Título: Nos EUA, recessão bate à porta
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Fonte: O Globo, 08/03/2008, Economia, p. 39

AMEAÇA GLOBAL

Com corte de 63 mil empregos, bolsas recuam para níveis de 2006. Bovespa perde 1,76%

O fantasma de uma recessão nos Estados Unidos voltou a assombrar ontem, com a divulgação da redução de 63 mil postos de trabalho no país em fevereiro, a maior queda mensal em quase cinco anos. O próprio presidente George W. Bush reconheceu a retração da economia americana, reforçando as análises de que o que era apenas uma possibilidade está se tornando realidade. Os mercados mundiais reagiram. Em Wall Street, os índices recuaram para níveis de 2006. As principais bolsas européias fecharam em queda de mais de 1%. No Brasil, o Ibovespa, principal índice da Bolsa de Valores de São Paulo, caiu 1,76%, aos 61.867 pontos. Euro e petróleo bateram novos recordes ao longo do dia.

Expressando preocupação com o relatório de emprego do Departamento do Trabalho, o presidente Bush afirmou que os EUA atravessam um "momento difícil", mas renovou as apostas de que situação vai melhorar quando o pacote fiscal aprovado pelo Congresso começar a surtir efeito. Além das 63 mil vagas cortadas em fevereiro, o resultado de janeiro, inicialmente reportado como fechamento de 17 mil vagas, foi revisado para corte de 22 mil empregos. A seqüência negativa de janeiro e fevereiro foi a primeira desde maio e junho de 2003.

- Eu sei que os americanos estão preocupados com nossa economia, eu também estou - disse o presidente, em breve discurso na Casa Branca. - Está claro que nossa economia desacelerou, mas a boa notícia é que antecipamos isto e tomamos medidas decisivas para impulsioná-la, aprovando o pacote de crescimento que vai colocar dinheiro nas mãos de trabalhadores e empresários americanos. Acreditamos que essas medidas e as ações do Fed (Federal Reserve, o banco central americano) terão um efeito positivo na economia.

Fed pode cortar juro antes do previsto

Além da retração no emprego, notícias do setor financeiro, que vem contabilizando prejuízos devido à crise do subprime (empréstimos imobiliários de alto risco), pesaram no mercado. A seguradora de bônus Ambac Financial informou que vendeu US$1,5 bilhão em ações e títulos conversíveis. O montante, porém, desapontou alguns analistas e investidores. Divulgadas na véspera, a reestruturação do Citigroup, envolvendo sua unidade de financiamento hipotecário, e o calote da Thornburg, que concede hipotecas de alto nível, ajudaram a derrubar os índices. O Dow Jones caiu 1,21%, para o menor nível desde 11 de outubro de 2006. O S&P 500 recuou 0,8%, fechando no mais baixo patamar desde 23 de agosto de 2006. E o Nasdaq perdeu 0,4%, para a menor pontuação desde 11 de setembro do mesmo ano.

Durante a jornada, o euro bateu novo recorde frente ao dólar, superando a marca de US$1,5450. E o petróleo, que atingiu a máxima histórica de US$106,54 em Nova York, acabou encerrando em ligeira queda, de 0,30%, para US$105,15 o barril.

De acordo com a Bloomberg News, desde o início de 2007 as perdas do setor financeiro somam US$188 bilhões em baixas contábeis e prejuízos relativos à concessão de empréstimos, incluindo reservas feitas para financiamentos não quitados, de mais de 45 dos maiores bancos mundiais e corretoras de valores mobiliários.

A fim de diminuir as pressões sobre a liquidez dos mercados, o Fed informou ontem que vai aumentar o volume de seus leilões de injeção de recursos de 10 e 24 de março para US$50 bilhões. Isso representa um incremento de US$20 bilhões em cada operação. A instituição também divulgou que vai iniciar uma série de transações de recompra, com volume esperado de US$100 bilhões.

Em outra frente, ganham força as avaliações de que a instituição poderá cortar os juros antes do previsto. Desde setembro, os cortes na taxa somam 2,25 pontos percentuais, e outra redução de pelo menos 0,5 ponto é prevista para o próximo encontro do Fed, em 18 de março. O economista do Goldman Sachs Jan Hatzius disse que uma redução emergencial, antes da reunião, não está fora de questão. Para muitos analistas, o dado no mercado de trabalho encerrou o debate sobre se os EUA estão em recessão. A pergunta agora é como sair dela.

- Apague a luz. A festa acabou. Estamos em recessão - disse Joseph Brusuelas, economista da IdeaGlobal, em Nova York.

Ainda que muitos ainda acreditem que a economia vá se recuperar no segundo semestre com o efeito dos cortes dos juros e das restituições de impostos, alguns estimam o início da recuperação apenas em 2009.

- O debate não deve ser mais se há ou não uma recessão e sim qual a profundidade dela - disse Nigel Gault, da Global Insight, em Massachusetts.

Bovespa tem lucro de R$478,5 milhões

De acordo com uma nota do JP Morgan, assinada pelo analista Thomas Lee, a economia americana está em recessão há dois meses. O banco afirma que a atual recessão será curta, a não ser que "ocorra uma mudança brusca no comportamento corporativo". Em uma recessão curta, prossegue a nota, o pior nível de perdas acontece em cerca de cinco meses.

- É apropriado caracterizar a economia americana como tendo ingressado em uma recessão no primeiro trimestre - disse o economista-chefe do J.P. Morgan, Bruce Kasman.

No Brasil, o dólar subiu de 0,23%, para R$1,684, mas encerrou a semana com perda de 0,41%. Já o Ibovespa acumulou na semana desvalorização de 2,55%. Ontem, a Bovespa Holding, empresa criada para a abertura de capital da Bolsa em 2007, anunciou que seu lucro líquido no ano passado mais que dobrou, para R$478,5 milhões, considerando-se resultados ajustados segundo a reorganização societária que levou a instituição a listar suas ações em sua própria bolsa de valores. No quarto trimestre, a companhia teve lucro líquido de R$169,2 milhões, ante R$54 milhões um ano antes. Em 2006, o ganho ajustado foi de R$199,41 milhões.

Segundo o balanço, os resultados foram ajudados pelo aumento no número de transações efetuadas na bolsa, provocado pela expansão no número de companhias listadas, aumento de ofertas públicas e conseqüente expansão no número de negócios realizados. Enquanto nos 12 meses de 2006 o volume negociado por dia foi de R$2,4 bilhões, em 2007 esse montante passou a R$4,9 bilhões. Com isso, a receita operacional líquida pro forma em 2007 somou R$808,1 milhões ante R$408,5 milhões no ano anterior. A margem no período evoluiu de 44% para 68,8%. (Agências internacionais, com Claudio de Souza e Vivian Nunes, do Globo Online, e Patrícia Duarte)