Título: Igreja Universal tenta intimidar jornalistas
Autor: Otavio, Chico
Fonte: O Globo, 14/02/2008, O País, p. 13

IMPRENSA: A mesma estratégia é adotada contra o "Extra" por notícia sobre fiel que danificou imagem católica.

Seita move ações orquestradas contra repórter e "Folha de S.Paulo" por reportagem sobre império de comunicação.

A Igreja Universal do Reino de Deus (Iurd) tenta intimidar jornalistas através de ações orquestradas na Justiça. Fiéis e pastores da seita ajuizaram cerca de 50 ações de danos morais contra a "Folha de S.Paulo" e a jornalista Elvira Lobato, após publicação de reportagens, em 15 de dezembro passado, sobre o império de comunicação montado pelos "bispos" que controlam a Universal. Também contra o "Extra" e seu diretor de Redação, Bruno Thys, cinco pastores da seita, de diferentes cidades do Estado do Rio, entraram com ações pedindo indenização por danos morais. Todos alegam se sentir ofendidos com reportagem sobre um fiel da Universal que danificou uma imagem de de São Benedito, na Bahia.

Nos processos contra a "Folha" e Elvira, pedindo indenizações de R$1 mil a R$10 mil, os pastores e fiéis alegam que sofreram prejuízos morais com a reportagem. Como as ações foram propostas em lugares distantes - todos a mais de 200 quilômetros da capital de diferentes estados - e apresentam até trechos iguais, Elvira desconfia de uma tentativa orquestrada de intimidação.

- Não tenho como afirmar que é uma ação da Igreja Universal, mas há coincidência na argumentação, e os advogados dos autores também atuaram em processos da própria igreja - disse a jornalista.

Ao sustentar que os autores das ações estariam sofrendo humilhações, após a divulgação da reportagem de Elvira, advogados de vários pontos do país citaram a mesma frase para ilustrar o que pastores e fiéis estariam ouvindo em suas cidades: "Viu só! Você que é trouxa de dar dinheiro para essa igreja!! Esse é o povo da sua igreja?! Tudo safado!! Como é que você continua nessa igreja? Você não lê jornal, não? É. Crente é tudo tonto mesmo".

- Não é possível que as pessoas tenham repetido o mesmo deboche em dezenas de lugares diferentes - diz a advogada de Elvira, Taís Gasparian.

Na reportagem, a Folha informou que, em 30 anos de existência, completados em julho, a Iurd construiu um império de radiodifusão e outras empresas - 23 emissoras de TV, 40 de rádio e 19 empresas registradas em nome de 32 membros da seita, na maioria bispos.

A reportagem mostrou que a igreja tem também sua própria empresa de táxi aéreo, a Alliance Jet, de Sorocaba (SP), com três aviões, um deles adquirido por US$28 milhões.

Um dos trechos da reportagem que mais teria irritado o comando da seita foi uma referência à hipótese de lavagem do dinheiro do dízimo dos fiéis em paraísos fiscais. A Cremo Empreendimentos, que funciona como um braço financeiro da seita, pertence à Unimetro (outra empresa da Iurd), que tem entre os sócios a Cableinvest, registrada no paraíso fiscal de Jersey, no Canal da Mancha.

Para defender o jornal e a repórter, o Departamento Jurídico da "Folha" teve de montar uma logística especial, já que são muitas audiências num dia só, em diferentes estados, exigindo até deslocamento por barco.

No processo contra o "Extra", apesar de as ações serem individuais, o texto é praticamente o mesmo. Na página 6 de cada ação, os pastores alegam que o objetivo do jornal não foi apenas informar, mas provocar a ira dos católicos. Na página 3 de cada ação, os diferentes autores usam o mesmo texto para relatar que estão "correndo o risco diário de sofrer agressões físicas e sofrendo discriminações até por parte de membros da Iurd, uma vez que eles também têm sido alvo de perseguição religiosa".

Além de textos semelhantes, as ações foram distribuídas no mesmo mês (quatro delas em 9 de janeiro e uma em 11 de janeiro) e em comarcas do interior. Como o diretor de Redação foi citado, o jornalista terá comparecer às audiências, sob o risco de ser condenado à revelia