Título: Finatec tinha convênios públicos de fachada
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Fonte: O Globo, 23/02/2008, O País, p. 16
Segundo "Época", consultor usava instituição para driblar licitações, na maioria das vezes com governos do PT.
A Fundação de Empreendimentos Científicos e Tecnológicos (Finatec) - instituição de apoio à pesquisa ligada à Universidade de Brasília (UnB) que pagou R$389 mil por mobília de luxo para o apartamento funcional do reitor Timothy Mulholland - estaria sendo usada como fachada por empresas de consultoria em convênios com órgãos públicos, sem passar por licitação. Os principais contratos foram assinados com prefeituras e governos do PT. A denúncia é da revista "Época".
Segundo a revista, as empresas Intercorp Consultoria Empresarial e Camarero & Camarero Consultoria Empresarial Ltda., do casal Luís Antônio Lima e Flávia Maria Camarero, aproveitaram-se de brecha na legislação que permite a contratação de fundações ligadas a entidades de ensino sem concorrência. Planilha em poder do Ministério Público registra que foram destinados às duas empresas R$22 milhões dos R$50 milhões em contratos da Finatec com órgãos públicos entre 2000 e 2005.
Testemunhas ouvidas pelo Ministério Público e ex-consultores da Finatec entrevistados pela "Época" afirmam que o contato com governos petistas era feito pelo gaúcho Luís Lima, que foi consultor da administração do PT em Porto Alegre e participou como voluntário da transição do governo Fernando Henrique para o de Lula. Segundo o Ministério Público, Lima usava essas credenciais para se aproximar de governos estaduais e municipais e fechar contratos milionários - como fez com as prefeituras de São Paulo, Fortaleza, Vitória, Recife, Nova Iguaçu e Maringá e o governo do Piauí.
"Os valores dos contratos eram superestimados, supostamente para permitir a distribuição de percentuais para agentes públicos, para Luís Lima e, provavelmente, para alguns diretores da Finatec", afirmou testemunha ao MP.
Oficialmente, a contratada para prestar assessoria era a Finatec, mas quem recebia os pagamentos eram a Intercorp e a Camarero. Segundo a reportagem, há indícios de que pelo menos parte dos contratos não foi cumprida. Em São Paulo, o prefeito Gilberto Kassab (DEM) anulou contrato de R$12,2 milhões fechado pela petista Marta Suplicy para melhorar a gestão da secretaria que coordena as subprefeituras. A prefeitura alega que houve irregularidades e que irá à Justiça para reaver os valores pagos (R$9,3 milhões, dos quais R$4,49 milhões foram para a Intercorp/Camarero). A Finatec recebia por hora, sem controle do serviço prestado.
Relatório da corregedoria da prefeitura acusa "negligência dos agentes municipais que atestaram a execução dos serviços". E ainda "uso político-partidário" do plano de ação de Finatec, que previa "reunir em programa de mala direta os endereços de todos os filiados dos partidos da base do governo e de militantes do movimento social identificados com o governo".
Procurada pela "Época", a hoje ministra Marta Suplicy não quis se manifestar. O advogado da Finatec, Francisco Queiroz Caputo Neto, disse que a subcontratação não é irregular. A fundação atribui a parceria com a Intercorp à necessidade de acesso a um programa de reforma administrativa para atender prefeituras. Lima alegou que seu contrato com a Finatec o impede de dar entrevistas.
Segundo promotores, desde 1999 as contas da Finatec não são aprovadas, e é comum a atuação em áreas sem qualquer vínculo com pesquisa.
- Encontramos planos até para construção de um shopping. É esdrúxulo - disse à "Época" o promotor Ricardo Souza, chefe da investigação.
No Piauí, o então recém-eleito governador Wellington Dias (PT) contratou a Finatec em 2003 para elaborar uma reforma administrativa e um plano de cargos e salários. Em um só dia, 3 de abril, o governo dispensou licitação para contratar a fundação, aceitou seu plano de trabalho e assinou o contrato. O Tribunal de Contas abriu dez processos para investigar a contratação.
- O TCE aceitou a defesa do governo, e as contas foram aprovadas - rebateu à "Época" a secretária de Administração do Piauí, Regina Souza.