Título: Ninguém pediu para eu sair
Autor: Lima, Maria
Fonte: O Globo, 28/02/2008, O País, p. 3

Lupi anuncia o cancelamento de convênios suspeitos mas diz que fica no ministério

Por determinação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o ministro do Trabalho, Carlos Lupi, deu ontem explicações sobre as denúncias envolvendo o repasse de recursos da pasta para ONGs e entidades ligadas ao PDT com convênios milionários. Presidente do PDT, Lupi anunciou o cancelamento de quatro convênios para qualificação profissional com indícios de irregularidades, mas disse que permanece ministro e dirigente do partido.

Apesar da orientação do Planalto para que se explicasse, disse que partiu dele a decisão de cancelar os convênios, no total de R$25,8 milhões, celebrados no fim do ano passado.

- Falaram que era para eu dar uma satisfação. Eu disse que, quando eu reunisse os dados, daria.

Mas o convênio de R$3 milhões com o Centro Integrado e Apoio Profissional (Ciap), de Londrina, que recebeu R$700 mil por curso não ministrado, será mantido. Segundo reportagem do GLOBO, o Tribunal de Contas do Paraná investiga a entidade. Mesmo assim, o novo convênio será mantido, segundo Lupi, porque sua assessoria jurídica recebeu um nada consta da Secretaria de Fazenda do Paraná.

Ao anunciar o cancelamento dos convênios, Lupi não admitiu que haja irregularidades. O maior deles, como revelou O GLOBO em 16 de fevereiro, foi com a ONG Databrasil, ligada ao PDT, e destinaria R$10 milhões para cursos de qualificação profissional de jovens. Segundo Lupi, o convênio, que teve a primeira parcela de 10% depositada, mas bloqueada depois da denúncia, foi cancelado a pedido da própria ONG.

Certificado de isenção vencido

O segundo convênio cancelado, no valor de R$3,67 milhões, era com a Associação São Vicente de Paulo, de Catanduva, no interior de São Paulo. Como O GLOBO revelou, a ONG já recebeu a primeira parcela, mas mantém um asilo para idosos e ainda não deu início à abertura das turmas para jovens. Segundo Lupi, o departamento jurídico do ministério descobriu, após a denúncia, que o certificado de isenção da contrapartida apresentado pela entidade estava vencido, por isso foi feito o cancelamento. Ele declarou que não vê problema no fato de um asilo dar cursos para jovens:

- A entidade se habilita ao convênio, pega o recurso no Ministério e terceiriza a realização dos cursos. Gente, acontece no Brasil inteiro esse tipo de terceirização.

Ele informou que os pedidos dos convênios e os nomes das entidades são levados por deputados e prefeitos do Brasil inteiro. A escolha das entidades "âncoras" a serem beneficiadas é feita em audiências públicas nas delegacias do trabalho dos estados. O ministro anunciou o cancelamento do convênio de R$2,1 milhões com o grupo Mulher Maravilha, de Jaboatão dos Guararapes, ligado ao deputado Paulo Rubens (PDT-PE). Ele alegou que o grupo não conseguiu da prefeitura a contrapartida de 10%, por isso o convênio foi cancelado, apesar de a primeira parcela já ter sido depositada, e posteriormente bloqueada.

O último convênio cancelado, de R$10 milhões, estava sendo firmado com a Fundação Universidade São João Del Rey. Segundo Lupi, a prestação de contas da entidade não tinha sido feita e, mesmo assim, o convênio para inclusão de jovens do caminho da Estrada Real estava sendo renovado.

Sobre a queda-de-braço com a Comissão de Ética Pública, Lupi disse que já esteve várias vezes com o presidente Lula desde dezembro, quando a comissão pediu sua demissão, mas que nunca os dois conversaram sobre o assunto:

- Não estou constrangendo o presidente Lula. Nunca escondi nada. Ninguém do governo pediu para eu sair. Não estou aqui para atender a vontade dos meus adversários. O presidente é a autoridade máxima e pode me demitir a qualquer momento.

Lupi reclamou da imprensa pela publicação de denúncias sobre o uso do cargo para beneficiar entidades ligadas ao PDT e à Força Sindical. Disse que vai procurar a Advocacia Geral da União para ajuizar ações, com base na legislação comum, para se defender. Disse que não se baseará na Lei de Imprensa, porque semana passada assinou para que fosse extinta.

- Estou incomodando setores do empresariado que não se conformam em ter sindicatos fortes e unidos. Não tenho preocupação com a ética porque eu nasci na ética - disse.

Ele alegou estar sendo alvo de setores do empresariado por defender a legalização das centrais sindicais e a ratificação da convenção da OIT que impede a demissão imotivada.

- Estou sendo odiado por herança. Todos que odiavam Getúlio e Brizola vão odiar quem se sentar nesta cadeira - disse Lupi.

A entrevista do ministro ontem transformou-se num ato de desagravo, com direito a claque formada por deputados pedetistas, federais e estaduais, liderados por Paulo Pereira da Silva (SP), o Paulinho da Força Sindical, central ligada ao PDT e hoje o maior braço político de Lupi.

A Controladoria Geral da União (CGU) vai fiscalizar a execução dos convênios feitos pelo Ministério do Trabalho com entidades vinculadas ao PDT e à Força Sindical. Segundo a CGU, o acompanhamento de convênios dos ministérios é feito por amostragem, levando em conta o valor e o tempo de vigência e, sempre que são publicadas denúncias de irregularidades nos repasses federais, os convênios são incluídos na fiscalização.

COLABOROU: Luiza Damé