Título: Polícia usará armas não-letais para ocupar as favelas com obras do PAC
Autor: Amora, Dimmi
Fonte: O Globo, 02/03/2008, Rio, p. 20

Verba federal para comprar equipamento, no entanto, ainda não foi liberada.

No Complexo do Alemão, faixas pedem que as obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) sejam feitas em paz. O apelo reflete o medo vivido por moradores diante de uma provável guerra entre a polícia e traficantes para que o projeto seja implantado. Mas, a aproximação do lançamento das obras, marcado para sexta-feira, acena com dias melhores para a comunidade: traficantes estariam deixando o complexo e o governo anunciou que vai usar armas não-letais durante a planejada ocupação das favelas beneficiadas pelo PAC. Além do Alemão, as favelas da Rocinha e de Manguinhos também receberão melhorias.

A pedido da Secretaria de Segurança Pública (SSP), a Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp) pretende liberar recursos para comprar esse tipo de armamento. A SSP solicitou cerca de R$90 milhões, para adquirir diferentes tipos de armas, equipamentos de segurança e veículos. A Senasp se recusou a comprar alguns itens, entre eles veículos blindados, mas prometeu liberar R$55 milhões.

- Foi aprovado menos dinheiro do que pedimos. Mas, mesmo que não haja recursos suficientes da Senasp para a compra desses equipamentos não-letais, vamos comprar com o nosso dinheiro - afirmou Roberto Sá, subsecretário Operacional da SSP e responsável pela lista de pedidos feitos à Senasp.

Equipamento poderá ser usado em outras ações

Roberto Sá disse que a Secretaria de Segurança jamais deu declarações de que haveria confrontos entre policiais e traficantes para que o PAC pudesse ser implantado nas favelas, apesar de integrantes da PM e da Polícia Civil terem usado termos como guerra e invasão. De acordo com o subsecretário, a intenção do governo é também dar às polícias a opção de usar essas armas não-letais - como balas de borrachas, granadas de luz e som e sprays de pimenta - no dia-a-dia do combate à violência:

- O policial precisa ter a opção de usar equipamentos de gradação da força.

O problema é que, a menos de uma semana do início do lançamento das obras, o dinheiro da Senasp não chegou aos cofres do estado. O atraso fará com que a ocupação das favelas onde haverá obras do PAC - o que ainda não tem data para começar - seja feita com os recursos que a SSP dispõe. A liberação da verba depende do orçamento do governo federal, que ainda não foi aprovado no Congresso. De acordo com o secretário Nacional de Segurança Pública, Antônio Carlos Biscaia, há uma medida provisória pronta para, caso a votação não aconteça logo, o dinheiro para a segurança do Rio seja liberado. O secretário garantiu que pelo menos mil homens da Força Nacional virão para o Rio.

- Também estamos estudando emprestar armas compradas no Pan para a Força Nacional usar durante as operações - disse Biscaia.

A poucos dias da cerimônia de início das obras, que contará com a presença do presidente Lula, muitos moradores do Alemão ainda vivem um clima de desconfiança. Carlos Luiz de Souza, de 39 anos, o Santana, diz que ainda custa a acreditar que o projeto sairá do papel. Certeza, ele só tem do que não quer:

- Pode ter tudo, mas não pode é ter violência contra os moradores para fazer obra.

Cadastramento para emprego melhorou o clima

As inscrições de moradores que querem trabalhar no PAC ajudaram a mudar o clima nas favelas. O cadastramento mostrou que as comunidades têm mão-de-obra qualificada. Mais de cem candidatos com nível superior e alguns com cursos de pós-graduação se candidataram. Apesar da disputa acirrada (3,57 candidatos por vaga, já que são 16.462 inscritos para 4.600 vagas nas obras no Alemão e nas favelas da Rocinha e de Manguinhos), as chances de um emprego podem melhorar. De acordo com o secretário estadual de Trabalho, Alcebíades Sabino, outras empresas já estão procurando o cadastro - encerrado anteontem - para contratar trabalhadores.

- Essas vagas disponíveis são apenas nas empresas que vão realizar as obras. Mas já estamos sendo procurados por outras empresas que vão prestar serviços às empreiteiras, como as que vão oferecer refeição e vigilância. Elas também querem esse cadastro para contratar mão-de-obra nas comunidades - explicou o secretário.

As 1.800 vagas que serão geradas nas obras do Alemão não chegam nem perto das mais de dez mil perdidas com o fechamento de algumas fábricas nos últimos anos na região. Mas elas podem ajudar a professora Laudicea Quaresma Santos, de 48 anos, a voltar a ter um emprego fixo. Ela hoje trabalha como ambulante.

- Eu sou otimista. Espero que a situação melhore como estão prometendo. Já acho que até as coisas vão até ficar mais calmas - diz a professora, em sua casa, que tem paredes furadas por dezenas de balas de fuzil.