Título: Lula justifica ataque a STF e diz que deu palpite
Autor: Damé, Luiza; Braga, Isabel
Fonte: O Globo, 01/03/2008, O País, p. 13

Presidente afirma que tem direito a dar opinião como qualquer brasileiro; Marco Aurélio se diz perplexo, mas nega crise.

ARACAJU e BRASÍLIA. Longe do palanque, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ontem manteve as críticas ao Judiciário, mas amenizou o tom em relação ao discurso de anteontem à noite, durante lançamento de obras em Sergipe, onde acusou um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) de incentivar PSDB e DEM a recorrer contra programas sociais do governo. Ainda em Aracaju, Lula ontem se mostrou surpreso com a reação do ministro Marco Aurélio Melo, do STF e presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), e argumentou não ter citado seu nome na véspera. Lula e Marco Aurélio tentaram desfazer o clima de crise entre poderes.

- Eu não citei o nome do ministro - disse Lula, após reunião com governadores do Nordeste, acrescentando que não faz juízo de valor sobre sentença transitada em julgado e que, se houver proibição judicial do lançamento de programas sociais este ano, o governo acatará.

- No Brasil, quando se trata de palpite ou de opinião que as pessoas dão, elas precisam concordar que outros podem dar palpite e opinião diferentes. Da mesma forma que, como ser humano e brasileiro, as pessoas dão palpite sobre as coisas, o presidente da República pode dar palpite e julgar os palpites dos outros - disse ontem.

A irritação de Lula foi causada por ações de PSDB e DEM no STF contra o Territórios da Cidadania, programa de combate à pobreza rural, lançado segunda-feira. Marco Aurélio havia dito que não falaria sobre o programa, porque precisava aguardar recurso à Justiça dos que se sintam prejudicados.

- De repente, alguém fala: "Olha, se entrarem na Justiça, eu vou analisar". Na verdade, ele deu a senha para o PFL e para o PSDB. - disse Lula - Temos de perguntar a quem falou essa sandice se ele quer ser ministro da Suprema Corte ou se quer ser político. Se quiser ser político, renuncie lá e se candidate a um cargo para falar as bobagens que quiser, mas não fique se metendo na política do Executivo.

Marco Aurélio disse que as divergências devem ser mantidas em alto nível. Embora se diga perplexo, descartou uma crise entre Executivo e Judiciário.

- Os poderes devem ser harmônicos e independentes. A agressividade não deve pautar as relações entre poderes. Não há crise. Estou acostumado à divergência e a respeito, desde que se mantenha em alto nível.

Ele disse que a lei é clara ao vedar o aumento ou criação de programas sociais em ano eleitoral:

- As eleições municipais são preparatórias das eleições gerais. E quem se beneficia do uso indevido da máquina administrativa? Os partidos do governo e da base de sustentação. Há o desequilíbrio do pleito - disse.

Marco Aurélio: "Lastimei a acidez das palavras"

Segundo Marco Aurélio, todos devem respeitar as leis:

- É isso o que o presidente precisa compreender. Não é perseguição. O presidente foi eleito e reeleito pelo povo, temos que respeitar a vontade do povo. Mas cumpro meu dever. O que tenho dito é que, em ano eleitoral, não podemos ter incremento, alargamento de programas sociais. Está em bom português na lei 9.504 (lei eleitoral).

Indagado se estava irritado com as declarações, afirmou:

- Eu relevo, porque ele estava em um certo contexto, falando aos futuros beneficiados pelo programa. Agora, lastimei a acidez das palavras.

* Enviada especial

COLABOROU Gerson Camarotti