além disso, a Lei do Cabo restringe a 49,9% a participação de estrangeiros nesse negócio. Ao incluir o tema na discussão, as operadoras aproveitam o momento de mudança desencadeado pela compra iminente da Brasil Telecom (BrT) pela Oi.

Mudança é prevista em projeto de lei

A questão da TV por assinatura requer alteração constitucional e não consta do PGO. Está sendo tratada - mas a passos lentos - no Projeto de Lei 29, de iniciativa parlamentar. Na prática, algumas soluções vêm sendo oferecidas pela própria Anatel. A Oi conseguiu levar a licença da Way TV a uma região de Minas Gerais em 2007, porque não havia outros interessados. Mas a brecha é pequena.

Também há projetos-piloto. A BrT oferece o video on demand, que funciona como locadora virtual, sem conteúdo televisivo ininterrupto. Em 2007, a Oi fechou com a Nokia Siemens contrato de infra-estrutura de IPTV. Se a regulamentação permitir, o serviço poderá avançar.

O objetivo das telefônicas, segundo analistas, é frear o avanço das TVs a cabo e diversificar serviços. Nos EUA, as operadoras de TV a cabo ganham mais espaço no mercado de voz local. Hoje, no Brasil, uma das principais empresas a oferecer o serviço é a Net, com o Netfone, por meio de parceria com a Embratel.

- Mas é preciso que as teles aumentem sua capacidade de rede, hoje usada apenas para banda larga - diz Roche.

Maior impacto será sobre telefonia móvel, diz analista

Se a mudança no PGO também permitir a fusão entre Vivo e TIM - o que ainda precisaria de aval do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) -, isso deverá encarecer as tarifas de telefonia móvel, dizem analistas. Com um operador a menos, a competição diminuirá. Na opinião de Beatriz Battelli, da Brascan Corretora, a união entre as duas terá mais impacto para o consumidor do que a compra da BrT pela Oi, já que estas atuam em áreas diferentes. Vivo e TIM somam 56,75% do mercado, de acordo com a consultoria Teleco.

- Com a mudança no PGO, o maior efeito será na telefonia móvel - afirma Beatriz.

Para o consultor Virgílio Freire, o consumidor vai perder com o monopólio na telefonia celular e na fixa.

- A criação de uma supertele vai dificultar o aparecimento de novas empresas de banda larga e TV a cabo, pois não haverá escala para concorrer com as grandes.

Para analistas, com o possível fim das fronteiras de concessão no país, as operadoras fixas não devem oferecer qualquer serviço residencial fora de suas áreas originais, até mesmo em localidades mais ricas, pois implantar a rede tornaria o negócio inviável. A aposta ficaria restrita ao mercado corporativo.

A decisão sobre quão profundas serão as mudanças no PGO está com o ministro das Comunicações, Hélio Costa. Se o ministério pedir a reforma do PGO, haverá consulta pública, porque não há intenção de "enfiar goela abaixo" nenhuma modificação, disse o presidente da Anatel, Ronaldo Sardenberg.