Título: Barreira furada
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Fonte: O Globo, 20/02/2008, Economia, p. 23
Petróleo sobe 4,7% e supera pela 1ª vez na História marca de US$100, puxado por Opep, Chávez e incêndio no Texas
NOVA YORK, LONDRES e RIO
Acotação do petróleo fechou ontem, pela primeira vez na História, acima dos US$100 devido a uma série de fatores, sendo o principal a expectativa de a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) não aumentar - podendo até cortar - sua produção. Em Nova York, o barril do tipo leve americano avançou 4,7%, para US$100,01, recorde de fechamento. Durante o pregão, a cotação atingiu outro recorde: US$100,10 - superando os US$100,09 de 3 de janeiro, quando fechou a US$99,18. Em Londres, o barril do tipo Brent subiu 3,9%, para US$98,56, também recorde.
Os preços estão agora no nível alcançado no início dos anos 1980, após a revolução islâmica no Irã, com a correção pela inflação. Dependendo do índice usado, os US$38 atingidos pelo barril equivaleriam hoje a um valor entre US$96 e US$103.
- Minha aposta a curto prazo é entre US$105 e US$110 - disse à Bloomberg News Rob Kurzatkowski, analista da OptionsXpress Holdings. - A Opep vai recuar se os preços subirem mais.
A marca histórica do barril fez a Bolsa de Nova York encerrar em baixa. O Dow Jones e o S&P caíram 0,09% e o Nasdaq, 0,67%.
Na segunda-feira, o presidente da Opep, Chakib Khelil, afirmou que, na reunião de 5 de março, o cartel deve decidir manter ou até mesmo reduzir sua produção. O ministro venezuelano do Petróleo, Rafael Ramirez, fez a mesma afirmação ontem. Outros representantes da Opep, porém, disseram que será difícil justificar um corte no fornecimento no atual patamar de preços, mesmo com a expectativa de recuo após o fim do inverno no Hemisfério Norte, em março.
Segundo analistas, contribuíram para o recorde um incêndio numa refinaria do Texas, que produz 67 mil barris/dia, o rumor da morte do líder dos rebeldes nigerianos - desmentida pelo governo - e a briga do presidente venezuelano, Hugo Chávez, com a Exxon Mobil em torno da nacionalização de um projeto no Orinoco, ano passado. A empresa americana conseguiu, na Justiça, congelar US$12 bilhões em ativos da estatal venezuelana PDVSA no exterior. Em represália, a Venezuela parou de vender petróleo à Exxon e ameaçou suspender as exportações para os EUA. Ontem, o país propôs abandonar ações judiciais em troca de uma arbitragem do Banco Mundial.
Petrobras diz que não reajustará gasolina
Apesar de o barril de petróleo ter superado a barreira dos US$100, a Petrobras informou ontem que não vai reajustar seus preços de gasolina, diesel e derivados. A estatal alega que não segue a volatilidade dos preços internacionais do petróleo a curto prazo. Para que os preços internos dos combustíveis sejam reajustados, seria necessário que a cotação internacional se mantivesse estável nesse patamar elevado por um período maior de tempo, diz a empresa.
O último reajuste da gasolina e do diesel ocorreu em setembro de 2005. O governo Luiz Inácio Lula da Silva nunca reajustou o preço do GLP, o gás de cozinha. A valorização do real frente ao dólar serviu, nesse tempo, como um colchão de proteção contra eventuais perdas.
Para o diretor do Centro Brasileiro de Infra Estrutura (CBIE), Adriano Pires, a alegação da Petrobras só é parcialmente verdadeira. Essa justificativa, afirma, só se aplicaria à gasolina e ao diesel, não a outros derivados, como nafta, querosene de avião e óleo combustível, que são reajustados mensalmente, com base no preço internacional do petróleo e na taxa de câmbio.
- A Petrobras deveria adotar uma maior transparência na sua política de reajuste de preços - cutuca Pires, convencido de que a estatal faz um uso político dos preços do combustível.
Ainda que o governo não reajuste os preços dos combustíveis há bastante tempo, a defasagem acumulada até agora não chega a preocupar, pois está sendo neutralizada pela valorização do real frente ao dólar. No caso do gás de botijão, o GLP, Pires calcula uma defasagem média de 30% a 40%, e, no caso da gasolina e do diesel, de até 15%. Hoje, explica ele, o gás de cozinha é vendido no Brasil cerca de 40% mais barato que no mercado internacional, e a gasolina e o diesel, está entre 5% e 8% mais baixo, na mesma comparação.
Como a Petrobras não vai reajustar seus preços, economistas como Elson Teles, da Concórdia Corretora, acham que é cedo para fazer projeções sobre o impacto da cotação do petróleo na inflação. Teles acha improvável que o barril do petróleo continue na faixa dos US$100 num cenário de recessão americana e desaceleração da economia global. Ainda que outros derivados, como nafta, óleo combustível e querosene de avião, venham a ser reajustados pela Petrobras, Teles diz que seria precipitado fazer projeção.
Enquanto o petróleo avança, o consumo de álcool cresce no país. A Agência Nacional do Petróleo (ANP) informou ontem que o consumo de álcool hidratado subiu 49,39% no Brasil ano passado em relação a 2006, enquanto o mercado de combustíveis teve expansão de 7,57%.
- Em 2007, o mercado de combustível cresceu mais que o PIB - comentou o superintendente da ANP, Edson Silva, atribuindo isso a uma maior fiscalização, ao avanço dos carros flex e ao aumento da renda da população.
A produção média diária de petróleo da Petrobras caiu 1,5% em janeiro em relação a dezembro, para 1,826 milhão de barris. Frente a janeiro de 2007, subiu 2,3%.
COLABOROU Liana Melo