Título: Da boca para o canteiro
Autor: Cássia, Cristiane de
Fonte: O Globo, 21/02/2008, Rio, p. 13

Traficantes também se inscrevem para trabalhar nas obras do PAC em Manguinhos

Traficantes de Manguinhos também estão se inscrevendo para vagas nas obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) na comunidade. Ontem de manhã, enquanto aguardavam a vez de serem cadastrados, alguns moradores reclamaram do fato de rapazes envolvidos com a venda de drogas não estarem respeitando a fila. Segundo líderes comunitários, pelo menos três jovens entre 18 e 19 anos, integrantes do tráfico, fizeram sua inscrição porque pretendem deixar o crime. Não se descartou, no entanto, a hipótese de o tráfico estar se infiltrando nas obras para acompanhar a movimentação na favela.

O comandante de Policiamento da Capital, coronel Marcus Jardim, já ouviu comentários no Complexo do Alemão de que há gente querendo abandonar o crime para trabalhar nas obras, o que é visto de maneira positiva pela polícia.

- Será muito bom se as obras tirarem pessoas do caminho do crime. Não havia nada nos locais de inscrições que levantasse suspeita, ninguém armado. Hoje (ontem), aconteceu tudo na maior normalidade - disse Jardim.

Saber exatamente quem é quem no ato de inscrição é difícil, admite o secretário estadual de Trabalho e Renda, Alcebíades Sabino. Ele disse não ter conhecimento de traficantes se cadastrando, mas informou que egressos do sistema penitenciário têm pedido ajuda ao se inscreverem.

- Não temos como saber quem são as pessoas, nem como negar a inscrição. Vamos entregar o cadastro às empresas e elas vão selecionar os candidatos. Mas não creio que teremos problemas com qualquer inscrito, porque todos os que ficam ali esperando querem mesmo trabalhar. A equipe que está cadastrando recebe, sim, vários apelos de pessoas que dizem que cumpriram pena e precisam de uma oportunidade de emprego. Eu vejo isso positivamente - disse Sabino.

A Secretaria de Segurança Pública informou que o serviço de inteligência está atento. No entanto, até agora, não há informações consistentes sobre foragidos ou pessoas investigadas pela polícia que tenham se cadastrado nas obras do PAC. Caso haja denúncia, ela será apurada. Mas, segundo o órgão, cabe às empresas que vão contratar moradores a pesquisa sobre a vida de qualquer um que levante suspeita.

Força enviará mil agentes ao Alemão

Em Brasília, o Ministério da Justiça anunciou ontem que pelo menos mil homens da Força Nacional de Segurança farão, em breve, a ocupação, por tempo indeterminado, do Complexo do Alemão. A presença da tropa de elite terá o objetivo de garantir a implantação do PAC e de projetos do Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci), também do governo federal.

Entre as ações do PAC, constam obras de reurbanização e saneamento. Já o Pronasci prevê a realização de trabalhos comunitários em troca de bolsas de R$100 a R$400. Policiais, reservistas, jovens e mulheres líderes comunitárias farão parte do programa. O governo federal, que teme a repercussão negativa de possíveis confrontos com traficantes na implantação dos projetos, informou que fará nova parceria com o estado.

- As operações que serão realizadas no Alemão são de responsabilidade da Secretaria de Segurança do Rio. Entretanto, eles solicitaram apoio logístico da Força Nacional, o que será atendido - disse o secretário nacional de Justiça, Antonio Carlos Biscaia.

Em cinco dias, mais de 13 mil pessoas já se inscreveram para obras do PAC em Manguinhos, no Alemão e na Rocinha. O cadastramento vai até o dia 27 e há um total de 4.600 vagas. Ontem de manhã, só em Manguinhos, foram mais de mil pessoas que enfrentaram o calor para se candidatar a um dos postos de trabalho. O número de PMs no acesso à favela era o mesmo de segunda-feira (dez), quando seis bandidos em motos atacaram a tiros duas patrulhas, interrompendo as inscrições. Um dos disparos atingiu o trailer onde era feito o cadastramento e destruiu um computador. Estilhaços feriram um dos atendentes.

A previsão é de que as obras sejam lançadas no dia 7 de março e comecem efetivamente na segunda quinzena do mês. Uma das medidas será a implantação de uma delegacia móvel - com um delegado, dois peritos, um escrivão e três inspetores - nas favelas beneficiadas pelo projeto. As unidades vão funcionar em furgões, onde registros de ocorrência, investigações e até mesmo perícias poderão ser feitos. No Alemão, haverá ainda um fórum.

COLABORARARAM Alan Gripp (Brasília) e Camilo Coelho (do Extra)