Título: Defensores e opositores da lei se manifestaram pacificamente
Autor: Brígido, Carolina
Fonte: O Globo, 06/03/2008, Ciência, p. 37
Visitantes lotaram plenário e corredores para assistir à votação
BRASÍLIA. O pedido de vista do ministro Carlos Alberto Menezes Direito deixou um clima de frustração entre os cerca de 30 portadores de deficiência que assistiram à sessão de ontem no Supremo Tribunal Federal. Embora a interrupção do julgamento já fosse esperada, o vendedor Aurílio Coelho, que sofre de distrofia muscular desde os 12 anos, não escondia a decepção.
- Tinha a esperança de que a questão fosse decidida hoje. Estou um pouco triste, mas ainda esperançoso - disse.
Entre os militantes que defendem a proibição das pesquisas, o sentimento era de alívio com a intervenção de Direito, um católico praticante que já sinalizou a oposição aos estudos. O seminarista Cássio Marques, que acompanhou a sessão ao lado de outros religiosos, criticou o que chamou de clima emocional na Corte após a leitura do relatório do ministro Carlos Ayres Britto.
O plenário da mais alta corte de Justiça do país ficou pequeno para a platéia que resistiu a quatro horas e meia de debates. Todas as 246 poltronas foram ocupadas, e a administração do tribunal precisou instalar três telões para acomodar visitantes em salões e corredores.
Num ambiente marcado pelo silêncio e pela sobriedade, os militantes das duas correntes investiram no simbolismo para manifestar suas convicções. Na Praça dos Três Poderes, os defensores dos estudos receberam gérberas laranjas - segundo eles, as flores faziam referência à esperança na recuperação de pacientes com doenças degenerativas.
Entre os opositores da lei era freqüente o uso de crucifixos pendurados no pescoço. Integrantes do movimento Brasil sem Aborto vendiam, a R$10, camisetas verdes com a inscrição \"Por que usar embriões humanos se a ciência avança com células-tronco adultas?\". O produto fez sucesso entre missionários e seminaristas católicos.
Apesar da polêmica entre fé e ciência que domina o debate sobre o tema, as divergências foram pacíficas. Os visitantes aguardaram calmamente a vez de entrar na longa fila que se formou na porta do tribunal, sem qualquer tumulto ou troca de provocações.
A formalidade do STF, que impede a entrada em plenário de homens sem gravata e mulheres de blusa, voltou a servir como filtro social à platéia. Embora a decisão dos ministros tenha o poder de influir na vida de ricos e pobres, a discussão só atraiu \"os bacanas\", como sentenciou o ambulante Renato dos Santos, morador de uma invasão na comunidade do Paranoá. Informado sobre o que os ministros discutiriam na Corte, ele disse que, como evangélico, era contra o uso das células embrionárias em pesquisas. Minutos antes do início do julgamento, Renato se queixava da dificuldade de vender seus picolés caseiros aos visitantes do tribunal.
- Esse pessoal só toma Kibon - lamentava.
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