Título: Fundos cambiais derretem junto com o dólar
Autor: Frisch, Felipe
Fonte: O Globo, 10/03/2008, Economia, p. 20
Com queda acentuada da moeda, aplicação tem fortes resgates. Nem mesmo os ligados ao euro são boa opção
Foi-se o tempo em que, para manter o poder de compra ¿ principalmente em momentos de crise, como a atual no mundo ¿, a recomendação era a aquisição de dólares ou a aplicação em um fundo cambial. Hoje, pode ser uma das piores escolhas, pois a moeda americana praticamente só tem caído desde o início do ano passado. De lá até a última sexta-feira, quando o dólar comercial fechou a R$1,684 para venda, a perda acumulada já é de 21,2%. Prova da perda de charme do investimento em moeda estrangeira são os patrimônios dos fundos cambiais ¿ compostos por títulos atrelados ao câmbio ¿, que, além de rendimentos negativos, vêm diminuindo graças aos sucessivos resgates.
Os fundos atrelados ao dólar, até o dia 4 de março, acumulavam patrimônio de tímidos R$608 milhões, enquanto a indústria de fundos no Brasil administra mais de R$1,159 trilhão. Os atrelados ao euro ¿ para quem quer se proteger da variação da moeda da União Européia ¿, criados a partir de junho de 2003, já correm o risco de extinção. Hoje, apenas cinco instituições têm carteiras na categoria. E somam míseros R$53 milhões. Os fundos de dólar, mais tradicionais, são oferecidos por 22 instituições, em 57 fundos diferentes, segundo dados da Associação Nacional dos Bancos de Investimento (Anbid).
Aposta em euro, no Brasil, ainda inclui risco do dólar
A grande dúvida do mercado e de muitos investidores é saber até onde o dólar vai. Em agosto do ano passado, com a moeda ainda em torno de R$2, eram poucos os que se arriscavam a dizer que chegaria a R$1,70 em menos de um ano e ainda derreteria além disso. Agora, o piso mais citado é o de R$1,60. Mas, dada a proximidade desse valor da cotação atual, ninguém se surpreenderá muito se o dólar chegar a R$1,50 até o fim do ano. Por isso, os analistas não recomendam a aplicação.
¿ A não ser que o mundo evolua para uma situação muito ruim, acho pouco provável a reação do dólar em relação ao real. Temos um diferencial de juros (a taxa básica brasileira é de 11,25% ao ano, enquanto a dos Estados Unidos é de 3% anuais) que só aumenta e atrai dinheiro para o real ¿ enumera Alexandre Póvoa, diretor da Modal Asset Management.
Para Marco Franklin, sócio da Paraty Investimentos, o dólar não tem piso. E a tendência é de mais queda com a entrada de investimentos no país, devido à alta das commodities, que o país exporta. E mais dinheiro deve chegar, diante da perspectiva de o Brasil virar grau de investimento (investment grade, nota dada pelas agências de risco mundiais que permite que fundos internacionais mais conservadores apliquem no país) ainda este ano, diz.
Nesse cenário, ainda é vantagem apostar no real (para o pequeno investidor, via fundos DI, ou títulos públicos no Tesouro Direto, por exemplo), diz o gerente de câmbio do Banco Prosper, Jorge Knauer, para quem o futuro da cotação do dólar é imprevisível:
¿ Não dá para dizer até onde o dólar vai. O mercado achava que, a R$1,70, ia parar de cair. O fundo cambial não vale a pena, tende a acabar. Apostar no dólar hoje é muito ruim, a probabilidade de perda é grande e ainda tem taxa de administração.
Uma aparente alternativa aos fundos atrelados à variação do dólar são os fundos ligados ao euro, que tem batido sucessivos recordes de alta. No entanto, essas altas são no exterior, contra o dólar. Para fazer a conversão para o real, é necessário passar pelo dólar, em queda no Brasil e no mundo. Ou seja, mesmo que o euro suba, o dólar leva embora parte dos ganhos. Se, no início, a aplicação valia a pena por garantir as eventuais altas das duas moedas, hoje tem o risco de queda das duas.
Ouro tem sido procurado por investidores
¿ O euro está no topo de valorização em dólar. Se era para entrar num fundo deste tipo, já tinha que ter entrado ¿ diz Jason Vieira, economista-chefe da Uptrend Consultoria.
A alternativa que tem servido como reserva de valor é o ouro, diz Sidnei Moura Nehme, diretor executivo da NGO Corretora de Câmbio. Segundo ele, é preciso ter em mente que não se leva o ouro negociado na Bolsa de Mercadorias & Futuros (BM&F) para casa, mas apenas um documento. O metal está na sua cotação máxima no mundo e no Brasil, a R$53 o grama, com alta de 21,84% desde o início de 2007.