Título: Raúl Castro enfrenta o desafio das mudanças
Autor: Vicent, Mauricio
Fonte: O Globo, 26/02/2008, O Mundo, p. 28

Medidas iniciais podem incluir relaxamento à restrição de viagem, mas pouco adiantariam sem novo rumo na economia.

HAVANA. Chegou a hora da verdade. Passada a posse e a sucessão formal de seu irmão, que não deve ter sido fácil, Raúl Castro, o novo presidente dos Conselhos de Estado e de Ministros enfrenta agora o desafio de despertar a esperança de seus compatriotas num prazo razoável de tempo. E a única forma - é consenso - será com mudanças econômicas e medidas que beneficiem as pessoas e cheguem ao prato na mesa. Quanto antes, melhor. Junto a essa prioridade, cercado pela velha guarda como um símbolo de unidade, Raúl se dispõe a remodelar o governo e a estrutura administrativa para em alguns anos passar a outra geração um modelo de revolução viável, com instituições fortes. Simplificando: mudança na continuidade, mas mudança.

O primeiro discurso de Raúl na Assembléia Nacional contém as diretrizes fundamentais de seu plano de governo. As primeiras reformas consistirão em levantar algumas proibições que hoje prejudicam os cidadãos. Raúl, de 76 anos, pôs prazo para que as primeiras cheguem. Será nas próximas semanas e começará pelas "mais simples".

Gratuidades e subsídios podem ser eliminados

O inventário de insatisfações é longo, começando pelas restrições para viajar ao exterior. Fontes não oficiais mas próximas ao poder contaram ao "El País" que as primeiras medidas serão na área migratória. Entre elas poderiam estar a eliminação da exigência de permissão de saída, maiores facilidades aos que regressam, permissão de viagem a menores de idade, prorrogação do tempo de estada fora do país (de 11 para 24 meses).

Junto a elas, eliminariam medidas "que tiveram como único objetivo evitar o surgimento de novas desigualdades num momento de escassez generalizada", segundo disse Raúl em seu discurso. Ele não especificou quais, mas há proibições de todo tipo: para contratar uma linha de telefone celular; para comprar eletrodomésticos ou computadores; para vender o carro ou a casa que o governo um dia vendeu subvencionado; para se hospedar como turista num hotel; para ter uma linha de internet. Raúl advertiu que acabar com algumas delas vai demorar, pois implicam "mudanças em determinadas normas jurídicas, além de influírem sobre elas" as medidas agressivas dos Estados Unidos.

Estas primeiras mudanças, relativamente simples de fazer, garantiriam a Raúl popularidade em pouco tempo. Mas serviriam de pouco sem as mudanças econômicas, muito mais complexas. Domingo, Raúl pôs como primeira prioridade "satisfazer as necessidades da população", partindo do "fortalecimento sustentado da economia nacional e de sua base produtiva". Em seu discurso, mencionou algumas das medidas "em estudo": "a reavaliação do peso cubano", a eliminação de gratuidades e subsídios, incluídos os da caderneta de racionamento, e o alívio da distorção que produz o fenômeno da dupla moeda.

Mas o mais importante é produzir riqueza, e para isso se analisam novas formas de estímulo salarial e mudanças substanciais na agricultura, como primeiro passo. Dizem os especialistas que isso incluiria novas formas de organizar a produção, com mais espaço para a iniciativa privada, menos centralização e uma revisão do modelo de propriedade estatal.

No entanto, o verdadeiro objetivo de Raúl a médio prazo é a reforma do Estado. No transcurso deste ano, disse, realizará uma remodelação do governo e uma redução dos órgãos centrais do Estado para tornar "mais eficiente a gestão" e reduzir o excesso de burocracia. O propósito é fortalecer as instituições e limpar a revolução de estruturas e mecanismos obsoletos para legar um modelo viável a seus herdeiros. Um problema grave é o tempo.