Título: Pecuaristas brasileiros tentam conter perdas por embargo
Autor: Oliveira, Eliane; Duarte, Patrícia
Fonte: O Globo, 24/02/2008, Economia, p. 34

Enquanto se preparam para receber missão européia, exportadores de carne respondem a consultas de outros países

BRASÍLIA. Enquanto esperam a chegada da missão de inspetores veterinários europeus, amanhã, os produtores de carne in natura no Brasil se esforçam para minimizar os impactos do embargo determinado pela União Européia (UE) aos seus produtos. Os pecuaristas já estão respondendo a consultas feitas por outros países, como Egito e Israel, que buscam informações sobre as condições da produção nacional, e reforçando as ações internacionais. Isso tudo para combater o prejuízo de cerca de US$80 milhões ao mês que terão de enfrentar com a proibição de venda da carne para os europeus.

- É a regra do jogo para todos os exportadores. Nós andamos descumprindo por muito tempo as regras da UE - reconheceu o presidente da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne (Abiec), Pratini de Moraes.

A missão européia selecionará, de uma lista de cerca de 200 propriedades, um grupo de fazendas brasileiras para verificar de perto como funciona o sistema brasileiro de rastreabilidade bovina, ou seja, o acompanhamento do animal desde o nascimento até o abate. Os técnicos ficarão no Brasil até 11 de março, e está nas mãos deles a decisão da UE de manter ou levantar o embargo às exportações brasileiras, que começou no último dia 1º.

Governo quer simplificar regras para exportadores

A suspensão das importações européias também incomoda o governo. Preocupado em deixar claro que a questão não é sanitária, e sim meramente burocrática, o ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, quer simplificar as regras atuais, que são consideradas confusas e exageradas pelos brasileiros.

- Há interesse da UE em manter o Brasil como parceiro e, para nós, é importante continuarmos com o mercado europeu. Num segundo momento, vamos simplificar as normas de rastreabilidade, tornando o processo mais objetivo - disse o ministro ao GLOBO.

A UE considera que o Brasil tem condições de fiscalizar o cumprimento das normas em no máximo 300 propriedades. A quantidade é bastante limitada, tendo em vista que a primeira lista apresentada pelo Brasil aos europeus, ainda em novembro do ano passado, tinha cerca de 2.700 fazendas. No dia 15, em Bruxelas, o Brasil apresentou 600 propriedades, o que não foi aceito, sob alegação de documentação incompleta. Na última sexta-feira, o Brasil reconheceu que há problemas e entregou aos europeus cerca de 200 fazendas.

A idéia foi apresentar apenas as propriedades que cumprem integralmente os 49 itens da instrução normativa que estabeleceu os critérios de rastreabilidade. Com isso, o governo brasileiro espera demonstrar boa vontade e obter, em retorno, o compromisso de ampliação gradual da relação de exportadores, até que não haja limitações. Caso contrário, a saída será entrar com uma ação contra a UE na Organização Mundial do Comércio (OMC). O motivo seria a imposição de uma quota de fornecedores e a exigência de regras em desacordo com as normas internacionais.

- Mas é importante que os exportadores e os produtores brasileiros mantenham o compromisso assumido com os europeus - defendeu o ministro da Agricultura.

Apesar do movimento, para os produtores a situação não deve mudar tão rapidamente. Moraes, da Abiec, não acredita que a UE possa negociar, pelo menos a curto prazo, a simplificação das normas de fiscalização. Diante disso, os produtores suam a camisa para explicar aos outros países consumidores e que estão fora da UE que o problema "não é sanitário, mas sim comercial".

Segundo ele, apenas a Suíça suspendeu as importações de carne brasileira depois da UE, apesar de outros países estarem pedindo explicações.

- Eles vêm, perguntam o que está acontecendo, e a gente explica. Ninguém deixou de comprar a nossa carne - afirmou o presidente da Abiec.

Para tentar mudar esse cenário, Moraes embarcou no fim da semana passada para Dubai, onde vai promover o produto nacional. Segundo ele, a visita já estava agendada. Mas, diante do novo cenário, os pecuaristas convidaram para o encontro comerciantes de outras regiões, como Egito e Irã.

O mercado interno brasileiro, diz Moraes, também vai ajudar a minimizar as perdas, ainda mais se mantido o crescimento de consumo de 2007, em torno de um quilo por habitante. Ao todo, o brasileiro consome, em média, 37,5 quilos de carne por ano.

- Se isso ocorrer de novo, conseguiremos desviar 50% do que exportamos à UE para o mercado nacional - afirmou Moraes.

Burocracia dificulta exportação, diz CNA

Para o presidente do Fórum Nacional Permanente de Pecuária de Corte da Confederação de Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Antenor Nogueira, é fundamental que as regras previstas atualmente na instrução normativa nº 17, do Ministério da Agricultura, sejam equivalentes às exigências feitas pela UE aos produtores europeus. A grande quantidade de documentos a serem apresentados pelo fazendeiro dificulta a vida do exportador.

- É tudo muito burocrático e vai além da questão sanitária - afirmou Nogueira.