Título: Baianos são barrados na Espanha
Autor: Funke, Katherine; Jungblut, Cristiane
Fonte: O Globo, 10/03/2008, O País, p. 5

Jogador de futebol, que faria conexão, e fazendeira sofrem constrangimentos em aeroporto

SALVADOR E BRASÍLIA. Passar horas sem informação e sem direito a perguntas, assinar um papel sem poder ler, ouvir gritos e ordens foram alguns constrangimentos pelo qual passaram os baianos Ramon Santana e Maria Inês Martins no aeroporto de Madri sexta-feira. Eles tiveram a entrada no país negada e passaram horas incomunicáveis, em acomodações coletivas. Após 26 horas no aeroporto espanhol, embarcaram de volta a Salvador no vôo 083 da Air Europe, só com a bagagem de mão, com a promessa de receber as malas mais tarde. Chegaram às 21h05m do sábado, indignados.

- Fui tratado como cachorro - conta Ramon Santana, de 16 anos, que desembarcou em Madri apenas para fazer conexão para Milão, na Itália.

Ramon é jogador de futebol, com passagens na divisão de base do Vitória (BA), Santo André (SP) e Tigres (RJ). Ele queria passar um tempo em times italianos, morando com a irmã, casada com um milanês:

- E não vou desistir por causa do governo espanhol.

A fazendeira Maria Inês Martins, de 40 anos, contou detalhes do tratamento na Espanha:

- À noite, vieram com uma lanterna e colocaram na cara de cada um, pedindo silêncio; nos acordaram batendo nas portas, como se fôssemos presidiários. Para tomar banho, não nos deram toalha. Tivemos que nos enxugar com lençóis.

Maria Inês e Ramon ficaram retidos com mais de 200 pessoas, de diferentes nacionalidades. Esperaram cinco horas até o primeiro contato com a polícia espanhola. Horas depois de responder a perguntas como quanto dinheiro traziam e o que iriam fazer no país, teriam sido obrigados a assinar um documento sem poder ler. O documento era um certificado de negação da entrada no país, no qual o Ministério do Interior espanhol diz que o estrangeiro tem o direito de recorrer em até um mês.

Maria Inês tinha mil euros, cartões de crédito, comprovante de reserva em hotel próximo a Barcelona e passagem de volta. Mesmo assim, não pôde entrar na Espanha sob a justificativa de "falta de documentos adequados que justifiquem o motivo da permanência".

No mesmo vôo de Ramon e Maria Inês, desembarcaram vários espanhóis e todos estranharam a rigidez da Polícia Federal. A espanhola Marta Feliu, que vive na Chapada Diamantina, Bahia, estava desesperada com a demora na liberação da sua irmã, que vinha de Valência, e que só foi liberada depois de uma hora e 40 minutos. Ela disse que a polícia brasileira fez muitas perguntas e a obrigou a mostrar o dinheiro que trazia em espécie.

Em Brasília, a Comissão de Relações Exteriores da Câmara realiza, quarta-feira, audiência pública para discutir a situação dos brasileiros que foram expulsos da Espanha na semana passada. O pedido é do deputado Ivan Valente (PSOL-SP), que tentará convencer o presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), a convidar o embaixador da Espanha no Brasil, Ivan Peidró. O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, também deverá ser convidado.