Título: Apuração a caminho do arquivo
Autor: Rocha, Marcelo; Brito, Ricardo
Fonte: Correio Braziliense, 05/05/2009, Política, p. 03

Polícia Legislativa, ligada à cúpula do Senado, centraliza os trabalhos sobre as denúncias de irregularidades administrativas na Casa e reforça a ideia de que a investigação vai dar em nada

O Senado deu ontem dois passos para enterrar a investigação das denúncias de corrupção na área administrativa. De um lado, centralizou a apuração na Polícia Legislativa, órgão politicamente vinculado à cúpula da Casa e que não dispõe de instrumentos e know-how para tocar um trabalho de fôlego. Do outro, numa espécie de acordão, os dois principais personagens ¿ os ex-diretores Agaciel Maia (Geral) e João Carlos Zoghbi (Recursos Humanos) ¿ já indicaram que não vão levar adiante a troca de acusações se forem convocados para prestar depoimento sobre as supostas irregularidades.

Em entrevista à revista Época, Zoghbi afirmou que existe um esquema de corrupção em contratos do Senado com prestadoras de serviço sob o comando de Agaciel. Sem dar detalhes, vinculou a essas suspeitas os senadores Romeu Tuma (PTB-SP) e Efraim Morais (DEM-PB), responsáveis no passado pelo setor de contratos. A Polícia Legislativa espera que o ex-diretor do RH forneça mais elementos para dar início a sua apuração. Mas Zoghbi não deve fazê-lo. ¿Não há nada para denunciar. Até porque, ele não tem nada para dizer¿, afirmou o advogado do ex-diretor, Antonio Carlos de Almeida Castro, o Kakay.

Zoghbi e Kakay conversaram ontem por telefone. Segundo o criminalista, o ex-diretor disse que não tem nenhuma acusação a apresentar, nem contra Agaciel nem contra parlamentares. ¿Foi um mal-entendido num momento de desespero¿, avaliou Kakay, que também é amigo de Agaciel. O advogado trabalhará numa linha de defesa segundo a qual não teria partido de seu cliente a iniciativa de incluir a ex-babá como sócia majoritária de uma empresa que intermediava negócios entre bancos e o Senado na área sob seu comando. Tal decisão teria sido de um outro familiar, cujo nome não revelado.

Outro fator que esfria internamente a investigação é o processo de aposentadoria de Zoghbi, protocolado na última quinta-feira. O diretor-geral, José Alexandre Gazineo, informou ontem que não haverá empecilho na concessão do direito. No entanto, o primeiro-secretário, Heráclito Fortes (DEM-PI), disse que a aposentadoria poderá ser revista caso seja confirmado o envolvimento de Zoghbi em alguma irregularidade. A administração pública tem até cinco anos para rever essa decisão.

Contratempos Se Zoghbi nada entregar, a Polícia Legislativa corre o risco de patinar. Primeiro, por motivos políticos. Quem comanda o órgão é Pedro Ricardo Araújo Carvalho, indicação conjunta de Agaciel e do ex-presidente do Senado Renan Calheiros (PMDB-AL). Pedro começou mal a investigação ao dizer, durante o fim de semana, que ouviria parlamentares. Causou uma saia-justa e foi obrigado a recuar.

Além disso, a polícia do Senado, em seus sete anos de constituição, se ocupa rotineiramente de cuidar de crimes como pequenos furtos e estelionatos dentro das dependências da Casa. Falta a ela instrumentos para quebrar sigilos bancários, fiscais e telefônicos ¿ medida primordial quando não se consegue avançar numa apuração usando exclusivamente depoimentos.

Um terceiro contratempo pode estar naquilo que o primeiro-secretário, Heráclito Fortes (DEM-PI), considerou como lastro para garantir a independência da investigação interna. Segundo ele, o Ministério Público Federal acompanhará o andamento da apuração, mas ele se esqueceu de um detalhe: em 2006, o Senado foi alvo da Operação Mão-de-Obra, ação conjunta do MP e da Polícia Federal contra fraudes na contratação de terceirizados. Desde então, a relação com as duas instituições se deteriorou.