Título: Notas suspeitas na mira do TSE
Autor: Gripp, Alan; Braga, Isabel
Fonte: O Globo, 04/03/2008, O País, p. 3

Tribunal investiga uso, por PT e PTB, de recursos do Fundo em festa e seminários fantasmas

Por determinação do presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Marco Aurélio Mello, auditores do tribunal começaram ontem a vasculhar as prestações de contas dos partidos políticos em busca de irregularidades cometidas no uso do Fundo Partidário. A princípio, a investigação se concentrará nas denúncias de que o PT usou recursos do fundo para pagar parte da festa de 26 anos do partido, em 2006, em Brasília. Também serão analisadas as contas do PTB, que pagou R$255 mil para a realização de seminários que nunca aconteceram. Os dois casos foram revelados em reportagens do GLOBO publicadas desde domingo.

Os técnicos do TSE vão se debruçar sobre todos os gastos do PT em 2006 com recursos do Fundo Partidário. Naquele ano, o partido recebeu R$27,8 milhões. A Lei dos Partidos Políticos, que estabelece as regras para uso do fundo, não prevê o pagamento de festas. O PT lançou as despesas na rubrica "propaganda doutrinária e política". Ao todo, foram gastos R$39,3 mil do fundo, que bancou o bufê e as bebidas do evento, entre elas 342 garrafas de vinho e champanhe compradas num restaurante de Porto Alegre.

Já a análise das contas do PTB dará ênfase às empresas prestadoras de serviço. Três das quatro contratadas para organizar os seminários "14 sem barreiras" sequer têm sede. O PTB admitiu que as empresas receberam e não fizeram os seminários. Mas disse que o partido recebeu das empresas cartas de crédito para fazer os eventos em 2008. Os técnicos vão apurar se essas empresas pagaram impostos.

Receita pode abrir investigação

Ontem, o secretário da Receita Federal, Jorge Rachid, disse que o órgão também pode abrir investigação sobre as empresas contratadas pelo PTB:

- Se tiver qualquer implicação tributária, iremos investigar.

O presidente do PTB, o deputado cassado Roberto Jefferson, disse que os seminários não foram autorizados por ele. Segundo ele, o assunto foi um dos motivos que o levaram a antecipar sua volta ao comando da legenda, após um período de afastamento.

"Ao chegar, sustei todas as providências tomadas com relação aos seminários, até porque as datas eram inoportunas (pós-eleições). Tentei fazer com que as empresas devolvessem o dinheiro, mas elas alegaram ser impossível. Então foi fixado o compromisso de adiar a realização dos seminários para este ano (antes das eleições municipais)", escreveu num blog. Jefferson afirma que, caso contrário, o PTB recorrerá à Justiça para reaver o que foi pago.

"O que precisa ficar claro é que não houve dolo, intenção de fraudar o partido ou a Justiça eleitoral", alegou.

Deputados criticaram os gastos, principalmente os do PTB, mas não há consenso sobre alterações na lei que rege o Fundo Partidário. O deputado Chico Alencar (PSOL-RJ) disse que o partido apresenta amanhã projeto criando o Portal da Transparência para os Três Poderes. Para Alencar, as denúncias contra o PTB são graves:

- Aí é armação ilimitada. É mais grave que o uso em festas partidárias. O partido que forjar eventos não deveria apenas perder cotas, mas devolver o dinheiro, com juros. E deveríamos aprimorar a legislação para vedar, expressamente, o uso para a compra de bebidas e outras mordomias.

Para o deputado Flávio Dino (PCdoB-MA), um dos relatores da reforma política no ano passado, mais importante que mudar a legislação é intensificar a fiscalização:

- Eventos festivos fazem parte da cultura brasileira e podem ser usados como mecanismo de propaganda partidária. Mas é preciso punir abusos.

O presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia, também descarta mudanças na lei dos partidos:

- A fiscalização do uso de verba pública tem que ser mais rigorosa.