Título: Quando o direito sai do armário
Autor: Almeida, Cássia
Fonte: O Globo, 09/03/2008, Economia, p. 33

Em dois anos, dobra o percentual de empresas que concedem benefícios para companheiros do mesmo sexo.

Antes tarde do que nunca. Gays, lésbicas, bissexuais, travestis e transexuais começam, no século XXI, a usufruir de direitos que valem há muito para heterossexuais nas empresas, nas escolas, na Justiça, nos hospitais e nas estatísticas do país. Esses avanços nos direitos civis dos homossexuais serão mostrados numa série de reportagens que O GLOBO publica a partir de hoje. À parte discriminações, fundos de pensão, Previdência Social, planos de saúde e empresas já não distinguem companheiros pelo sexo para conceder benefícios. Pesquisa inédita da Consultoria Mercer de Recursos Humanos, feita no ano passado com 255 grandes e médias companhias, mostra que 16% delas permitem a inclusão de parceiro do mesmo sexo como dependente do plano de saúde, alcançando 360 mil trabalhadores. Em 2005, essas empresas representavam só 8%.

¿ Mesmo sendo ainda um percentual pequeno, foi um avanço significativo, o maior crescimento detectado entre os vários tipos de dependentes. E tudo indica que vai se tornar uma prática de mercado ¿ disse Francisco Bruno, líder da área de Saúde Corporativa da Mercer e coordenador da pesquisa.

ANS quer estender cobertura a todos

A empresária Hedi Oliveira é dependente no plano de saúde empresarial da companheira. Viúva há quatro anos e casada novamente há dois, vai pleitear a transferência da pensão do INSS de Sandra, com quem viveu por 20 anos, assim que os três filhos adotados chegarem à maioridade:

¿ Fizemos testamento e documento jurídico nomeando cada uma como tutora dos filhos. E agora vou pleitear a transferência da pensão dos meus filhos para mim. Temos que buscar os mínimos direitos que temos.

Aos 61 anos, sempre viveu abertamente a relação com a companheira, que morreu num acidente. E, nas escolas, diz que nunca sofreu preconceito ao acompanhar a vida escolar e social dos filhos, Rafael, Débora e José Marcos.

¿ Sempre nos apresentamos como casal. Talvez a firmeza de nossas posições tenha afastado as manifestações de preconceito.

A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) estuda formas legais de tornar obrigatória a extensão do benefício de dependente para os parceiros de mesmo sexo. Por enquanto, usa a indução, ou seja, mostra que a concorrência já está aceitando:

¿ Enquanto não temos resposta dessa consulta jurídica, incentivamos a prática. Algumas operadoras já oferecem ¿ explica Martha Oliveira, gerente da ANS.

No serviço público, essa discussão já tomou corpo. O Rio foi a primeira cidade a reconhecer direitos de pensão para companheiros de mesmo sexo e estende esse benefício para o plano de saúde.

¿ Houve avanços extraordinários nos últimos anos na questão da diversidade sexual. Nos espaços públicos, nas políticas de estado, no Judiciário. Falta agora o Congresso aprovar o casamento e tornar crime a discriminação por orientação sexual. Já há leis em 11 estados ¿ diz Cláudio Nascimento, do Grupo Arco-Íris de Conscientização Homossexual.

FUNDOS DE PENSÃO MAIS IGUAIS, na página 34