Título: Indicado do PT leva subsidiária da Petrobras como consolação
Autor: Camarotti, Gerson; Ordoñez, Ramona
Fonte: O Globo, 05/03/2008, Economia, p. 22
Alan Kardec presidirá a nova empresa de biocombustíveis, afirma o ministro de Minas e Energia. Assessor de Gabrielli disputava a diretoria de Abastecimento da estatal.
BRASÍLIA e RIO. A Petrobras criará, nos próximos dois meses, uma subsidiária para cuidar de biocombustíveis e etanol, e colocará em seu comando o ex-gerente de Refino da estatal Alan Kardec, informou ontem ao GLOBO o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão. Com o apoio da bancada do PT da Câmara, Kardec acabou ganhando a empresa como prêmio de consolação, depois que foi derrotado na disputa interna pelo comando da diretoria de Abastecimento da Petrobras, da cota do PP desde o governo Fernando Henrique Cardoso.
Kardec, hoje assessor do presidente da estatal, José Sergio Gabrielli, na área de biocombustíveis, tinha o apoio do PT para derrubar o atual diretor de Abastecimento e seu ex-chefe, Paulo Roberto Costa, que foi mantido. Kardec era apoiado ainda por setores de PMDB, PCdoB, PTB e sindicalistas. Costa conseguiu o apoio do PMDB para neutralizar a pressão petista. O líder do PP na Câmara, Mário Negromonte (BA), chegou a defender Costa publicamente.
Segundo uma fonte da estatal, Kardec fez questão de que a atividade de venda de etanol fosse para a nova subsidiária. Além de ser uma atividade importante, que ganhará peso caso se concretizem alguns negócios, como a exportação para o Japão, Kardec não aceitava que a área continuasse vinculada à diretoria de Costa. Para a fonte, a permanência de Costa é uma demonstração de força da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff. Ela lutava para manter na diretoria de Exploração e Produção Guilherme Estrella, que poderia ter de ceder lugar a Costa.
Segundo Lobão, o próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva já mostrava interesse em colocar o biocombustível como prioridade da estatal. A idéia é que, além da produção e do desenvolvimento de tecnologia, a subsidiária cuide da formatação logística para exportação e comercialização do álcool.
- O desenvolvimento do biocombustível e do etanol passou a ser prioridade. Será criada uma empresa ligada à Petrobras. O escolhido para a função é o técnico Alan Kardec, que já cuida dessa questão na Petrobras - disse Lobão.
A decisão de criar a subsidiária foi sacramentada segunda-feira, na reunião do Conselho de Administração da Petrobras, quando se confirmou o técnico Jorge Zelada para a diretoria Internacional, sob patrocínio do PMDB de Minas. A Kardec e Zelada se somam outros apadrinhados no comando da estatal. A começar pelo presidente: Gabrielli é indicação do governador da Bahia, Jaques Wagner. O PT patrocina ainda os diretores Almir Barbassa (Finanças) e Estrella.
BB e Caixa também têm cúpula indicada por políticos
A escola é a mesma nas grandes instituições financeiras federais: na Caixa Econômica Federal, os 12 cargos de comando são ocupados por pessoas com ligações políticas, enquanto, no Banco do Brasil (BB), são seis em dez. PT e PMDB reúnem o maior número de apadrinhados. Na Caixa, oito são ligados ao PT, três ao PMDB e um ao PDT. Os petistas emplacaram desde a presidente, Maria Fernanda Coelho, até o vice-presidente de Ativos de Terceiros, Bolivar Tarrago Moura Neto, que foi assessor do ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci. O PMDB nomeou o vice-presidente de Fundos de Governo e Loterias, Wellington Moreira Franco, ex-governador do Rio. No primeiro escalão do BB, escapam da ingerência política apenas a presidência e as vice-presidências de Finanças, Mercado de Capitais e Relações com Investidores; de Negócios Internacionais e Atacado; e de Varejo e Distribuição. Nas outras seis, o governo acomodou aliados.
O caso mais recente e emblemático é o do ex-senador e ex-governador de Goiás Maguito Vilela (PMDB), indicado em 2007 para a vice-presidência de Governo, que gere fundos de pensão privada (BB Previdência) e se relaciona com todas as esferas públicas. Ele cuida de cerca de R$120 bilhões em tributos federais recolhidos pelo BB. Nas mãos do PT, ficaram cinco vice-presidências no banco.
As três estatais tiveram problemas no lucro. A Petrobras teve lucro 17% menor. O BB amargou queda de 16,3%, contra um avanço de 58,5% do Bradesco e de 96,7% do Itaú, enquanto na Caixa o lucro subiu só 5,2%. Para especialistas, um ingrediente em comum contribui: o jogo político. Segundo Daniella Marques, analista de renda variável da Mercatto, a indicação política nas estatais gera uma ineficiência na gestão:
- A valorização das ações da Petrobras aconteceu mais por causa do aumento no patamar das reservas.
Luis Miguel Santacreu, analista de bancos da Austin Ratings, acredita que instituições como o BB e a Caixa têm uma série de dificuldades que as empresas privadas não enfrentam, como a prestação de contas ao governo, o processo de licitação e o interesse em cargos:
- Em 2007, o BB ficou parado, os ativos não cresceram como nos outros bancos.
A Caixa, continua ele, sofreu por não ter carteira de crédito tão diversificada.
COLABORARAM Patrícia Duarte, Geralda Doca e Bruno Rosa