Título: Lula: dados furtados da Petrobras eram segredo de Estado
Autor: Gois, Chico de; Rosa, Bruno
Fonte: O Globo, 18/02/2008, Economia, p. 22

Presidente diz que apenas três empresas no mundo trabalham com tipo de informação que estava nos computadores que sumiram da estatal. "É uma coisa grave", afirma.

ANTÁRTICA e RIO. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva classificou como "muito grave" o sumiço de computadores com dados sigilosos da Petrobras. Ele não quis afirmar que se trata de espionagem industrial, mas sugeriu que essa é uma possibilidade, diante do restrito interesse estratégico pelas informações contidas nos computadores. Segundo ele, apenas três empresas no mundo fazem o mesmo tipo de trabalho. Fora de Brasília desde quinta-feira, o presidente está sendo informado, diariamente, por telefone, sobre as investigações da Polícia Federal.

- Do ponto de vista estratégico é que estamos querendo saber o que aconteceu de verdade, porque são apenas três empresas no mundo que trabalham com esse tipo de prospecção, de estudos. Portanto, roubaram um software que continha informações que eram um segredo de Estado. É uma coisa grave que estamos investigando. Nessa altura do campeonato, o que vale não é o palpite. O que vale é a investigação séria que estamos fazendo para apurar o que aconteceu de fato - disse Lula, em entrevista, ontem, na Antártica.

Segundo especialistas, as maiores empresas de prospecção do mundo são as americanas Halliburton (que fazia o trabalho de transporte do contêiner onde estavam os equipamentos furtados) e BakerHughes e a francesa Schlumberger. Elas realizam serviços específicos como perfilagem dos poços, recolhimento de resíduos, além de inúmeras operações que envolvem a perfuração de um poço. Nenhum representante das empresas foi encontrado ontem pelo GLOBO para comentar o assunto.

- Halliburton e Schlumberger são contratadas por 99,9% das produtoras de petróleo do mundo, pois são especializadas em analisar dados de campos - explica um especialista.

"Cuidado para não falar de forma precipitada", diz Lula

Perguntado se acreditava se tratar de espionagem industrial, o presidente Lula evitou apontar culpados:

- Nesta coisa nós temos de ter muito cuidado para não falar de forma precipitada. Na verdade, fiquei sabendo do roubo logo no começo. A Abin (Agência Brasileira de Inteligência), a PF (Polícia Federal) e a segurança da Petrobras têm um processo de investigação.

Reproduzindo o clima de desconfiança de todo o governo, Lula ressaltou o fato de que o furto não foi uma ação fácil:

- É uma coisa difícil de ser roubada porque estava dentro de um contêiner. Portanto, era difícil. De forma que temos de aguardar com uma certa tranqüilidade as investigações. Não fazer insinuações, acusando qualquer pessoa ou inocentando qualquer pessoa. Por enquanto, estamos numa fase de investigação.

Lula disse ainda que a Petrobras já tem todas as informações de que ela precisava ter sobre os poços de Júpiter e Tupi e que, quem furtou não levou nada que a Petrobras não conhecesse ainda:

- Portanto, do ponto de vista dos interesses econômicos do Brasil, não tem problema.

O furto foi descoberto em 31 de janeiro, mas o inquérito da PF só foi aberto no dia 7. Os equipamentos teriam desaparecido no trajeto entre a Bacia de Santos e Macaé.

Segundo analistas, várias entidades globais teriam interesse em dados estratégicos da Petrobras referentes aos megacampos da Bacia de Santos. Além de uma das centenas de produtoras de petróleo do mundo, bancos aparecem como prováveis interessados nas informações. A explicação, de acordo com especialistas, é que as instituições financeiras poderiam tirar proveito dos dados secretos para comprar ou vender as ações da estatal.

Novo leilão da ANP está previsto para março

- Há quem diga que o furto dos documentos teria relação com sindicalistas, que querem brecar os leilões feitos pela Agência Nacional de Petróleo (ANP), pois as reservas são de interesse nacional - conclui.

Na nona edição do leilão da ANP, realizada em novembro do ano passado, foram retirados às vésperas do evento 41 blocos situados na camada pré-sal, em águas ultraprofundas, região em que está localizado o campo gigante de Tupi (Bacia de Santos). Na ocasião, o governo brasileiro alegou questões de "soberania nacional". A Oitava Rodada, que foi suspensa por medida judicial, está prevista para março deste ano e manterá os blocos ofertados na primeira tentativa de sua realização, em 2006. Entre eles estavam 20 blocos da camada pré-sal.

Para o ex-diretor geral da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) David Zylbersztajn, sem saber qual a natureza dos dados, é impossível fazer qualquer acusação:

- Sem saber o que foi roubado, não dá para afirmar nada. Se for mesmo espionagem industrial, certamente terá sido de uma empresa estrangeira.

(*) Enviado especial

COLABOROU Luciana Calaza